Elementos para uma compreensão jurídica epistemologicamente autônoma dos contratos a partir de uma dialógica relação entre suum e commune

AutorFabrício Renê Cardoso de Pádua
Ocupação do AutorMestre em Ciências Jurídico-Filosóficas pela Universidade de Coimbra - UC
Páginas137-185
137
Capítulo V
ELEMENTOS PARA UMA COMPREENSÃO
JURÍDICA EPISTEMOLOGICAMENTE
AUTÔNOMA DOS CONTRATOS A PARTIR
DE UMA DIALÓGICA RELAÇÃO ENTRE
SUUM
COMMUNE
Tout ce qui augmente la liberte
augmente la responsabilité. Être
libre, rien n´est plus grave: la liberté
est pesante, et toutes les chaînes
qu´elle ôte au corps, elle le ajoute à
la conscience; dans la conscience, le
droit se retourne et devient
devoir
370
Victor Hugo
370 Tradução livre: “Tudo o que aumenta a liberdade aumenta a
responsabilidade. Para ser livre, não há nada mais sério: a liberdade é
pesada e todas as correntes que ela retira do corpo aumentam a
consciência; na consciência, o direito se revolve e torna-se dever.
138
1. O direito como resultado de uma intersubjetiva
relação de bilateralidade atributiva
Já tivemos a oportunidade de acentuar que para se
pensar em uma ordem de direito é preciso primeiro
pensar-se na opção por uma específica condição ética.
Não como se falar em direito sem que vislumbremos
primeiro os homens como que ligados, umbilicalmente,
por uma axiológica mutualidade relacional, a implicar,
invariavelmente, num paritário
ver
e
ser visto
no e pelo
outro
como sujeito ético, portador do mais elevado
status
de dignidade e que por isso se reconhece e é reconhecido
no e pelo
outro
, não como objeto, mas como sujeito
de
direitos
e
do direito
.
Ao acolhermos o direito como uma opção do
homem pelo homem em sua dignidade, somos obrigados
a afastar a concepção de semblante normativista que vê
na coerção a marca distintiva da juridicidade e, ainda na
trilha aberta por CASTANHEIRA NEVES e pelo
Jurisprudêncialismo de Coimbra, por certo, com alguma
influência, do que já foi tratado por ARISTÓTELES
como
relação
, por SÃO TOMÁS como
alteritas
, por
CHRISTIAN THOMASIUS como
exterioridade
, por
KANT como
heteronomia
e por STAMMLER como
querer entrelaçante
371, mas se distanciando destas
concepções clássicas, todas calcadas numa relação de
alteridade372 que “existe mesmo que o outro seja visto
371 REALE, Miguel,
Lições
..., p. 49.
372 Numa relação de alteridade “(...)a ampliação, ainda que não
absolutização
, da responsabilidade pelo Outro implicaria uma radical
139
unilateralmente só no ponto de vista do agente que se lhe
dirige, apenas pela perspectiva da autonomia desse agente
para que o outro seria “objecto” passivo, para o bem ou
para o mal”373 para fundar-se numa intersubjetividade
que consiste numa reciprocidade relacional, “num fazer
compartilhado, isto é, o acto de alguém, enquanto está ou
impedido ou permitido por outra pessoa, que põe estas
duas pessoas como comparticipantes dele e em um acto
conjunto de ambos” –, somos levados a crer que o critério
último de determinação do direito e o fator que o
distingue das demais experiências sociais é a
bilateralidade atributiva, que se estabelece entre os
sujeitos por intermédio de uma opção ética e que os
imerge em numa ordem com a índole do direito374.
Assim, analisar uma questão sob o prisma do
direito sempre resultará numa sua observação sob as
lentes da bilateralidade atributiva375, o que significa
inserir o objeto de análise no intersubjetivo376 contexto
comunitário, onde os sujeitos não só são tratados como
livres e iguais em razão de se reconhecerem uns nos
outros e no todo em sua dignidade , mas também onde
lhes seja exigido o respeito pelos limites estabelecidos às
aproximação, se não mesmo uma parcial diluição, do jurídico na ética,
acarretando inevitavelmente a perda de
autonomia
da juridicidade
que esta opção jurisprudencialista toma como pilar crucial da
afirmação do direito”. GAUDÊNCIO, Ana Margarida Simões,
Justiça...
, p. 197.
373 NEVES, António Castanheira,
Coordenadas...,
p. 14.
374 REALE, Miguel,
O Direito...
, p. 118.
375
Ibidem
.
376 NEVES, António Castanheira,
Coordenadas...
, pp. 15-16.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT