Eficácia no tempo das normas de Direito do Trabalho

AutorGustavo Filipe Barbosa Garcia
Páginas194-199

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Gustavo Filipe Barbosa Garcia 1

Introducao

A Lei n. 13.467/2017 alterou a Consolidacao das Leis do Trabalho e as Leis ns. 6.019/1974, 8.036/1990 e 8.212/1991, a fim de adequar a legislacao ás novas rela-cóes de trabalho.

Diversas sao as modificacóes decorrentes da chamada reforma trabalhista, tanto na esfera do Direito material, como processual do trabalho.

Nesse contexto, propóe-se examinar no presente estudo as principais questóes relativas á vigencia e á eficácia no tempo da Lei n. 13.467/2017.

Aplicacao da norma jurídica

Entende-se por aplicagao do Direito a incidencia da norma jurídica ao fato concreto, para se poder concluir quanto á adequacao deste áquela (fato lícito) ou pela ina-dequacao (fato ilícito)2.

Pode-se dizer que essa é a principal funcao exercida pela jurisdicao, ao decidir e estabelecer o Direito a ser aplicado ao caso concreto3.

A aplicacao da norma jurídica pode ser estudada no que se refere ao tempo e ao espago, ou seja, á eficácia do Direito quanto aos momentos temporais de vigencia e á eficácia do Direito no que se refere ao ámbito territorial de incidencia.4

A vigencia temporal da norma jurídica diz respeito ao tempo de sua atuacao, ou seja, o período de tempo em que ela pode ser invocada para produzir efeitos5.

Sobre essa eficácia no tempo, quanto ao início de obri-gatoriedade da norma legal, de acordo com o art. 1º da Lei de Introducao ás Normas do Direito Brasileiro (De-creto-Lei n. 4.657/1942), salvo disposicao contrária, a lei

comeca a vigorar em todo o país 45 dias depois de oficialmente publicada.

Entretanto, é comum a lei prever a sua entrada em vigor na data de publicacao. Além disso, é possível que a lei fixe, para o futuro, a data em que entrará em vigor.

O período de tempo entre a publicacao da lei e sua entrada em vigor denomina-se vacatio legis. Esse período se justifica para haver a divulgacao mais ampla da nova lei. Enquanto o período de vacatio legis nao terminar a lei nao tem forca obrigatória, ainda que já tenha sido publicada6.

De acordo com o art. 8º da Lei Complementar n. 95/1998, a qual dispóe sobre a elaboracao, a redacao, a alteracao e a consolidacao das leis: "A vigencia da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar pra-zo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula 'entra em vigor na data de sua publi-cacao' para as leis de pequena repercussao".

As leis que estabelecam período de vacáncia deverao utilizar a cláusula 'esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicacao oficial' (art. 8º, § 2º, da Lei Complementar n. 95/1998, incluído pela Lei Complementar n. 107/2001).

Registre-se que a promulgacao da lei atesta a sua existencia. No entanto, isso nao se confunde com a vigencia da lei7, a qual apenas se inicia quando esta se torna obri-gatória, podendo ser invocada para produzir efeito, conforme regulamentacao anteriormente indicada.

Vigencia da Lei n 13.467/2017

A Lei n. 13.467, de 13 de julho de 2017, tem início de vigencia depois de 120 dias de sua publicacao oficial (art. 6º), ocorrida em 14.07.20178.

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O § 1º do art. 8º da Lei Complementar n. 95/1998, in-cluído pela Lei Complementar n. 107/2001, dispóe que: "A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabelecam período de vacáncia far-se-á com a inclusao da data da publicacao e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente á sua consumacao integral".

Desse modo, entende-se que a Lei n. 13.467/2017 entrou em vigor em 11 de novembro de 2017.

Principio da irretroatividade

Conforme o princípio da irretroatividade das leis, estas dispóem para o futuro, nao atingindo fatos passados.

Cabe ressalvar, nao obstante, a retroatividade benéfica, principalmente no Direito Penal, conforme o art. 5º, inciso XL, da Constituyo Federal de 1988, e mesmo no Direito Tributário9.

O princípio da irretroatividade decorre da exigencia de se garantir a seguranga jurídica10, em consonancia com o art. 5º, caput, da Constituicao da República.

As relacóes jurídicas necessitam de previsibilidade para o pleno desenvolvimento da vida em sociedade, de forma a se alcancar o bem comum. O Direito, ao reger normativamente as relacóes intersubjetivas, busca justamente a harmonizacao das relacóes jurídicas. Assim, para que o objetivo de harmonia na convivencia social seja alcancado, faz-se imperiosa a seguranca nas relacóes jurídico-sociais.

Do mesmo modo que nao se pode imaginar uma so-ciedade devidamente organizada sem Direito11, nao há como alcancar estabilidade e progresso social sem a segu-ranca jurídica regendo as relacóes estabelecidas entre as pessoas e os grupos. Bem por isso, como observa Manoel Goncalves Ferreira Filho, na "verdade, o fundamento do princípio da irretroatividade é a seguranca jurídica"12.

O princípio da irretroatividade insere-se, portanto, como forma de manutencao da indispensável seguranca jurídica13.

A respeito do tema, segundo Maria Coeli Simóes Pires: "o princípio da irretroatividade, mesmo quando omitido em sua literalidade no direito constitucional positivo, en-contra-se, salvo em breve tempo representado pelo lapso do regime da Constituicao de 1937, implícito no sistema, como áncora da seguranca jurídica"14.

Nesse sentido, a Constituicao Federal de 1988, no art. 5º, inciso XXXVI, estabelece que a lei nao prejudicará o di-reito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada15.

Portanto, ficam resguardados: os atos consumados á época da lei anterior; os direitos já integrados definitivamente ao património das pessoas antes da vigencia da nova disposicao; as questóes definitivamente decididas pelos tribunais. A alteracao da legislacao legislativa, assim, nao pode alcancar a pretensao definitivamente julgada por sentenca de mérito transitada em julgado.

Rubens Limongi Franca assim conceitua o direito adquirido: "a consequencia de uma lei, por via direta ou por intermédio de fato idóneo; consequencia que, tendo passado a integrar o património material ou moral do sujeito, nao se fez valer antes da vigencia de lei nova sobre o mesmo objeto"16.

Apenas excepcionalmente é que a norma constitucional, por meio do poder constituinte originário, pode prever em sentido contrário, como ocorre no art. 46, parágrafo único, do Ato das Disposicóes Constitucionais Transitórias da Constituicao Federal de 1988.

Eficácia no tempo da Lei n 13.467/2017

Ao se analisar a eficácia no tempo da norma de Direito do Trabalho, deve-se destacar que a relacao de emprego

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é continuada no tempo, ou seja, o contrato de trabalho é um negócio jurídico de trato sucessivo.

O vínculo de emprego, portanto, produz efeitos ao longo do tempo, com a execucao de suas prestacóes de forma sucessiva e contínua.

A teoria do efeito imediato da norma jurídica é a que apre-senta maior adequacao, inclusive no Direito do Trabalho17.

Entende-se que a nova disposicao normativa tem aplica-cao imediata, ou seja, incide sobre a relacao de emprego em curso, regulando apenas os fatos ocorridos daí para frente, sem atingir eventos anteriores já consumados.

Ao longo do contrato de trabalho ocorrem fatos com relativa autonomia entre si. Em regra, apenas aos fatos ocorridos a partir da vigencia desse novo comando normativo é que se aplica a sua regulamentacao. Se a norma de Direito do Trabalho fosse aplicada aos fatos anteriores á sua vigencia, o seu efeito seria retroativo, e nao imediato.

Obviamente, o contrato de trabalho já extinto nao é alcancado pela norma jurídica posterior á cessacao do vínculo, mas a relacao de emprego iniciada após a nova disposicao normativa é por esta regulada.

Ao adotar a teoria do efeito imediato, o art. 6º da Lei de Introducao ás Normas do Direito Brasileiro estabelece que a lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada18.

Trata-se do mesmo critério seguido pelo art. 912 da CLT, ao prever que os dispositivos de caráter imperativo terao apli-cagao imediata ás relacóes iniciadas, mas nao consumadas, antes da vigencia da Consolidacao das Leis do Trabalho.

Confirmando o exposto, o art. 2º da Medida Provisória 808/2017 estabelece que o disposto na Lei n. 13.467/2017 aplica-se, na integralidade, aos contratos de trabalho vigentes.

Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou. Consideram-se adquiridos os direitos que o seu titular, ou alguém por ele, possa exercer, como aqueles cujo comeco do exercício te-nha termo pré-fixo, ou condicao pré-estabelecida inalterá-vel, a arbítrio de outrem. Chama-se coisa julgada a decisao judicial de que já nao caiba recurso (art. 6º, §§ 1º, 2º e 3º, da Lei de Introducao ás Normas do Direito Brasileiro).

O direito adquirido é aquele que integra o patrimonio jurídico da pessoa. O direito é considerado adquirido no momento em que o titular preenche os seus requisitos, podendo, assim, exerce-lo quando quiser19. Logo, nao se exige o seu efetivo exercício.

Como exemplo de direito adquirido na esfera trabalhis-ta, tem-se a previsao da Orientacao Jurisprudencial 41 da SBDI-I do TST, no sentido...

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