A nova dimensão da igualdade dentre os Direitos Fundamentais e sua relação com a Dignidade da Pessoa Humana

AutorAna Cristina Moreira
CargoMestranda em Direito do Centro Universitário FIEO | UNIFIEO
Páginas12-30

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Recebido em 10|06|2008 | Aprovado em 14|10|2008

Orientadora | Adriana Zawada Melo

Introdução

A presente pesquisa nasceu da relevância, em nossos dias atuais, da abordagem dos direitos inerentes à igualdade e dignidade da pessoa humana, diante do indiscutível fato da infl uência substancial da espécie humana no curso do processo de evolução do direito, que por si só não se governa. Observa-se nesta pesquisa que o direito só se faz racional se forem racionais os governantes e o homem. Este, por sua vez, a partir do momento em que começa a pensar logicamente, a questionar e a entender tudo à sua volta, provoca uma desigualdade natural, que não o menospreza ou inferioriza, já que benefi cia a evolução humano-social, levando-o, porém, a uma constante reflexão sobre si mesmo e sua responsabilidade no curso da história.

Conhecer mais sobre os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, seus signifi cados, funções e critérios, é também acreditar, que este conhecimento pode ajudar muito na construção dos saberes futuros e apropriação de condutas que reflitam o respeito a si próprio e ao próximo, visando ao bem comum.

O trabalho é apresentado por meio de pesquisa contendo uma visão histórica de doutrinadores, e ainda recorre à citação de documento normativo que regula os princípios em tela.

Para tanto, o trabalho foi dividido em cinco partes: na primeira é delineada sucintamente a origem do princípio da igualdade. A segunda parte do estudo é dedicada a apresentar o reconhecimento solene da igualdade no texto da Constituição brasileira. A terceira parte tem como intuito apresentar a igualdade frente aos Direitos Humanos. Na quarta parte são esclarecidas as funções, dimensão e critérios de concretização do princípio da igualdade além de alguns aspectos da igualdade na pós-modernidade. A quinta parte apresenta a positivação do princípio da dignidade da pessoa humana na Constituição brasileira, e ainda retrata a dignidade enquanto valor guia do ordenamento jurídico e a necessidade da observância e do respeito aos Princípios da Igualdade e Dignidade da Pessoa Humana.

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1 A origem do princípio da igualdade

No ordenamento jurídico, os princípios são preceitos gerais que decorrem dos próprios textos legais, constituindo pressupostos lógicos e necessários para a efetivação da racionalidade jurídica, na tentativa de se fazer uma justiça imparcial (que julga sem paixão, sem emoção).

Segundo Robert Alexy1:

[...] princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ter satisfeitos graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes.

Os princípios são, portanto, mandados de otimização que possuem caráter "prima facie" e sua aplicação se dá mediante sopesamento2.

Karl Larenz3 define princípio como sendo:

Normas de grande relevância para o ordenamento jurídico, na medida em que estabelecem fundamentos normativos para a interpretação e aplicação do Direito, deles decorrendo, direta ou indiretamente, normas de comportamento.

Não se tem por certa a data de origem do princípio da igualdade, outrossim, sabemos que possivelmente foi estabelecido em Atenas, na Grécia antiga, por volta de 508 a.C por Clístenes, o pai da democracia Ateniense, e reavivado no século das "Luzes" (Revolução Francesa), junto com a declaração de igualdade, liberdade e fraternidade entre os homens; o princípio da igualdade adquiriu maior força com a divulgação da obra "Dos Delitos e Das Penas", cuja autoria pertence ao Marquês de Beccaria, defensor de um direito racional que vê o homem com dignidade, que necessita ser respeitado para que exista uma sociedade em busca do "justo".

A partir do momento em que o homem se preocupa com a sua forma de pensar e de se expressar, questionando o mundo, entra em contacto com a nova era, o século das "Luzes", quando todos procuram ser "iguais" e avançar na construção das ciências. A racionalidade era entendida negativamente como o uso da força coercitiva do direito, numa forma de encontrar a melhor solução para a problematização surgida, uma vez que o direito, praticamente o Penal, era mero selecionador de fracos e fortes, inocentando-os ou culpando-os de acordo com a resistência física e mental (torturas). Não se tratava, como deveria se esperar, de buscar, racionalmente, a melhor solução plausível como penalizar de acordo com o grau de culpa e de ferimento ao bem jurídico penalmente tutelado, ou seja, apenas quando afetar o bem-estar social relevante. Frente a isso, entende-se que a justiça nem sempre foi justa e o direito nem sempre racional; justo era ser forte e o forte, justo.

Diz-se que o direito nasce com o surgimento da sociedade, e disso não podemos duvidar, pois onde existir "ser social" estará presente o direito, ou bem, a arte de mudar, interpretar e entender as paixões e de se relacionar em busca do novo, do moderno, do presente. No entanto, o direito não se autogoverna, mas é gover-

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nado pelos homens. Com esse pensamento, entendemos que o direito só se faz racional, se racional forem os governantes, e a racionalização só se demonstra presente, através do convencimento de legitimidade dos princípios norteadores para o bem-estar da sociedade, na defesa dos direitos fundamentais trazidos pela racionalidade social. Um exemplo disso é o surgimento do Princípio da Igualdade.

Para melhor interpretarmos o Direito à Igualdade faz-se necessário trazer à colação os ensinamentos de San Tiago Dantas4:

Quanto mais progridem e se organizam as coletividades, maior é o grau de diferenciação a que atinge seu sistema legislativo. A lei raramente colhe no mesmo comando todos os indivíduos, quase sempre atende a diferenças de sexo, de profi ssão, de atividade, de situação econômica, de posição jurídica, de direito anterior, raramente regula do mesmo modo a situação de todos os bens, quase sempre se distingue conforme a natureza, a utilidade, a raridade, a intensidade de valia que oferecem a todos; raramente qualidade de um modo único as múltiplas ocorrências de um mesmo fato, quase sempre os distingue conforme as circunstâncias em que se produzem, ou conforme a repercussão que têm no interesse geral. Todas essas situações, inspiradas no agrupamento natural e racional dos indivíduos e dos fatos, são essenciais ao processo legislativo, e não ferem o princípio da igualdade. Servem, porém, para indicar a necessidade de uma construção teórica, que permita distinguir as leis arbitrárias das leis conforme o direito, e eleve até esta alta triagem a tarefa do órgão do poder judiciário.

A igualdade, portanto, é um elemento fundamental para a construção de uma sociedade justa e solidária.

Passemos em seguida a abordar o Princípio da Igualdade que foi abarcado no texto da Constituição Federal Brasileira de 1988.

2 A igualdade como princípio fundamental na Constituição Federal brasileira de 1988

De acordo com o Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, o termo igualdade (do latim aequalitate), é: 1. Qualidade ou estado de igual, paridade; 2. Uniformidade, identidade; 3. Eqüidade, justiça5.

A Constituição Federal de 19886alberga vários valores fundamentais, dentre os quais está o Princípio da Igualdade. Logo no preâmbulo da Carta Magna, já podemos observar o referido princípio:

Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil.

Estabelece ainda o art. 5º, da Constituição Federal de 19887, que:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindose aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade [...].

No artigo 3º, incisos I, III e IV, do citado diploma legal, observamos como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: "construir uma sociedade justa e solidária"; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais"; e, por fim, "promover o bem de todos, sem preconceito de origem raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação".

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No texto constitucional brasileiro encontramos outros artigos, ditos normas programáticas, que têm por objetivo a equidade de tratamento nas relações sociais e superação das desigualdades existentes, como é o caso dos artigos 7º, 170, 205 e 206.

Assim, podemos perceber a base da preocupação legislativa constituinte, que está focada em evitar toda e qualquer espécie de discriminação, seja qual for a sua natureza.

Todavia, uma leitura menos crítica pode nos levar a crer, ao interpretar literalmente esta norma, que devemos tratar igualmente a todos. Contudo, Aristóteles8 já afi rmava:

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