Federalismo fiscal e efetividade da dignidade da pessoa humana: análise da posição do município na estrutura do financiamento público brasileiro e a escassez de recursos para as ações de saúde / Fiscal federalism and effectiveness of human dignity...

AutorAndré Alves Portella, Rafaela Pires Teixeira
CargoDoutor em Direito Financeiro e Tributário pela Universidad Complutense de Madrid, menção honrosa Doctors Europeus; Professor Adjunto de Direito Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da UFBA, Professor Adjunto da Universidade Católica do Salvador (UCSal); Pesquisador CNPq/FAPESB. E-mail: aaportella@hotmail.com - Mestre em Políticas ...
Páginas631-679
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 2. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.21506
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O presente estudo objetiva verificar a sustentabilidade do modelo de financiamento público
brasileiro, na perspectiva municipal, à vista do descompasso entre o amplo universo de atribuições
administrativas, e a escassez de recursos financeiros, e suas repercussões sobre políticas sociais
relacionadas à promoção da Dignidade da Pessoa Humana. Com base em dados empíricos de
arrecadação e despesas, visa analisar a possibilidade de efetivação destas políticas sociais, com
ênfase na realidade do financiamento das ações de Saúde Pública, no plano Municipal. Partirá de
estudo conceitual sobre a organização política-administrativa do Estado, como meio de viabilizaç ão
dos direitos fundamentais, para aprofundar na situação atual do federalismo brasileiro,
especialmente na sua perspectiva do fina nciamento municipal na área da saúde.
-Federalismo Fiscal; Financiamento Público; Município; Dignidade Da Pessoa
Humana; Políticas Sociais; Saúde
This study aims to verify the sustainability of Brazilian's public funding model, on the municipal
perspective, the view of the mismatch between the broad universe of administrative functions, and
the scarcity of financial resources, and its impact on social policies related to the promotion of the
Individual Dignity Human principle. Based on empirical data collection and expenditure, aims to
analyze the possibility of realization of these social policies, with emphasis on the reality of
financing actions of Public Health in Municipal plan. Depart from conceptual study on the political
and administrative organization of the state as a means of enabling fundamental rights, to deepen
the current situation of Brazilian federalism, especially in its view of municipal financing in health .
federalism; public financing; local administration; dignity of human person; social
policies; public health
1 Doutor em Direito Financeiro e Tributário pela Universidad Complutense de Madrid, menção honrosa
Doctors Europeus; Professor Adjunto de Direito Financeiro e Tributário da Faculdade de Direito da UFBA,
Professor Adjunto da Universidade Católica do Salvador (UCSal); Pesquisador CNPq/FAPESB. E-mail:
aaportella@hotmail.com
2 Mestre em Políticas Sociais e Cidadania pela UCSal; Professora de Direito da Faculdade UNIJORGE,
Salvador/Bahia. E-mail: rafapteixeira@yahoo.com.br
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A efetivação das políticas públicas, voltadas à promoção da Dignidade da Pessoa Humana,
aí incluídas as chamadas políticas sociais, pressupõe uma estrutura estatal que dê suporte à sua
realização. A Saúde, a Educação, a Segurança Pública, dentre outras políticas de governo e de
Estado, somente serão implementadas se houver uma estrutura gerencial que as viabilize. Neste
contexto, a chamada organização política-administrativa do Estado, assim entendida a forma como
se organizam as relações entre os entes que compõem o Estado Nacional, constitui a opção inicial
na constituição da estrutura gerencial que dará vazão a todo o funcionamento da Administração
Pública.
Nestes termos, a estrutura federativa da organização política-administrativa do Estado
brasileiro não pode ser considerada fru to do acaso. Trata-se de uma opção do Estado, que, além da
forte influência do modelo norte-americano, precursor do federalismo de cooperação, encontra
razões de natureza técnica, relacionadas especialmente à necessidade de distribuição de
competências administrativas por todo um ter ritório de dimensões continentais.
Em contraste, tanto o modelo de Estado Unitário, como o de Estados Confederados, por
razões distintas, não parecem suficientes a oferecer as virtudes necessárias às relações político-
administrativas de um Estado com as características que possui o Estado brasileiro. O modelo de
Estado Unitário, por um lado, não oferece a dinâmica da descentralização gerencial, que possibilite
o amplo alcance das políticas públicas de maneira linear e uniforme em todo o território. A
Confederação de Estados, por outro lado, carece da coesão política entre os entes constituintes,
necessária ao bom encaminhamento da cobertura estatal.
A formulação das políticas nacionais supõe a existência de um Ente central que estabeleça
as diretrizes gerais das políticas públicas, e que sirva de linha condutora de toda a nação, como
uma espécie de coordenador gerencial. Não obstante, também é necessário que sejam respeitadas
as peculiaridades regionais, o balanceamento da intensidade e amplitude das ações, de forma
alinhada às distintas realidades territoriais, sem prejuízo da coesão política frente às relações
internacionais. A estas necessidades, amolda-se a opção pelo Federalism o.
Não obstante, são muitas as fragilidades do Federalismo brasileiro, especialmente quando
se adota como parâmetro de avaliação a realidade da efetivação das políticas públicas. Tais
fragilidades decorrem tanto de razões h istóricas, anteriores à própria opção legislativa pelo modelo
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federalista, como também por motivos relacionados aos moldes que o pacto federativo brasileiro
assumiu, por opção do Estado.
Uma primeira fragilidade a ser notada tem a sua origem na própria concepção do Estado
brasileiro, e da evolução da sua estrutura pautada no centralismo político. Trata-se de um Estado
que tem suas raízes no Colonialismo, na imposição da vontade e da norma, por parte de uma
metrópole distante e exploradora dos meios de produção. O Federalismo brasileiro não nasceu da
comunhão de poderes entre entes políticos já estabelecidos, que outorgaram parcela do seu poder
em favor de um entre central (movimento centrípeto). Originou-se, em realidade, a partir de um
movimento inverso, de outorga de parcelas de poder do ente central em favor de entes periféricos
que passaram a ser formalizados a partir de ent ão (movimento centrífugo). Esta dinâmica terminou
por deixar marcas muito claras na dinâmica da estrutura federativa brasileiro, especialmente no
sentido da concentração do poder político no Ente c entral.
Nesta perspectiva histórica, as Constituições Federais de 1946 e 1988 (CF/88) despontam
como tentativas de estabelecimento de uma descentralização política administrativa efetiva, que
terminaram por ter suas normas referentes ao Pacto Federativo relativizadas pelas circunstâncias
políticas, econômicas e sociais que seguiram às suas promulgações. A opção federativa de 1946 foi
relativizada inicialmente pela Constituição de 1967, e especialmente pela Emenda Constitucional n.
01 de 1969. A opção federativa de 1988, foi relativizada, sobretudo na sua dimensão do
financiamento público, pelas reformas do Estado brasileiro observadas na década de 1990,
principalmente na sua primeira metade, cujos reflexos encontram-se claramente presentes na
atualidade.
Mesmo ao considerar os detalhes do modelo estabelecido no texto da CF/88 é possível
identificar contradições claras entre normas gerais de caráter principiológico que anunciam a
existência de um Estado Federal, e normas específicas que terminam por contradizer a opção
constitucional por este mesmo Pacto Federativo anunciado. Assim, embora o art. 1º da CF/88
anuncie a República Federativa formada pela união indissolúvel dos seus entes políticos, nota-se
um forte desequilíbrio entre as fontes de financiamento dos distintos entes, e o volume de
atribuições administrativas, notadamente no plano municipal.
A estrutura do financiamento público encontra-se pautada num modelo de dependência às
transferências financeiras dos Estados, e principalmente da União, as quais correspondem a parte
significativa das fontes do financiamento da maioria dos Municípios. As competências tributárias
que foram outorgadas aos entes municipais, por um lado, foram insuficientes para viabilizar o seu

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