Mediação ? uma Visão Panorâmica

AutorLuiz Antunes Caetano
Páginas183-202

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4.1. Meio adequado de solução de conflitos

Em geral, o público entende por mediação a atuação exercida por uma pessoa que, com seu trabalho ou diligência, faz a aproximação de uma ou duas partes para a realização de um negócio.Éaatividade exercida, por exemplo, pelo corretor de imóveis ou um representante comercial. Ou, ainda, entende-se mediação pela sinonímia de intercessão ou intermediação.

No entanto, a mediação de que queremos tratar é a do instituto de Direito, também meio e forma adequados ou alternativos de solução de questões, controvérsias ou conflitos entre particulares (mediados), pela interação de um terceiro, também particular (mediador).

Para a mediação, como na arbitragem, é de sua natureza que as partes queiram submeter-se a seu processo, e contratem a pessoa do mediador, mesmo por meio de um órgão institucional ou uma enti-dade especializada. Difere, todavia, da arbitragem, e muito, porque na mediação as partes não se colocam em posições de confronto, mas em posição de colaboração.

Não há a mínima litigância na mediação. O mediador, usando de seus conhecimentos e técnicas apropriadas, induz a que as partes, elas mesmas, encontrem a solução para sua questão, conflito ou controvérsia, que findará por um acordo.

Como VEZZULLA, Juan Carlos ensina:

"A mediação é uma técnica de resolução de conflitos, que sem imposições de sentenças ou de laudos, e, com um profissional devi-

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damente formado, auxilia as partes a acharem seus verdadeiros interesses e a preservá-los num acordo criativo onde as duas partes ganham."1Assim, nela não há um perdedor e um vencedor. Por isso, como modo de pacificação social, tem um aspecto humanístico sem igual, confere uma melhor qualidade de vida, nada desprezível.

"Es que el proceso de mediación brinda a las partes una oportunidad única:

· de comunicarse en la diversidad;

· de respetarse mutuamente, admitiendo que ambos puedem tener expectativas legítimas a respecto del caso planteado;

· de aprovechar el movimiento de la relación interpersonal, que genera el conflicto, para crecer interiormente en la comprensión de sí mismo y progresar en el descubrimiento del otro en cuanto tal."2No enunciado está inserido que o estudo do instituto da media-ção concede às pessoas um conhecimento de si mesmo, como do outro. É um aprendizado pessoal precioso de saber ouvir o outro, como o de saber dialogar.

4.2. Conceitos e diferenças: negociação, conciliação, mediação e arbitragem

Negociação, conciliação, mediação e a arbitragem são gêneros da mesma espécie: meios e modos adequados de solução alternativa de conflitos, com total exclusão da jurisdição do Poder Judiciário. Todos têm a mesma finalidade: a resolução extrajudicial do conflito, mas não se confundem. Cada um tem características e natureza próprias.

A negociação pode-se definir como o ajuste entre duas (ou mais) partes, diretamente entre si, para um acerto (por exemplo: uma compra e venda), ou mesmo para a resolução de interesses controvertidos, satisfazendo-se mutuamente. É instituição velha como o mundo. É de se dizer que, quando Adão e Eva discutiam sobre a maçã,

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estavam negociando. Ainda, se prestarmos atenção, no dia-a-dia, estamos sempre negociando. Como teoria e técnica, o assunto é relativamente novo. Já há a figura do negociador como expert, contratado por pessoas ou empresas para, em nome delas, negociar. Existe uma extensa bibliografia sobre "negociação", principalmente de autores norte-americanos, que trata de técnicas apropriadas a cada uma de suas aplicações; habilidades dos negociadores; da interdisciplinari-dade do instituto, etc.

O instituto da conciliação está albergado em nossa legislação. O Decreto (Regulamento) nº 737, de 25 de novembro de 1850, já instituía, verbis:

Art. 23. Nenhuma causa commercial será proposta em juízo contencioso, sem que previamente se tenha tentado o meio da conciliação, ou por acto judicial, ou por comparecimento das partes.

Na área do Direito do Trabalho, o art. 30 e seu § 1º do Decreto-lei nº 1.237, de 2 de março de 1939, já prescrevia, verbis:

"Os conflitos individuais ou coletivos, levados à apreciação da Justiça do Trabalho, serão submetidos preliminarmente à conciliação. Não havendo acordo, o juízo conciliatório converter-se-á obrigatoriamente em arbitral, proferindo a Junta, juiz ou tribunal decisão que valerá como sentença."

A Consolidação das Leis do Trabalho (Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943), para resolução dos conflitos entre empregados e empregadores, fazia rasa a situação denominando então suas Juntas de CONCILIAÇÃO e Julgamento, que em verdade muito pouco ou nada conciliavam.

Com audiências designadas a cada 10 minutos, presentes as partes e seus advogados, o juiz faz a pergunta clássica: "Tem acordo? Não? Trouxe a contestação por escrito? Então, vamos designar audiência de instrução e julgamento." Dita o termo da audiência, enquanto as partes da pauta seguinte já estão sendo chamadas para se apresentar.

Bem por isso, a Lei nº 9.958, de 12 de janeiro de 2000, alterando e acrescentando artigos à Consolidação das Leis do Trabalho, estatuiu que "as empresas e os sindicatos podem instituir Comissões de Conciliação Prévia, de composição paritária, com representantes dos

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empregados e dos empregadores, com a atribuição de tentar conciliar os conflitos individuais de trabalho".

Na área cível, o Código de Processo Civil, art. 331, confere ao juiz o poder de designar "audiência preliminar, a realizar-se no prazo de 30 (trinta) dias, para a qual serão as partes intimadas a compare-cer, podendo fazer-se representar por procurador ou preposto, com poderes para transigir."

Na Seção II - Da Conciliação, no art. 447 do mesmo Código -, é dado ao juiz conciliar as partes quando o litígio versar sobre direitos patrimoniais privados e em causas relativas à família.

A Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais,eaLei nº 10.259, de 12 de julho de 2001, que dispõe sobre a instituição dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, atribuem a busca da conciliação das partes a esses órgãos da Justiça Ordinária, cujo processo, julgamento e execução obedecerão aos critérios de oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade. E criou, como auxiliares da Justiça, conciliadores e juízes leigos, recrutados, os primeiros, entre os bacharéis em direito, e os segundos, entre advogados com mais de cinco anos de experiência.

Se bem nos Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e do Paraná implantou-se experimentações da Conciliação e Mediação junto ao Juizado de 1º grau, e com êxito, em boa hora o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, após também experimentar até mesmo em 2º grau o uso destes meios alternativos de solução de conflitos, por meio do Conselho Superior da Magistratura, pelo Provimento nº 893, de 28 de outubro de 2004 (publ. DOE de 10/11/04), autorizou a criação de Setores de Conciliação e Mediação em todas as Comarcas e Foros da Capital e do Interior do Estado.

Denota-se, portanto, que há a Conciliação Institucional, disposta em lei ou em órgãos judiciários, e outra Conciliação, não adversa, como técnica de solução de conflitos. Distinguem-se, porque, na Conciliação Institucional as partes desconhecem o Conciliador, e estariam em posição de subordinação relativa, além de, eventualmente, impregnadas de adversidade.

Mais, e ainda, desconhece-se a formação dos conciliadores para tanto, enquanto, na Conciliação não adversa, as partes a querem e

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escolhem ou atribuem a um terceiro experiente a condução da solução do conflito.

Bem explícitas para tanto as definições de conciliação, ditadas pela lei, verbis:

"medida cujo objetivo É PÔR as partes em contato, levá-las a CONFRONTAR seus programas, ajudá-las a achar um terreno comum de entendimento e CONDUZÍ-LAS aos termos de um acordo capaz de satisfazer a ambas"3 (grifamos).

Já a Conciliação não adversa

"como técnica exige um profissional que domine a investigação, a escuta e mantenha sua imparcialidade para que, sem forçar as vontades, as convença das vantagens de alcançarem um acordo que, mesmo não sendo totalmente satisfatório, poupe-as de complicações futuras onde ambas perderão tempo e dinheiro".4Note-se que a conciliação tem muito a ver com o instituto da transação de que trata o art. 1.025 do Código Civil, de 1916, verbis:

"É lícito aos interessados prevenirem ou terminarem o litígio mediante concessões mútuas."

Por derradeiro, nem mesmo a Lei de Arbitragem desconsiderou a conciliação. No § 4º do art. 21, deu competência ao árbitro ou ao tribunal arbitral, no início do procedimento, para tentar a conciliação das partes.

Fica válida, porém, a crítica tanto ao árbitro como ao juiz de direito de que eles podem não ter a vocação nem formação para a conciliação. As funções seriam incompatíveis. Ou bem julgam, ou bem conciliam.

Sobre a mediação, fica escusada qualquer explanação, de vez objeto desta visão panorâmica haveria repetição de seus conceitos. A mesma observação cabe sobre a arbitragem, objeto do Livro II deste livro.

Vale estabelecer a distinção entre arbitragem e arbitramento. São coisas distintas. Norma geral, pessoas e entidades confundem o

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arbitramento com a arbitragem e denominam, de forma equivocada, esta por aquele.

Arbitramento é o procedimento perante entidades corporativas para dirimir as controvérsias eventualmente surgidas...

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