O Formalismo, a Lógica do Razoável e a Tecnologia na Efetividade da

AutorAntonio Carlos Facioli Chedid. Antonio Carlos Facioli Chedid Junior
CargoAdvogado e professor de Processo Civil e Processo do Trabalho e Direito do Trabalho em Santa Catarina. Formando da Unisul - julho/2004
Páginas9-15

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O eminente Cândido Rangel Dinamarco, examinando os novos padrões processuais, deu, a nosso sentir, o caminho a ser almejado por todos, quando, com sua costumeira clarividência, seguindo a conhecida observação de Albert Einstein1, asseverou que "o tempo dirá a última palavra sobre as excelências ou mazelas da inovação (...) mas quem não ousa inovar não se aperfeiçoa" (in "A Reforma do Processo Civil", 3a. ed. p. 180). Não é mesmo verdade que a efetividade do devido processo legal ou da Justiça não se subsume apenas no direito de ação, decisão e execução, mas também na satisfação efetiva da lesão, ou seja, na posse do bem da vida pretendido e isto somente se aperfeiçoa à realidade e aos sentimentos do homem lesado, se ocorrer com precisão e celeridade, portanto, de maneira justa, segundo a concepção social.

Serviu de modelo nas últimas décadas a Justiça do Trabalho para os demais ramos do Judiciário, em face, fundamentalmente, do instituto da conciliação, da informalidade, ou ausência de formalismo legal e institucional, dispensabilidade do advogado - aqui a nosso pensar um equívoco histórico, perdoem os doutos -, processo e procedimentos simplificados, alçada, gratuidade parcial, poderes amplos do juiz na direção do processo e na sua impulsão oficial, recurso por simples petição ou mesmo tomado a termo, execução de ofício, certeza real em detrimento da mera verdade legal, princípio da primazia da realidade, proximidade nunca vista com a coletividade, publicidade, transparência etc.

Descabe aqui, nos estritos limites desta manifestação, indagar acerca das razões que levaram este ramo do Judiciário, ou melhor, o legislador, à inércia irreverente na implementação de reformas e adequações à realidade e à modernidade desejada pela sociedade e, em especial, pelas partes que a ela acorrem e pelos advogados que exercem seu nobre e indispensável mister, talvez até porque qualquer alteração na legislação trabalhista realce o interesse das categorias profissionais, que congregam a maioria da população ativa do país. Vale lembrar aqui a tentativa de minimizar o garantismo estatal, em confronto com o novo Código Civil (parte da população brasileira sequer sabe ou tomou conhecimento da existência das novas regras de conduta), enquanto a maioria desconhece o CC, de outro lado, conhece de perto a velha CLT, não só pela repercussão na mídia e pelas pressões das categorias (profissionais e econômicas), mas por sofrer a influência de suas regras, resultando oportunamente obstada pela classe operária e pelas associações. A polêmica a respeito da desregulação das relações de trabalho revolveu a Nação inteira, bastando lembrar também as manchetes jornalísticas e o pronunciamento de quase todas as autoridades, sindicatos, centrais, clero, políticos, trabalhadores, desempregados, organismos internacionais etc.

O certo é que a Justiça comum e a Federal comum sofreram profundas reformas e inovações, ora através do instrumento de atuação da jurisdição (o processo), ora pela criação de novos organismos, como o Juizado de Pequenas Causas Cíveis e Criminais, Juizados Especiais, Turmas de Recursos, Mediação e Arbitragem e Conciliadores. A par disso, reformas outras inovaram no peticionamento, na postulação, na prestação jurisdicional, na comunicação dos atos processuais (citações simples, tomada a termo da reclamação, dispensabilidade do advogado - replay do equívoco -, antecipação de tutela, conciliação inicial e obrigatória e outros institutos), no recurso (rejeição liminar, na forma do art. 557 do CPC, agravo de instrumento com novos efeitos e ajuizado perante os Tribunais - salvaguarda de conexão indispensável à antecipação de tutela -, autenticidade de documentos declarada por advogado, poderes aos relatores, e mais...) e em inúmeros outros institutos desde 1994, com microrreformas.

Na Justiça do Trabalho atuou com eficiência e, diga-se, visionária e soberanamente, o Supremo Tribunal Federal2 , alargando sua competência, mediante nova e produtiva interpretação da Constituição Federal, que vinha sendo rejeitada, de regra, pela própria Justiça Trabalhista, a par da competência tributária de interesse exclusivo da União Federal (contribuições previdenciárias, na forma do art. 113, parágrafo 3º), que promoveu a inclusão constitucional ante a divergência reinante na jurisprudência.

Manteve-se o jus postulandi, esdrúxula forma irreal de tratar os menos favorecidos e servil maneira de desigualdade baseada em graduação de valor econômicopecuniário (Juizado Especial, Rito Sumaríssimo, Alçada etc.) ratificando-se a Lei nº 5.584/70, oriunda de conchavos políticos da ditadura militar, que, ilusoriamente, concedeu benefícios de assistência em critérios objetivos de dois salários mínimos, dando a também maliciosa conotação de que quem percebe mais do que dois salários mínimos seria "abastado", em desrespeito à realidade vivida e sofrida e à Constituição, que fixou critério subjetivo de insuficiência de recursos para sustento próprio ou da família e concessão maior de assistência jurídica (CF, art. 5º, inciso LXXIV - Direitos e Garantias Fundamentais), atribuindo ao sindicato honorários de advogado pelo cumprimento de obrigação institucional e legal inerente às suas atribuições, pagos pelo empregador, como meio de sua submissão e conservação do peleguismo. Vige, apesar disso, a lei em apreço, embora não recepcionada pela Constituição de 1988, no particular, e ainda por manifesta incompatibilidade com as regras do novo Estatuto da Ordem dos Advogados Brasil.

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Suas co-irmãs, que sofreram por longos anos de uma paralisia por contaminação de uma formação quase depositada na arqueologia jurídica, abandonaram a estagnação e partiram, com a coragem de seus magistrados, embora de maneira homeopática, para uma reforma de fundo e com uma visão futurística da própria realidade moderna.

O formalismo e o conservadorismo foram alijados. Essas colocações, fruto de longas observações, históricas, são lançadas em síntese apertadíssima e têm o fito exclusivo, por amostragem, de conectá-las às recentes decisões dos Tribunais Superiores sobre as comunicações judiciais pelos meios eletrônicos e através de Protocolos Integrados, em primeiro e segundo graus de jurisdição, tendo-se presente que a interpretação isolada e literal tende a naufragar em mar calmo e águas rasas, tônica das observações que seguem.

Algumas dessas decisões dos Tribunais Superiores, rogata maxima venia, e, em especial, do colendo TST têm preocupado aqueles que pretendem dar ao Judiciário impulso de modernidade, através do uso de novas tecnologias, notadamente aos meios de comunicação dos atos processuais, de envio e recepção das ações, petições e requerimentos lato sensu (judiciais e administrativos), daí decorrentes, assim como da publicidade efetiva e eficaz dos atos de impulsionamento e decisão do processo (despachos e sentenças). Algumas delas reduziram à ilegalidade, ilicitude, inadequação, intempestividade e/ou desconfiabilidade os atos processuais-judiciais que ultrapassaram os limites estreitos dos costumeiros, usuais, tradicionais e/ou escritos, físicos, assinados muitas vezes com firmas reconhecidas e autenticidade chancelada em Cartório.

Esses julgadas têm rejeitado os meios eletrônicos e ditos on line de comunicação ou peticionamento, embora usados e regrados por alguns órgãos jurisdicionais (Tribunais de segundo grau de jurisdição) atentos à realidade e ao reclamo da ciência, tecnologicamente interagindo com os destinatários da prestação jurisdicional.

Refiro-me à corrente que tem perfilhado o caminho traçado pela seguinte decisão do colendo Tribunal Superior do Trabalho:

  1. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO POR E- MAIL. INVIABILIDADE DE EQUIPARAR-SE A FACSÍMILE. A jurisprudência do TST e do STJ segue no sentido de não se admitir a interposição de recurso por e- mail. Tal posicionamento decorre da tese de que a mensagem de correio eletrônico não equivale ao similar do fac-símile aludido na Lei nº 9.800/99, em face da ausência de segurança na transmissão fiel de dados. Frise-se que a Presidência do 12º Regional autorizou em sua home page oficial a interposição de recurso via e-mail. Sucede, todavia, que tal permissão não encontra amparo legal, pois, como visto, a Lei nº 9.800/99 não permite a conclusão de que os meios de transmissão ora mencionados são similares. O administrador público deve nortear seus atos com base no princípio da legalidade (CF, art. 37, II)... (TST-RR 660210/00.4, in DJU de 14/11/2003)

    Nessa linha seguem outras decisões e também algumas do Superior Tribunal de Justiça, como, v.g., a que ocorreu no julgamento de um agravo regimental em recurso especial que não admitiu o recurso por e-mail, com os seguintes fundamentos: "O agravo regimental é intempestivo já que protocolada a peça assinada fora do prazo legal, não surtindo qualquer efeito petição sem assinatura e sem comprovação adequada de que recebida nesta Corte por e-mail, mediante assinatura eletrônica, ausente, ainda, regulamentação interna a respeito desta forma de protocolar recursos, não sendo suficiente a Lei nº

    9.800/99, que disciplina a utilização do fac-símile, não similar ao correio eletrônico. Precedentes da Terceira Turma.

  2. Agravo regimental não conhecido". (STJ-AG-AI-500044/ RS, 3a. Turma, in DJU de 15/09/03) .

    É bem verdade que a Suprema Corte há mais de dez anos decidiu e manteve a posição de que, ante o princípio da reserva legal, não lhe competia regulamentar a utilização do fac-simile para a transmissão de recursos extraordinários e outras medidas judiciais, afirmando que:

    "Agravo de Instrumento - Petição Recursal Transmitida Mediante Fax - Ratificação Deduzida Após o Exaurimento do Prazo Recursal - Intempestividade Reconhecida - Reprodução Fac-similar - Matéria Processual - Principio da Reserva de Lei - Agravo Regimental Não Provido. - A disciplina normativa da utilização do fax, quando destinado a veicular a prática de atos processuais, constitui matéria sujeita ao...

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