Legal design no poder judiciário

AutorMarco Bruno Miranda Clementino
Páginas379-400
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LEGAL DESIGN
NO PODER JUDICIÁRIO
Marco Bruno Miranda Clementino
Juiz Federal no Rio Grande do Norte, Professor da UFRN, Doutor em Direito, com
formação em Inovação e Liderança pela Harvard Kennedy School, membro do
Centro Nacional de Inteligência da Justiça Federal, membro do Comitê de Nacional
de Conciliação do CNJ, Coordenador de Inovação da JFRN, formador da ENFAM e
Coordenador do IBET-Natal.
Sumário: 1. Introdução. 2. A inovação judicial. 2.1. A justiça como serviço. 3. A estética dos
serviços judiciais e a experiência do jurisdicionado. 4. Os princípios da inovação judicial. 5. A
institucionalidade da inovação judicial: Como tudo está acontecendo. 6. Um judicial design?
7. Remodelando a estética dos serviços judiciais. 8. Conclusões. 9. Referências.
1. INTRODUÇÃO
Ainda em 1961, Mário Moacyr Porto legava ao Brasil um belíssimo ensaio por
meio do qual ref‌letiu sobre os fundamentos estéticos do direito, partindo da relação
entre o belo e o justo como “binômio eterno e metas f‌inais de todas as aspirações
humanas”. Num texto curto, porém muito denso, o autor demonstrava existir uma
nítida implicação entre os processos de criação artística e de construção normativa
por meio da interpretação, ali cunhando uma frase que se tornou emblemática: “A
lei não esgota o Direito como a partitura não exaure a música”1.
Em Platão e Aristóteles, a essência do belo era associada ao bom e ao verdadeiro,
revelando uma clara aproximação entre a ética e a estética. Embora tenha esta, a partir
da Idade Média, passado a ser estudada de forma autônoma em relação a outros ramos
da f‌ilosof‌ia, isso não exclui a circunstância de que valores como justiça e segurança,
essenciais à própria ideia de direito, podem também ser compreendidos a partir de
noções estéticas como harmonia, ordem, proporção ou estilo.
1. PORTO, Mário Moacyr. Os fundamentos estéticos do Direito. Revista dos Tribunais. v. 50, n. 308, p. 7-15,
jun. 1961.
MARCO BRUNO MIRANDA CLEMENTINO
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Se o belo e o justo podem ser associados nos conceitos jurídicos e na interpreta-
ção da norma, isso também acontece com aquilo que se pode denominar de serviços
jurídicos, ou seja, a exteriorização do direito como prática social. Isso acontece nos
serviços judiciais privados, mas também naqueles prestados pelo Estado, a exemplo
daqueles que dão suporte ao exercício da jurisdição. Tome-se como exemplo uma
sentença judicial: trata-se, como se sabe, de um conceito jurídico-processual, expres-
sando a manifestação da autoridade estatal na solução de conf‌litos de interesses; ao
mesmo tempo, porém, caracteriza-se também como serviço judicial, porque busca
agir positivamente em benefício da sociedade, produzindo efeitos concretos.
Na qualidade de serviço judicial, a sentença materializa-se por meio de um do-
cumento, cuja composição estética ora atende a exigências legais, ora a determinadas
convenções sociais. Se por um lado a lei processual exige, via de regra, a presença do
relatório, da fundamentação e do dispositivo na sua estruturação, o que não deixa
de ser também uma imposição estética, são convenções sociais, porém não menos
estéticas, que estabelecem, por exemplo, a ordem desses elementos, a eventual pre-
dominância da forma textual, o uso constante de determinadas expressões forenses,
o estilo de abordagem, entre outros aspectos.
Nesse sentido, sob a premissa de que o direito também pode ser compreendido
a partir da noção estética, o objetivo geral deste texto é descrever como o método do
Legal Design tem auxiliado no processo de inovação do Poder Judiciário brasileiro,
na concepção de serviços judiciais que propiciem uma melhor experiência ao juris-
dicionado. Como objetivos específ‌icos, pretende-se (i) analisar os fundamentos da
inovação judicial, inclusive apresentando seus princípios; (ii) apresentar a roupagem
institucional da política de inovação do Poder Judiciário; (iii) conceituar o método
do Legal Design e descrever como ele tem sido utilizado no processo de inovação
judicial; (iv) apresentar alguns exemplos resultados do emprego do Legal Design na
transformação estética dos serviços judiciais.
A problemática tratada no texto gira em torno da ref‌lexão acerca do fundamento
e da ef‌icácia do emprego do pensamento do design com a f‌inalidade de repensar os
serviços judiciais, particularmente no contexto de uma instituição tão marcada pelo
tradicionalismo quanto o Poder Judiciário. A análise, por outro lado, justif‌ica-se na
constatação de que esse mesmo emprego pode conduzir a uma verdadeira transfor-
mação estética dos serviços judiciais, de forma a que sejam prestados sob a ideia de
centralidade no jurisdicionado, propiciando-lhe uma melhor experiência deste, na
qualidade de respectivo usuário.
Do ponto de vista metodológico, o presente trabalho resulta de pesquisa descriti-
va, de abordagem qualitativa e estruturada sob o método lógico-dedutivo. Quanto aos
procedimentos, emprega preponderantemente as técnicas bibliográf‌ica e documental,
com ênfase na doutrina jurídica, dogmática e f‌ilosóf‌ica, e nos marcos institucionais da
política de inovação do Poder Judiciário. Utiliza-se também a técnica da pesquisa de
campo, objetivando compreender o estado da arte no processo de inovação judicial
e descrever alguns de seus resultados concretos.

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