Equiparação Salarial: Novos e Velhos Dilemas

AutorRenata Orsi Bulgueroni
Páginas126-132
EQUIPARAÇÃO SALARIAL: NOVOS E VELHOS DILEMAS
Renata Orsi Bulgueroni(1)
(1)DoutoraeMestrapelaFaculdadedeDireitodaUniversidadedeSãoPauloáreadeconcentraçãoDireitodoTrabalhoedaSeguridade
SocialDTBSAdvogadaProfessoradeDireitodoTrabalhoDireitoProcessualdoTrabalhoeDireitoPrevidenciáriodoDamásioEduca-
cionaledaGVLawFundaçãoGetúlioVargasPesquisadoradoGETRABUSP
(2) Comentários à reforma trabalhista.edSãoPauloRevistadosTribunaisp
(3) Curso de direito do trabalhoedSãoPauloLTrp
1. Introdução
A equiparação salarial é corolário do princípio consti-
tucional da isonomia (art. 5º, caput, e art. 7º, XXX, da
Constituição Federal de 1988CF/88), afinal, por ób-
vio, não seria admissível que trabalhadores em condições
equânimes percebessem salários diferenciados, por mero
capricho do empregador. Trata-se, pois, de garantia des-
tinada ao legislador infraconstitucional (que não poderia
criar uma lei com diferenciações salariais injustificadas) e
ao empregador (que deve assegurar salário igual a todo
trabalho de igual valor).
Em âmbito internacional, a matéria é disciplinada nas
Convenções n. 100 e n. 111 da Organização Internacional
do Trabalho – OIT (ambas ratificadas pelo Brasil). A Con-
venção n. 111, aliás, foi eleita, na Conferência de 1998,
como uma das mais importantes da Organização, de ob-
servância obrigatória a qualquer país que venha a dela se
tornar membro, independentemente de ratificação. Consi-
dera-se, dessa maneira, a igualdade salarial como um dos
direitos fundamentais do trabalhador (assim como a liber-
dade sindical, a negociação coletiva plena e a tutela do
trabalho da mulher, da criança e do adolescente).
Em âmbito interno, a equiparação salarial é consagra-
– CLT, que veio a sofrer profundas alterações com a Lei
n.13.467/17 (popularmente conhecida como “Reforma
Trabalhista”). Para estudo do tema, ainda, mostra-se tam-
bém imprescindível a análise da Súmula n. 6 do Tribunal
Superior do Trabalho – TST, a qual deve sofrer alterações
em face da Reforma, mas provavelmente será mantida in-
tacta em muitas de suas previsões.
O estudo da equiparação salarial passa, primeiramente,
pela identificação dos requisitos para sua caracterização.
Após, imprescindível se faz a análise das causas excluden-
tes à isonomia salarial para, só então, apresentarem-se
os questionamentos que a cercam, especialmente em de-
mandas judicias. Esse é, portanto, o iter que o presente
artigo se propõe a seguir.
2. Requisitos da equiparação salarial
A despeito de concretizar o ideal isonômico contido na
Constituição Federal de 1988, a equiparação salarial deve
ser interpretada com cautela, sob pena de comprometer a
própria atividade empresarial pelo engessamento de polí-
ticas remuneratórias.
Atento a isso, o legislador pacificou, no art. 461 da CLT,
requisitos para a equiparação entre reclamante (também
chamado “paragonado”) e paradigma — ou, simplesmente,
“identidades” que devem existir no caso concreto, a justifi-
car a isonomia. Algumas dessas identidades permaneceram
intactas com a Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/17); ou-
tras, por seu turno, sofreram profunda alteração; alteração
que, no entender de Homero Matheus Batista da Silva, de-
monstrou clara intenção do legislador reformista em “res-
tringir drasticamente a concessão dessa diferença salarial
em sede de processo judicial trabalhista”.(2)
Como primeiro requisito, destaca-se a identidade de
funções — afinal, por óbvio, reclamante e paradigma ne-
cessitam exercer idênticas funções para que seja justifica-
da a igualdade salarial.
A esse respeito, a doutrina trabalhista aponta para distin-
ção conceitual entre “função” e “tarefa” ou “atribuição”.
Segundo Mauricio Godinho Delgado, de fato, “tarefa”
consiste em uma atividade específica desempenhada pelo
trabalhador (ou seja, uma atribuição singular no contexto
da prestação de serviços), enquanto função representa a
reunião coordenada de um conjunto de tarefas (em outras
palavras, um todo unitário).(3) Sob esse viés, é possível que
uma função, teoricamente, englobe uma única tarefa (em-
bora pouco comum), bem como que uma tarefa encon-
tre-se compreendida dentro de diversas funções (situação
extremamente frequente no contexto laboral).
Ao exigir a identidade de funções para a equiparação
salarial, a CLT deixa claro, portanto, que todas as tarefas
desempenhadas por paradigma e reclamante devem ser
idênticas, sob pena de afastar-se a justificativa para a iso-
nomia. O fato de o paradigma exercer uma única tarefa
a mais do que o paradigma, assim, é suficiente, em tese,
para a improcedência do pleito.
A Reforma Trabalhista nada muda em relação a tal
requisito — razão pela qual as observações acima ex-
pendidas mostram-se, ainda, pertinentes ao estudo da
equiparação. Também se mantém inalterado, de outra
parte, o entendimento consubstanciado na Súmula 6, III,
Livro - Reedição Nelson Mannrich.indb 126 30/08/2018 09:57:06

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