Intervenção política e campanhas de eugenia no governo de Vargas: controle social, discurso médico-psiquiátrico e ampliação das fronteiras de ação política na Era Vargas (1930-1945)

AutorRodrigo Maia Monteiro
Páginas157-172
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CAPÍTULO IX
INTERVENÇÃO POLÍTICA E
CAMPANHAS DE EUGENIA NO
GOVERNO DE VARGAS
RODRIGO MAIA MONTEIRO
controle social, discurso médico-
psiquiátrico e ampliação das
fronteiras de ação política na Era
Vargas (1930-1945)
Introdução
Rubens Soares foi um compositor de samba, poeta e lutador de
boxe, conhecido na década de 1930, entre os jornais cariocas, como o
“pugilista boêmio”. Foi Campeão Nacional e Sulamericano de boxe, e
ao mesmo tempo escrevia sambas com Noel Rosa, Aracy de Almeida,
Francisco Alves e Ewandro Rui, cando famoso com as músicas “É bom
parar” de 1936, e “Polero de Pato é no chão” de 1941. Em Junho de 1940
Rubens Soares, tendo ganhado a Parada de Músicas Carnavalescas de
1936, aparece no jornal O Globo Sportivo tocando pandeiro e dando
uma entrevista onde anunciava que abandonaria o ringue para se dedicar
totalmente ao samba. Contudo, em 1941 não resistiu a um convite nal
de um antigo desafeto do boxe, Brasilino, o mesmo que Rubens havia
vencido em 1934, mas que agora, no famoso Estádio Brasil, queria a
revanche (RUBENS, 1938, p. 17).
A notícia mobilizou os principais jornais do Rio de Janeiro,
mas “moreno” (RUBENS, 1938, p. 17), como também era chamado, era
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Estado, democracia e sociedade
perseguido pela imprensa principalmente quando estava no bar, dando
a impressão de que ele não tinha disciplina com o boxe. Quanto mais
participava das atividades onde se tocava o samba, mais era cobrado
pela atenção ao boxe. Talvez os “mortos”1 tenham tentado lhe avisar,
mas fato é que Rubens Soares levou um fulminante jeb de esquerda no
quinto round, “beijou a lona da derrota e ouviu, ou melhor não ouviu, a
contagem fatal porquê depois de pronunciado o “dez” ainda permaneceu
deitado” (A QUEDA, 1941, p. 6). Em 1943, depois de quase dois anos
de silêncio, Rubens Soares se torna novamente capa do jornal O Globo
Sportivo, em um artigo intitulado “Casou e Mudou” (CASOU, 1943, p.
12), para dizer que não bebia mais como antes, nem tampouco se iludia
mais com a roleta, e que havia largado os exageros. Ao se justicar que
não bebe mais, no jornal, nosso personagem revela que ele concorda com
a crítica que fazem a ele, mais do que isso, defende-a como a dele próprio.
A vida dupla desse personagem foi representada na imprensa
carioca de forma negativa e incompatível com a “moral” e os “bons
costumes” da época, e a principal explicação era a não conformidade
da prática de esportes com bebidas e festas. É verdade que o próprio
Rubens se auto-declarava um malandro, mais sambista que boxeador,
mas também é verdade que havia na década de 1930 a associação do
samba e do carnaval à desordem, à diversão sexualizada, africanizada,
macumbizada, pecaminosa e difamada, mas que na verdade representava
uma clara desvalorização da cultura negra. Conforme aponta Eric Brasil,
no Rio de Janeiro, o samba e o carnaval foram construídos como “espaço
de partiricação negra por excelência, como se conrmasse uma vocação
para festa” (BRASIL, 2018, p. 297).
Em 1938, o jornal O Globo Sportivo faz uma análise do
comportamento indisciplinado do “pugilista boêmio” à luz da eugenia, e
1 Em setembro de 1940, o Jornal O Globo Sportivo publica um artigo onde diz que de
acordo com Rubens Soares, um homem de nome Ernie Schaaf havia lhe ligado dizendo
que já estava morto e falava do Além, havia lhe ligado para dizer que ele, Rubens,
perderia a luta. No dia seguinte Rubens recebe uma carta dizendo novamente que ele
iria perder a luta, o remetente se chamava Ernie Schaaf (CAMPANHA, 1940, p. 10).

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