Imigração e reconhecimento de direitos: o desafio do Brasil na era da (in)tolerância

AutorAna Carolina Lopes Olsen
CargoProfessora Titular de Direito Constitucional e Direitos Humanos do Curso de Direito da Sociedade Educacional de Santa Catarina, UNISOCIESC (Joinville-SC, Brasil). Mestre em Direito pela Universidade Federal do Paraná. E-mail: anac.olsen@gmail.com.
Páginas122-155
Rev. Direito Econ. Socioambiental, Curitiba, v. 6, n. 2, p. 122-155, jul./dez. 2015
ISSN 2179-8214
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
Revista de
Direito Econômico e
Socioambiental
doi: 10.7213/rev.dir.econ.socioambienta.06.002.AO05
Imigração e reconhecimento de direitos: o desafio do
Brasil na era da (in)tolerância
Imigration and recognition of rights: the Brazilian challenge in
the (in)tolerance era
Ana Carolina Lopes Olsen
1
Sociedade educacional de Santa Catarina SOCIESC
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a prueba la capacidad que los seres humanos
tenemos de ser solidários y si de manera coerente
estamos dispuestos a tratar a nuestros semejantes

(David Sánchez Rubio)
Recebido: 07/06/2015 Aprovado: 11/11/2015
Received: 07/06/2015 Approved: 11/11/2015
Resumo
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sujeitos de direitos como cidadãos, em contraposição ao estrangeiro. Dentre as várias evi-
dências desta dicotomia, a cultura é elemento diferenciador, mas, ao mesmo tempo, pode
Como citar este artigo/How to cite this article: OLSEN, Ana Carolina Lopes. Imigração e reconheci-
mento de direitos: o desafio do Brasil na era da (in)tolerância. Revista de Direito Econômico e Soci-
oambiental, Curitiba, v. 6, n. 2, p. 122-155, jul./dez. 2015. doi:
http://dx.doi.org/10.7213/rev.dir.econ.socioambienta.06.002.AO05
1 Professora Titular de Direito Constitucional e Direitos Humanos do Curso de Direito da Sociedade
Educacional de Santa Catarina UNISOCIESC (Joinville-SC, Brasil). Mestre em Direito pela Universida-
de Federal do Paraná. E-mail: anac.olsen@gmail.com.
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reunir povos diferentes em função da globalização, o que tem se dado através da assimila-
ção cultural dos i migrantes, e não de uma integração que respeite suas diferenças. Em
quaisquer dos casos, não há equiparação de direitos entre estrangeiros e nacionais. Recen-
temente, com a intensificação dos processos migratórios, desenvolveu-se um sistema inter-
nacional de proteção dos direitos humanos, segundo o qual qualquer pessoa é sujeito de
direitos, independente de nacionalidade. Esse discurso, todavia, não tem atingido a realida-
de dos imigrantes que morrem em busca d e países que lhes garantam a sobrevivência o
que leva a questionar a posição adotada pelo Brasil a fim de promover o reconhecimento de
direitos aos imigrantes. Apesar da adesão a tratados internacionais de direitos humanos,
verifica-se que o Brasil ai nda não tem legislação doméstica plenamente adequada à tutela
dessas pessoas. O estudo demonstra que as mudanças normativas são importantes, mas
estarão fadadas ao fracasso se não forem acompanhadas por uma cultura de tolerância e
solidariedade, com respeito às diferenças entre os povos.
Palavras-chave: direitos humanos; cultura; imigração; integração.
Abstract
            
subjects as citizens, in opposition to foreigners. Among the several evidences of this dichot-
omy, culture is a distinguishing element, but, at the same time, a possible factor for br inging
together different peoples because of globalization, which has fostered cultural assimilation
of immigrants, and not an integration that respects their differences. In each case, there´s no
rights equalization between citizens and foreigners. Recently, with the in creasing of the
migratory processes, an international human rights system has been developed, qualifying
any person as a subject with rigths, no matter his nationality. Human Rights speech, howev-
er, has not reached reality of immigrants that die in search for countries able to ensure their
survival what brings the question about what is the position a ssumed by Brazil to promote
the recognition of rights of immigrants . Brazil, in spite of having adhered to human rights
international treaties, has not domestic legislation fully adequate to the protection of these
people. This study demonstrates that changes in law are important, but will inevitably fail if
not followed by tolerance and solidarity.
Keywords: human rights; culture; immigration; integration.
1. Introdução
Por centenas de anos, o elemento nacionalidade, e a consequente
noção de pertencimento a um determinado povo, ajudou a definir o que se
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OLSEN, A. C. L.
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concebia por Estado na acepção clássica do Estado Moderno. A nacionali-
dade ainda serve para identificar um povo, congregando suas característi-
cas culturais, sociais e econômicas, manifestadas em um dado território.
Em contrapartida, também tem por finalidade identificar o outro, o não
nacional, aquele que não é estrangeiro.
Nacionais convivem com os estrangeiros a partir do fenômeno da
imigração, como um processo através do qual uma nação passa a incorpo-
rar o diferente, e quem sabe, tentar assimilá-lo, transformando-o em naci-
onal. Neste sentido, em países como o Brasil, nos quais a vinda de imigran-
tes fez e faz parte da formação do povo, é possível verificar que o imi-
grante passa por um longo e penoso processo até ser reconhecido em seus
direitos, como se nacional fosse. Aliás, o reconhecimento da plenitude de
direitos passa, inexoravelmente, pela incorporação do estrangeiro e sua
transformação em nacional.
Trata-se de um processo no qual se parte da negação de existência
do est rangeiro, até que sua presença se imponha aos olhos da sociedade
em serviços desprezados pelos nacionais, ainda que necessários, ou nas
páginas policiais, em virtude de delitos praticados a fim de garantir a sub-
sistência negada pelo Estado que não os reconhece. Ao ganhar visibilidade,
o estrangeiro passa a ser um problema, uma chaga social com a qual os
nacionais precisam conviver. Progressivamente a aceitação social se desen-
volve, desde que fique absolutamente claro que não poderia esse imigrante
gozar dos mesmos direitos que os nacionais.
Fato é que em um momento histórico em que as fronteiras são flui-
das, a miscigenação impera, e as distâncias são encurtadas pela tecnologia,
   ntes
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Nessa linha, o presente artigo busca investigar o tratamento dado
aos imigrantes pelo sistema jurídico brasileiro. Inicialmente, parte-se de
uma compreensão da figura do imigrante, para então situá-lo no sistema
internacional de proteção dos direitos humanos como um sujeito de direi-
tos. Nessa ótica, e levando em consideração a vinculação do Estado brasi-
leiro a esse sistema jurídico internacional, verificar como o direito brasileiro
tem se posicionado sobre o tema, o que desafia uma reflexão crítica das
normas pátrias em virtude da necessária contextualização com os direitos
humanos.

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