A exclusão social e as favelas na cidade do Rio de Janeiro / Social exclusion and slum in Rio de Janeiro

AutorMarconi do Ó Catão
CargoDoutorando em Direito da Cidade, pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro; Doutor em Sociologia, pela Universidade Federal da Paraíba; Mestre em Direito, pela Universidade Federal do Ceará; Professor do Departamento de Direito Privado do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Estadual da Paraíba. E-mail: moct@uol.com.br
Páginas1002-1045
Revista de Direito da Cidade vol.07, nº 03. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2015.18839
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Revista de Direito da Cidade, vol.07, nº 03. ISSN 2317-7721 pp.1002-1045 1002
A E XCL US ÃO SO CIA L E A S FA VE LAS N A C IDA DE DO RIO DE JA NE IR O
SO CI AL EXCLU SI ON AN D SLU M IN R IO DE J ANE IR O
Ma rc oni d o Ó Catão
1
Resumo
Este texto discorre sobre as iniquidades sociais presentes na realidade do cotidiano brasileiro, como
consequências advindas da Globalização. O objetivo central deste estudo é articular as concepções de
pobreza e exclusão social, com o paradoxo da cidade do Rio de Janeiro, como reflexo das
desigualdades sociais ainda presentes no século XXI. O método de procedimento adotado foi o
descritivo-analítico, no intuito de realizar uma abordagem entre as áreas jurídica, social e urbanística.
Assim, apresentamos um problema resultante dos históricos modelos urbanos adotados no Brasil,
cujo planejamento insuficiente acarreta sérias repercussões nos campos sanitário, ambiental,
econômico e, especialmente, social. Os estudos realizados permitiram concluir que um número
significativo de moradores das favelas do Rio de Janeiro integram grupos sociais caracterizados pela
exclusão, pobreza e privação ou ineficácia no atendimento dos direitos sociais. Por fim, foi evidenciada
a necessidade de políticas públicas urbanas que solucionem a problemática do direito à moradia
digna, por intermédio da efetivação de programas de regularização fundiária no Brasil.
Palavras-chave: Exclusão Social; Regularização das Favelas; Rio de Janeiro/Cidade.
Abstract
This paper discusses the social inequities present in the reality of Brazilian daily life, as the
consequences resulting from globalization. The central aim of this study is to articulate the concepts of
poverty and s ocial exclusion, with the paradox of the city of Rio de Janeiro as a reflection of social
inequalities still present in the XXI century. The method of procedure adopted was descriptive-
analytical, in order to implement an approach between the legal, social and urban areas. Thus, we
present a resulting problem of historical urban development models adopted in Brazil, whose lack of
planning has serious repercussions in the health, environmental, economic and especially social f ields.
The studies showed that the vast majority of slum dwellers in Rio de Janeiro integrate social groups
characterized by exclusion, poverty and deprivation or ineffectiveness in the care of social rights.
Finally, we showed the need of urban public policies that address the issue of the right to adequate
housing, through the realization of suitable land regularization programs in Brazil.
Keywords: Social Exclusion; Regularization of Slum; City of Rio de Janeiro.
1 Doutorando em Direito da Cidade, pela Universidade Estadual do Ri o de Janeiro; Doutor em Sociologia, pela
Universidade Federa l da Par aíba; Mestre em Direito, pela Universidade Federal do Ceará; Professor do
Departamento de Direito Privado do Centro de Ciências Jurídicas da Universidade Estadual da Paraíba. E-mail:
moct@uol.com.br
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DOI: 10.12957/rdc.2015.18839
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INT RO DUÇ ÃO
Em todo o mundo, a perspectiva de internacionalização da economia, juntamente com a
tendência neoliberal, desencadearam uma elevação significativa das desigualdades sociais. Logo, a
temática da justiça social tornou-se o foco das discussões locais e internacionais, tendo em vista que o
aumento das desigualdades e, consequentemente, da exclusão social, surgiram como fatores
determinantes de rupturas sociais, afastando então o ideal de concretização de uma nova sociedade,
democrática e justa.
Nesse sentido, a problemática da injustiça social, concomitantemente ao fenômeno da
construção de um modelo social moderno, isso entre os séculos XVI e XVIII, são matérias de
constantes estudos e debates entre os intelectuais deste período. Na Europa, o século XIX ficou
caracterizado pelas discussões sobre as iniquidades sociais a partir da Revolução Industrial; na
América Latina, tal abordagem eclodiu, sobretudo, com as independências das colônias e com a
abolição da escravatura. No Brasil, esse assunto tem igualmente toda uma história, representando um
dos alicerces fundantes de nossa identidade e pensamento social, que, lamentavelmente, resultaram
na atual realidade social revelada na figura concreta da exclusão.
Na conjuntura nacional brasileira, é comum haver uma certa associação, com tendência a
homogeneização, entre os temas basilares das iniquidades sociais, representadas pela desigualdade,
pobreza e exclusão. Assim, torna-se pertinente, inicialmente, fazermos uma breve distinção conceitual
entre eles: a desigualdade social diz respeito à distribuição diferenciada (para mais ou para menos)
das riquezas materiais e simbólicas produzidas por uma sociedade e apropriadas pelos seus
participantes; a pobreza, por sua vez, traduz a situação em que se encontram os membros de um
determinado grupo de pessoas sem recursos adequados para ter uma vida digna, ou que não dispõem
de condições mínimas para manter suas necessidades humanas mais elementares; a concepção de
exclusão social se aproxima, em um contexto de oposição, ao conceito de coesão social ou, na
perspectiva de ruptura, com a ideia de vínculo social. Acrescente-se, também, no sentido de
similitude, a identificação da exclusão social com as noções de desvio e de estigma; sendo que neste
caso, a diferença se verifica no fato de que o excluído não precisa praticar nenhuma transgressão, de
modo diverso do desviante e a semelhança dos que sofrem discriminação pura e simples.
2
No século passado, a partir da década de 1980, houve uma significativa ampliação do processo
de internacionalização das economias capitalistas que se convencionou chamar de Globalização,
sendo caracterizado por uma integração dos mercados financeiros mundiais e por um crescimento do
2 NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do. Dos excluídos necessários aos excluídos desnecessários. In. BURSZTYN. No
meio da rua: nômades, excluídos e viradores. 2. ed. Rio de Janeiro: Garamond , 2003, p. 58-59.
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comércio internacional, especialmente no âmbito dos grandes blocos econômicos. Nesse cenário,
ressalte-se a pr esença crescente de empresas transnacionais, representando um aspecto peculiar,
pois, diversamente das corporações multinacionais, características nas décadas de 60 e 70 do século
XX, constituem uma nova realidade no âmbito mercadológico.
Desse modo, as decisões internacionais exteriorizam-se por uma ampla movimentação
financeira, que têm lógicas autônomas em relação aos Estados Nacionais. Em consequência disso, o
espaço para operacionalização de políticas públicas -se bastante reduzido, visto que a condução das
iniciativas sociais financeiras é comprometida pela imensa quantidade de recursos que circula no
mercado econômico internacional, ultrapassando as fronteiras nacionais.
Nessa ótica, convém perceber que, ao contrário das empresas multinacionais, com tendência
a reprodução das tradicionais relações de trabalho, as empresas transnacionais, além de fabricarem
diferentes partes do produto em vários países, os realizam sob contratos de trabalho diversificados,
optando pela conveniência adequada ao caso especifico (mão de obra familiar, contratos
convencionais, trabalho em tempo parcial, parcerias etc.). Dessa forma, o atual padrão de acumulação
de capital vem modificar a tradicional noção de ocupação, haja vista que formou uma nova concepção
de emprego, sendo mais flexível, precário e sem as garantias de estabilidade típicas do padrão
convencional.
Portanto, em sociedades nas quais o emprego traduz um referencial, tanto na obtenção de
renda quanto nos processos de integração social e de formação da identidade pessoal, tal
transformação tem um impacto significativo, levando ao surgimento de uma representação social a
partir do sentimento de desamparo, que é maximizada pelo fato de o Estado, que antes da Segunda
Grande Guerra era tido como garantidor das proteções sociais, encontrar-se passando por uma
reestruturação, redefinindo suas funções.
Com efeito, Wolfe
3 enfatiza o fato de que os trabalhadores que anteriormente tinham acesso
a bens públicos e benefícios sociais garantidos pelo Estado, incorporando-os às suas expectativas,
viram-se ameaçados nestes direitos, gerando assim uma consciência de injustiça e agravamento das
condições de vida. Logo, foi neste contexto globalizado e de modificação na função estatal que eclodiu
uma nova variedade de exclusão social.
De fato, em várias cidades do Brasil, áreas centrais modernas encontram-se praticamente
cercadas por parcelamentos periféricos pobres, em geral irregulares, sendo a autoconstrução uma
constante. De maneira que, nos setores mais valorizados, edifícios e construções luxuosas coexistem
3 WOLFE, Marshall. Globalization and social ex clusion: some paradoxes. In: ROGERS, Gary; GORE, Charles &
FIGUEIREDO, José (Orgs). Social exclusion: rethorie, reality, reposnes. Genebra: International Institute for Labor
Studies, 1995. Passim.

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