A tutela jurisdicional coletiva como instrumento facilitador dos direitos da pessoa portadora de deficiência, uma efetivação à cidadania: a interpretação justa e necessária dos mecanismos coletivos em prol da inclusão social

AutorDirceu Pereira Siqueira
CargoMestre em Direito Constitucional - Pesquisador do Núcleo de Pesquisas - Professor Titular no Curso de Direito das Faculdades Integradas de Ourinho - Advogado
Páginas2-14

Page 2

Introdução

Almeja-se com este estudo, demonstrar à importância da tutela jurisdicional coletiva, por meio das ações coletivas em face das pessoas portadoras de deficiência, desta forma, acentuar a questão atinente a necessidade de, a cada dia mais acentuar-se a proteção a estas pessoas, tanto na esfera jurisdicional individual, como na coletiva.

Nesta esteira, buscou-se demonstrar a importância em se estimular a defesa das pessoas portadoras de deficiência por meio de instrumentos coletivos, principalmente em função de seu nível de abrangência.

Ao efetivarmos tais direitos, estamos oferecendo à pessoa portadora de deficiência, condições dignas de vida atendendo as imposições do texto constitucional e efetivando a inclusão social, e acima de tudo efetivando um Estado Democrático Social de direito.

Salientamos, porém, que o estudo aqui tratado poderá apenas ensejar algumas reflexões em torno de alguns pontos, vez que o tema por si só merece um estudo mais aprofundado, o que não poderíamos fazer neste momento.

2 Pessoa portadora de deficiência

Pois bem, cumpre-nos ressaltar de maneira inicial, que cuidaremos de desenvolver o tema, no cenário jurídico brasileiro, afinal se fôssemos estudá-lo na esfera mundial, demandaríamos talvez de um estudo específico, o que não se apresenta neste momento, mesmo considerando todos os atrativos do tema.

Desta forma, destaquemos que no Brasil, o estudo evolutivo relativo à pessoa portadora de deficiência tem origem já com os primeiros habitantes desta terra, tão logo com os índios.

Page 3

Afinal nesta fase podíamos constatar que algumas anomalias já se apresentavam entre os povos, no cenário social da época, por ocasião de questões genéticas, ou também por ocasião de lutas ou mesmo acidentes.

Destaquemos, ainda, que nesta fase o nascimento com qualquer tipo de deficiência, era compreendido como um castigo divino, o qual somente se corrigiria com o sacrifício daquela criança, considerava-se tal sacrifício como regra, afinal assim eram os costumes indígenas da época, ressalta-se assim, a falta de compreensão que permeava aquela população, e que por ocasião desta ignorância inúmeras atrocidades foram cometidas.

Passado este momento da história, passamos ao período da colonização, marcado pela escravidão, e desta maneira, face ao momento histórico, podemos destacar que o escravo era tido como valoroso pelos serviços que poderia prestar, e neste cenário o escravo deficiente não tinha valor, pois não poderia desenvolver as tarefas de acordo com a conveniência de seu senhor.

Com o advento da Constituição de 1824 denotamos alguns avanças quanto à pessoa portadora de deficiência, por ocasião da previsão do artigo 179, inciso XIII, que cuidou de trazer a previsão da igualdade, e com isso melhorou as condições de vida destas pessoas, afinal passaram a ser consideradas pelo texto constitucionais, titulares de uma igualdade quanto a toda sociedade.

Já com o texto constitucional de 1946, não tivemos grandes avanços, afinal, além do fato de manter em seu bojo a previsão de igualdade, apenas inovou no tocante à previdência social para o trabalhador acometido de invalidez, que cuidou no art. 157, XVI, que assim dispôs:

Art. 157 - A legislação do trabalho e a da previdência social obedecerão nos seguintes preceitos, além de outros que visem a melhoria da condição dos trabalhadores:

[...]

XVI - previdência, mediante contribuição da União, do empregador e do empregado,

em favor da maternidade e contra as consequências da doença, da velhice, da invalidez e da morte;

[...]

Desta forma, podemos salientar que após o texto constitucional de 1946, os direitos sociais passaram a ganhar relevo tanto na esfera constitucional, como a esfera infraconstitucional, a destacar-se o surgimento da Consolidação das Leis do Trabalho, o que reflete um marco nos direitos sociais.

Com a Constituição de 1967, tivemos poucos avanços no tocante ao social, sendo que neste diapasão, desenvolvemos muito pouco no que se refere à pessoa portadora de deficiência, fato este que talvez tenha ocorrido por ocasião do momento repressivo que o país atravessava, em face do período militar, sendo que desta forma apenas prevaleceram os direitos que já estavam positivados nos textos constitucionais anteriores.

Page 4

Já com a Constituição de 1967, pudemos notar alguns avanços importantes, com destaque relevante à Emenda nº. 12 que cuidou de trazer a proteção das pessoas portadoras de deficiência, conforme enunciado em seu artigo único:

É assegurada aos deficientes a melhoria de sua condição social e econômica especialmente mediante: I) educação especial e gratuita; II) assistência, reabilitação e reinserção na vida econômica e social do País; III) proibição de discriminação inclusive quanto à admissão ao trabalho ou ao serviço público e a salários; IV) possibilidade de acesso a edifício e logradouros públicos. (g.d.)

Desta maneira temos que a Emenda n. 12, foi base para uma série de medidas judiciais na proteção das pessoas portadoras de deficiência, tendo como especial à ação das pessoas portadoras de deficiência que requereram acesso às rampas de embarque do metrô paulista2.

Já em 1974, merece destaque a Lei 6.179, de 11 de dezembro de 1974, a qual trouxe a previsão do Amparo Previdenciário destinado aos maiores de setenta anos de idade e para os inválidos de maneira definitiva que encontrassem incapacitados para o trabalho, sendo que desta maneira, tornou-se um dos maiores avanços da época no tocante ao social.

Nesta esteira chegamos ao texto constitucional de 1988 que cuidou de inovar de maneira considerável as previsões quanto às pessoas portadoras de deficiência, talvez por ocasião de trazer em seu bojo a previsão de um Estado Democrático de Direito, e desta forma tratou de prever um rol bem extenso de direitos e garantias constitucionais a dignidade da vida humana.

Neste sentido RAGAZZI e ARAÚJO, 2007, p. 43:

A Constituição Federal de 1988 teve o papel de resgatar a democracia no Estado Brasileiro. Estávamos mergulhados numa situação que trazia forte restrição ao exercício das liberdades democráticas, com um Poder Judiciário que exercia jurisdição de forma limitada, deixando de atuar de forma independente3.

Mais especificamente quanto à pessoa portadora de deficiência, pudemos observar que “a preocupação do constituinte de 1988 não se limitou à inserção de princípios inclusivos4”, mas o texto constitucional de 1988 tornou-se um instrumento bastante hábil em sua defesa, sendo que naquele momento dever-se-ia apenas manusear sabiamente o que o constituinte originário já havia previsto.

Page 5

Assim, neste momento, cumpre-nos definirmos pessoa portadora de deficiência já sob os auspícios do texto constitucional de 1988, sendo que neste contexto, acerca do conceito dispõe ARAUJO, 2001, p. 13:

O que define a pessoa portadora de deficiência não é falta de um membro nem a visão ou audição reduzidas. O que caracteriza a pessoa portadora de deficiência é a dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade de se relacionar, de se integrar na sociedade. O grau de dificuldade para a integração social é que definirá quem é ou não portador de deficiência.5.

Outro ponto relevante no estudo do tema, e muito discutido pela doutrina é atinente à terminologia empregada para determinar a pessoa deficiente, sendo que o termo mais frequentemente utilizado, concebido até mesmo pelo texto constitucional é o termo pessoa portadora de deficiência, sendo que é um termo de bastante utilização e tem como vantagem evidenciar a pessoa e não a deficiência, conforme leciona ARAUJO, 2001, p. 10:

A última expressão, «pessoas portadoras de deficiência», tem o condão de diminuir o estigma da deficiência, ressaltando o conceito de pessoa; é mais leve, mais elegante, e diminui a situação de desvantagem que caracteriza esse grupo de indivíduos. Pelos motivos acima, a expressão «pessoas portadoras de deficiência», onde o núcleo é a palavra «pessoa» e «deficiência» apenas um qualificativo, foi aquela que julgamos mais adequada para este estudo. Há valorização da «pessoa» a qualificação, apenas, completa a ideia nuclear 6.

Porém, devemos ainda destacar como outra opção, sendo que já nos manifestamos nossa opção pelo termo pessoa portadora de deficiência, o termo “pessoas portadoras de necessidades especiais”, terminologia esta utilizada por alguns autores, a exemplo de ASSIS e POZZOLI, 2005, p. 236:

Argumentam que o termo ‘deficiência’, em virtude da força semântica, os coloca em uma situação perene de desvantagem em relação a outras pessoas, ao passo que o termo “necessidades especiais” implica desvantagem apenas circunstancial. Por exemplo, um professor que depende de muletas para se locomover não apresentaria nenhuma deficiência em relação aos seus colegas de profissão; a sua situação implicaria apenas necessidades especiais ligadas ao ambiente de trabalho: necessidade de rampas ou elevadores7.

Pois bem, o texto constitucional de 1988 garantiu diversos direitos específicos das pessoas portadoras de deficiência, a exemplo da proibição de discriminação8;Page 6reserva de vagas em concursos públicos; o direito à saúde; educação especial9; o direito à integração social; o direito à habilitação e reabilitação; o direito a uma renda mensal de um salário mínimo10; o direito de acesso a logradouros e edifícios de uso público; o direito de locomoção; o direito de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT