Ideologia, Norma e a Correlação ao Poder e ao Estado

AutorChristie Danielle Sikorski
CargoProfessora da Faculdade União (Ponta Grossa-PR)
Páginas42-47

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O reconhecimento de que a formação das estruturas do poder e dos sistemas de decisões não se resumem, apenas, a uma inferência lógica representa ponto comum entre os doutrinadores.

A respeito do assunto, Wolkmer (2000) diz que o homem, enquanto realidade histórico-social, tende a criar e a desenvolver, no contexto do mundo natural e do valorativo, formas de vida e de organização societária baseadas em padrões culturais múltiplos e específicos.

A partir da compreensão histórica e interpretativa da ideologia será possível traçar o liame daquela com a norma jurídica.

Entretanto, para chegar ao foco principal deste estudo, traz-se à baila, no primeiro momento, breves comentários sobre o surgimento da ideologia e apontam-se alguns conceitos.

Por conseguinte, apresenta-se uma análise sobre o surgimento da norma jurídica, bem como sobre as possíveis implicações e correlações com o poder e com o Estado.

Justifica-se o presente trabalho pois sobreditas questões eviden-ciam-se importantes na medida em que formam, não raras vezes, a base dos estudiosos e operadores do direito.

Neste trabalho a metodologia amparou-se em pesquisa de dados coletados através de diversos doutrinadores.

1. Ideologia: origem e conceitos

A formação das estruturas do poder e dos sistemas de decisões está ligada, historicamente, à ideologia. Não obstante, é essencial estudá-la para compreender o surgimento das normas jurídicas e determinar a correlação com o poder e com o Estado.

O termo ideologia apresenta-se sob diversos significados e parece-nos impossível sintetizá-los em um único conceito. Neste contexto, insta pontuar que muito mais valioso é apresentar algumas definições no intuito de traçar o liame com o objeto deste estudo.

O marco inicial das grandes ideologias foi a Revolução Francesa e as ideias dela decorrentes dominam a modernidade, de forma que é inegável que o fenômeno ideológico encontra-se amplamente presente em crenças, fundamentações, política, poder, norma e direito (Wolkmer, 2000).

Traz, a história, que a paternidade do termo ideologia atribui-se ao filósofo francês Antoine Louis Claude Destutt, o conde de Tracy. Diz Crespigny apud Souza (1993, p.133):

"De Tracy e seu círculo de intelectuais, ligados ao Instituí de France, eram liberais, filósofos que seguiam a corrente principal de uma tradição intelectual que vai desde Descartes até a figura contemporânea, um tanto solitária, de Sartre. Uma das características dessa tradição tem sido a busca de um método, a procura de uma pedra filosofal que tranforme o que é mundano não em ouro, mas em conhecimento. Ideologie foi o nome dado por de

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Tracy ao método específico que propunha como universalmente aplicável. A ideologie ou ciência das ideias proporcionaria o verdadeiro fundamento para todas as demais ciências."

Etmologicamente, Wolkmer (2000) profere que o termo ideologia é extraído da palavra grega eidos + logos, que significa o estudo da ideia, e a análise desta, enquanto ciência das ideias, influencia a construção dos nossos pensamentos. Diz, ainda, que o estudo da ideologia pode ser dividido em dois grupos: positivo (quando compreende sistemas de atitudes integradas de um grupo social, como ordenação de crenças) e negativo (quando representa a falsa consciência das relações de domínio entre as classes).

Manifestando-se sobre a obra de Tracy Elementos de Ideologia de 1801, Chauí(2001) diz que o autor considera as ideias como resultado da interação entre o corpo e o meio ambiente. Compartilhando deste posicionamento, Augusto Comte entende que a ideologia pode ser considerada um conjunto de ideias da época (Chauí, 2001).

Partindo dos conceitos sobreditos tem-se que a ideologia seria, portanto, a manifestação do saber expresso pelas ideias, bem como pelo resultado da interação entre o homem e o ambiente. Via de consequência, esta ciência daria sentido para todas as demais.

Entretanto, a ideologia até então vista positiva, a partir de 1812, passa a ser considerada como um malefício quando Napoleão atribui àquela e aos seus seguidores todos os males que atingiam a França. Ao considerar Destutt e seus seguidores como especuladores, Napoleão entra em conflito com os ideólogos, apropria-se do termo, a ideologia muda de feição e passa a ter uma conotação pejorativa, depreciativa (Lõwy, 1985).

Na mesma linha de pensamento, Marilena Chauí (2001) diz que Napoleão inaugura um sentido de negatividade para o termo, na medida em que passaram a ocorrer inversões dos valores até então assimilados.

Neste diapasão, não há como tratar sobre o assunto em tela sem destacar o entendimento de Bob-bio, que aponta dois tipos de significados: um forte e outro fraco. Konder (2002), apoiando-se em Bobbio, diz que o significado "fraco" é aquele que designa sistemas de crenças políticas, conjunto de ideias e de valores cuja função é orientar comportamentos coletivos relativos à ordem pública. Já, para o forte, faz-se referência a Marx e à distorção no conhecimento. Na primeira acepção, o conceito é neutro; na segunda, é crítico, negativo.

No que diz respeito à opinião de Gramsci (1978), a ideologia - sem qualquer sombra de dúvida - é instrumento de dominação, e portanto, deve ser denunciada e combatida.

Por sua vez, Karl Marx (2004), na obra "Ideologia Alemã", posiciona-se no sentido de que não há como estudar a ideologia e as ideias sem atrelá-las às condições sociais e históricas em que surgiram. Para este autor, não existe a neutralidade, mas ao contrário, todas as manifestações ideológicas são provenientes de situações da época, quer sejam no campo político, filosófico, económico e/ou jurídico; pois a ideologia está intimamente ligada à relação de poder, de força, de dominação entre as classes sociais.

Ora, para Marx a ideologia é um modo de mascarar a verdade, a dialética que existe na sociedade, de forma a não perceber que os atos levam ao fim, a consequência. A ideologia poderia ser tida como a falsa realidade. A respeito, profere Chauí (2001, p. 60):

A consciência, prossegue o texto de A Ideologia Alemã, estará indissoluvelmente ligada às condições materiais de produção da existência, das formas de intercâmbio e de cooperação, e as ideias nascem da atividade material. Isto não significa, porém que os homens...

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