A inclusão veio para ficar: o direito antidiscriminatório pós-ADI 5357 e a educação inclusiva como direito da pessoa com deficiência

AutorBruno Galindo
Páginas43-58
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 43-58
43
A INCLUSÃO VEIO PARA FICAR: O DIREITO ANTIDISCRIMINATÓRIO PÓS-
ADI 5357 E A EDUCAÇÃO INCLUSIVA COMO DIREITO DA PESSOA COM
DEFICIÊNCIA
Bruno Galindo*
RESUMO: O presente trabalho versa sobre o direito antidiscriminatório, expondo sua
definição conceitual e sua importância no contexto da defesa dos direitos da pessoa com
deficiência. Com essa perspectiva, aborda a tormentosa questão do direito à educação da
pessoa com deficiência, com especial destaque para o recente julgamento do Supremo
Tribunal Federal da ADI 5357, ocasião em que a Corte declarou a constitucionalidade dos
dispositivos da Lei Brasileira de Inclusão (Estatuto da Pessoa com Deficiência) que estendem
às escolas privadas as obrigações referentes à promoção da educação inclusiva.
Palavras-chave: Pessoa com Deficiência. Educação Inclusiva. Direito Antidiscriminatório.
Direito à Educação.
INTRODUÇÃO
O presente ensaio tem por objetivo analisar o conjunto de proposições jurídicas
que em outra oportunidade denominei de direito antidiscriminatório (GALINDO, 2015, p.
51.), dentro da perspectiva da afirmação dos direitos de um segmento específico de pessoas
vulneráveis, o das pessoas com deficiência, mais especificamente sobre a recente decisão
proferida pelo Supremo Tribunal Federal no dia 9 de junho de 2016 na Ação Direta de
Inconstitucionalidade n° 5357, Ação esta proposta pela CONFENEN (Confederação Nacional
dos Estabelecimentos de Ensino) que objetivava deixar as escolas privadas brasileiras livres
de obrigações como a garantia de matrícula de alunos com deficiência e a ausência de
cobrança de valores pecuniários superiores aos dispendidos pelos responsáveis por alunos sem
deficiência.
1 DIREITO ANTIDISCRIMINATÓRIO: UMA PERCEPÇÃO INICIAL
Um dos permanentes desafios da efetividade dos direitos humanos, não somente
aqui no Brasil, mas em muitos países do mundo, é o seu aspecto cultural. Tanto menos
ocorrem pretensões dessa natureza quanto mais possa ser sólida uma cultura jurídica e
* Professor Associado da Faculdade de Direito do Recife/Universidade Federal de Pernambuco; Doutor em
Direito pela UFPE/Universidade de Coimbra-Portugal (PDEE); Conselheiro Estadual e Presidente da Comissão
de Direitos Humanos da OAB/PE. E-mail: brunogalindo@uol.com.br.
R: 13.05.2016; A: 23.06.2016
A inclusão veio para ficar: o direito antidiscriminatório pós-ADI 5357 e a educação inclusiva como direito da
pessoa com deficiência
____________________________________________
Direito e Desenvolvimento, João Pessoa, v. 7, n. 13, p. 43-58
44
constitucional humanista e democrática, na qual a força normativa da constituição seja
correspondente à generalização congruente das expectativas normativas (fazendo aí uma
junção de Konrad Hesse e Marcelo Neves e, por que não dizer, também de Karl
Loewenstein), situação em que diminui a possibilidade de pretensões flagrante e
pejorativamente discriminatórias (HESSE, 1991; LOEWENSTEIN, 1964; NEVES, 2007).
Em tal perspectiva, o princípio da igualdade não pode ser pensado apenas a partir
dos paradigmas da igualdade formal. Nem mesmo a igualdade material é suficiente, sendo
imprescindível compreendê-lo a partir da diferença e das perspectivas teóricas em torno da
não discriminação pejorativa e das possibilidades de discriminação reversa ou positiva.
Pode-se afirmar que se encontra em construção teórica (e por que não dizer,
cultural), com avanços e percalços a depender do país e comunidade dos quais tratemos, uma
espécie de direito antidiscriminatório, que consiste em tentativas pelas vias legislativa,
administrativa e jurisprudencial, bem como com as reflexões doutrinárias, de minimizar
vulnerabilidades de grupos sociais que sofrem discriminações em razão de suas condições
específicas. Como afirmei em outra oportunidade, o direito antidiscriminatório pode ser
conceituado como:
[...] um conjunto de medidas jurídicas em âmbito constitucional e infraco nstitucional
que almeja reduzir a situação de vulnerabilidade de cidadãos e grupos sociais
específicos através da proibição de condutas discriminatórias pejorativas, a exemplo
da criação e manutenção de privilégios injustificáveis à luz das contemporâneas
teorias da justiça, e, por outro lado, da implementação, quando necessário, de
políticas públicas de discriminação reversa ou positiva, sempre no sentido de
promover tais grupos e cidadãos a uma situação d e potencial igualdade
substancial/material, políticas estas normalmente transitórias até que se atinja uma
redução significativa ou mesmo extinção da vulnerabilidade em questão
(GALINDO, 2015, p. 51).
Os avanços desse direito antidiscriminatório têm exigido dos intérpretes
constitucionais uma permanente disposição de se repensar o princípio da igualdade,
fortalecendo seus aspectos materiais justificadores de, por um lado, a coibição de ações de
discriminação negativa ou pejorativa, e, por outro, da promoção de ações de discriminação
positiva, quando estas se fazem necessárias. Como desdobramentos do primeiro tipo, há, p.
ex., as diversas formas de combate ao racismo e à homofobia no plano de se impedir acesso
aos mesmos bens jurídicos por parte de pessoas socialmente discriminadas por essas razões, a
exemplo de importantes decisões como o paradigmático Acórdão do STF na ADI 4277,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT