Máscaras livres. Uma análise sobre a inconstitucionalidade da proibição do uso de máscaras em reuniões públicas

AutorDiego Souza Galvão de Melo, Gustavo Ferreira Santos
CargoUniversidade Católica de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil/Universidade Católica de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil
Páginas173-188
MÁSCARAS LIVRES: UMA ANÁLISE SOBRE A
INCONSTITUCIONALIDADE DA PROIBIÇÃO DO USO DE
MÁSCARAS EM REUNIÕES PÚBLICAS
FREE MASKS: AN ANALYSIS ABOUT UNCONSTITUTIONALITY OF THE
PROHIBITION OF THE USE OF MASKS IN PUBLIC MEETINGS
Diego Souza Galvão de MeloI
Gustavo Ferreira SantosII
Resumo: Diante de manifestações públicas dos mais variados
matizes, algumas descambando para atos violentos, tem-se
discutido muito acerca da legitimidade constitucional do uso
de máscaras em protestos de rua, ora se argumentando que
estes utensílios ferem o inciso IV do artigo 5º da Constituição
Federal de 1988 – que expressamente veda o anonimato –, ora
se alegando que o uso de máscaras em manifestações é parte
do próprio exercício da liberdade de expressão e, assim, em
nada fere o referido dispositivo constitucional, posto que os
manifestantes instados a se identificarem estariam presentes
no ato para assim procederem. Enfrentando estas questões,
o presente artigo analisa diversas contribuições doutrinárias
acerca da matéria e expõe como está a atual discussão acerca do
assunto no Legislativo e Judiciário brasileiro, especialmente
a partir da discussão sobre a constitucionalidade ou não da
lei ordinária nº 6.528/2013, do Estado do Rio de Janeiro,
que veda o uso de máscaras em manifestações públicas. Ao
final, os autores tomam posição pela inconstitucionalidade
da proibição do uso de máscaras em protestos de rua,
adotando o argumento de que isso em nada fere a proibição
ao anonimato, estatuída pela Carta Magna da República.
Palavras-chave: Liberdade de manifestação. Liberdade de
expressão. Liberdade de reunião. Máscaras.
Abstract: In the face of public protests of the most varied
shades, some devolving into violent acts, much has been
discussed about the constitutional legitimacy of the use of
masks in street protests, sometimes arguing that these utensils
violate item IV of article 5 of the Federal Constitution of
1988 – which expressly prohibits anonymity –, sometimes
alleging that the use of masks in demonstrations is part of
the exercise of freedom of expression and, thus, in no way
harms the aforementioned constitutional provision, since
the protesters urged to identify themselves would be present
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v17i42.821
Recebido em: 08.06.20022
Aceito em: 10.08.2022
I Universidade Católica de Pernambuco,
Recife, Pernambuco, Brasil. Mestrando
em Direito. E-mail:
II Universidade Católica de Pernambuco,
Recife, Pernambuco, Brasil. E-mail:
174 Revista Direitos Culturais | Santo Ângelo | v. 17 | n. 42 | p. 173-188 | maio/agos. 2022
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v17i42.821
in the act to do so. Facing these questions, this article
analyzes several doctrinal contributions on the matter and
exposes the current discussion on the subject in the Brazilian
Legislative and Judiciary, especially from the discussion on
the constitutionality or not of Act nº 6.528/2013, of the
State of Rio de Janeiro, which prohibits the use of masks
in public demonstrations. In the end, the authors take a
position on the unconstitutionality of the ban on the use
of masks in street protests, adopting the argument that this
in no way violates the ban on anonymity, established by the
Constitution of the Republic.
Keywords: Freedom of manifestation. Freedom of speech.
Freedom of assembly. Masks.
1 Introdução
As democracias pluralistas precisam proteger o direito ao protesto. São manifestações das
mais variadas pautas, que expressam ideias das mais distintas correntes políticas e encabeçadas
por um grande número de grupos e lideranças. No Brasil, sob o regime constitucional de 1988,
ainda há um conjunto de questões em torno do direito ao protesto que precisam ser enfrentadas.
De 2013 até o momento foram diversos os movimentos de rua que se alastraram pelo país, sendo
os mais proeminentes os de motivação política, em apoio ou contrários aos diversos governos
de situação e/ou candidatos à Presidência da República (em especial, Dilma Rousseff, Michel
Temer, Fernando Haddad e Jair Bolsonaro).
Ainda em 2013, começaram a ganhar destaque grupos de manifestantes que agem
por meio de estratégias de ação conhecidas como black blocs: geralmente vestidos de preto e
mascarados, utilizam-se de atos violentos e radicais. Dois dos adeptos deste tipo de ação –
Fábio Raposo e Caio Silva – foram acusados de acender e disparar um rojão que, durante uma
manifestação em 06/02/2014, no centro do Rio de Janeiro, atingiu e provocou a morte do
cinegrafista Santiago Ilídio Andrade, da TV Bandeirantes.1 O fato acabou por desencadear uma
forte discussão na sociedade: a legitimidade ou não de se usar máscaras nas manifestações! O
debate e os desentendimentos sobre o tema não ocorrem apenas no Brasil, destaque-se. Em
04/10/2019, Carrie Lam, chefe do Executivo de Hong Kong, anunciou a utilização de uma lei
de emergência de 1967, proibindo o uso de máscaras por manifestantes, no intento de conter
protestos violentos, sendo, todavia, autorizado o uso por quem tem problema de saúde ou
necessidade profissional. A medida não foi unânime, e no mesmo dia, após a publicação, houve
manifestantes que saíram às ruas de máscaras2.
1 VEJA. Ministério Público recorre contra liberdade de blackblocs acusados de matar cinegrafista. São
Paulo: 06 mai. 2015. Disponível em: <https://veja.abril.com.br/politica/ministerio-publico-recorre-contra-
liberdade-de-black-blocs-acusados-de-matar-cinegrafista/>. Acesso em: 22 ago. 2020.
G1. Cinegrafista atingido por rojão em protesto no Rio tem morte cerebral. Rio de Janeiro: 10 fev. 2014.
Disponível em: <http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2014/02/cinegrafista-atingido-por-rojao-em-
protesto-no-rio-tem-morte-cerebral.html>. Acesso em: 22 ago. 2020.
2 G1. Governo de Hong Kong proíbe o uso de máscaras em manifestações. São Paulo: 04 out. 2019.
Disponível em: <https://g1.globo.com/mundo/noticia/2019/10/04/governo-de-hong-kong-proibe-o-uso-de-
mascaras-em-manifestacoes.ghtml>. Acesso em: 22 ago. 2020.

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