A constituição sob juízo: considerações sobre o aproveitamento de créditos de icms a partir de dois julgamentos do STF
Autor | Marcelo de Azevedo Granato |
Cargo | Doutorando em Direito pela USP e pela Università degli Studi di Torino. Mestre pela USP |
Páginas | 188-192 |
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O texto trata de duas recentes interpretações (julgamentos) do STF no tema do estorno de créditos de ICMS. A primeira refere-se a operações com produtos da cesta básica (RE 174.478-2-SP, rel. p/ Acórdão Ministro Cezar Peluso1); a segunda, com papel destinado à impressão de livros (AC 2.559-MC-REF-RJ, rel. Ministro Celso de Mello2).
O objetivo da primeira parte do texto é expor a discrepância entre essas duas interpretações. Partindo daí, mostraremos a aplicabilidade do entendimento expresso no RE à AC e vice-versa. Isso ensejará nossas considerações finais em torno do voto do Ministro Celso de Mello (AC), para identificar um parâmetro de interpretação que pode(ria) ter informado seu julgamento do caso.
Nas operações tratadas no aludido RE, o contribuinte do ICMS adquire mercadorias integralmente tributadas por esse imposto e as revende com redução de base de cálculo, por serem produtos da cesta básica. Examinou-se, então, a possibilidade de manutenção integral dos créditos do imposto frente ao art. 155, § 2º, II, "b", da CF/1988, segundo o qual a isenção ou não incidência, salvo determinação contrária da legislação, acarreta a anulação do crédito relativo às operações anteriores.
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O STF entendeu que essa redução da base de cálculo constituiria uma "isenção parcial" (Ministro Peluso), no que estaria abrangida no referido dispositivo constitucional, impondo-se o estorno dos créditos de ICMS na proporção da redução da base de cálculo do imposto ocorrida na saída dos produtos da cesta básica. Destacamos o seguinte trecho do voto do Ministro Peluso: "Na verdade, cuida-se aqui de um favor fiscal que, mutilando o aspecto quantitativo da base de cálculo, corresponde à figura da isenção parcial, porque impede a incidência da regra-matriz de incidência tributária na sua totalidade. Quer dizer, substancialmente é caso de isenção".
Essa decisão foi embargada pela parte Recorrente. Então, o Ministro Peluso detalhou seu entendimento:
"Avaliemos a lição de Paulo de Barros Carvalho (...) segundo a qual somente redução completa (‘anulação’) da base de cálculo, ou de qualquer outro elemento, seria equivalente à isenção, por fazer desaparecer o objeto da relação.
"Ora, se a redução total é isenção, por que o não seria a parcial? A questão é apenas de grau, e não, de diferença de mecanismo que, somente à vista da completa eliminação do critério da base de cálculo, tivesse o condão de transformar-lhe a redução em isenção. O raciocínio, formal e dualista, não resiste a exemplo extremo: redução de 99,9% na base de cálculo seria incapaz de acarretar anulação dos créditos, simplesmente porque a obrigação ‘teria nascido’, ainda que em expressão mínima, sofrendo mera redução quantitativa. Mas operação isenta ou sem incidência produziria a consequência anulatória, apenas por impedir de todo o nascimento da obrigação. A diferença de tratamento não se justifica. Substancialmente, está-se diante de mecanismos idênticos."
Como se vê, segundo o Ministro Peluso, a "substancial" identidade entre a isenção e a redução da base de cálculo implica a qualificação dessa última como uma espécie de isenção.
Aparentemente, é substancial a identi-dade entre as duas figuras por conta de que, em ambas, há uma desoneração tributária (na saída) dos bens. Foi esse o elemento de fato preponderante na interpretação do art. 155, § 21, II, "b", da CF/1988 feita pelo Ministro Peluso.
No processo acima, em que o Ministro Celso de Mello deferiu medida cautelar posteriormente referendada pelo Tribunal à unanimidade...
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