Mesa de Debates 'B' - Processo judicial

AutorAmérico Lacomb
Páginas49-64

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Presidente da Mesa (Prof. Américo Lacombe) - Esta Mesa de Debates, Mesa 2, versará sobre "Processo Judicial". Nós temos nesta Mesa o Prof. Marcelo Fortes, o Prof. Paulo César Conrado, a Profa. e Desa. Regina Helena Costa e a Profa. Misabel Derzi. Todos eles dispensam qualquer apresentação: são figuras de notório saber jurídico. Portanto, vamos dar seguimento, passando a palavra ao Prof. Marcelo Fortes, que vai falar sobre "Repetição de Indébito em Face da Repercussão do Ônus Financeiro (Art. 166 do CTN): Limitações e Sujeições Ativas para Postulação". O tempo de cada um será de 20 minutos.

Repetição de Indébito em Face da Repercussão do Ônus Financeiro (Art 166 do CTN): Limitações e Sujeições Ativas para Postulação

Prof. Marcelo Fortes [Texto sem revisão do autor] - Boa tarde a todos! Exmo. Presidente, colegas de Mesa, colegas do Plenário. O tema da presente palestra -"Repetição de Indébito Tributário" -, está certo, é tema por demais conhecido. Ou seja: falaremos sobre o art. 166 do CTN. O que vem a ser o objeto da nossa discussão? O objeto da nossa discussão é o tema na repercussão financeira dos tributos. Ou seja, nós temos canalizado, especificamente, qual a relevância jurídica a ser dada -aliás, qual a relevância jurídica que foi dada pelo legislador e pelo sistema tributário para a repercussão econômica naqueles tributos em que o contribuinte tributário repassa para o contribuinte econômico o ônus do tributo.

Temos que analisar, em último plano, se essa situação é compatível com o ordenamento, ou não. E analisar, mais especificamente, se hoje nós temos, ou não, uma questão já resolvida, e se cabem, ou não, mais delongas a respeito desse tema. De logo já antecipo que nós temos uma questão, ainda hoje, mal-resolvida - e uma questão atualíssima, talvez a questão de maior repercussão, hoje, no STF, que é a ADC 18, que trata da exclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS, que tem influência direta na presente matéria. Ou seja, o que se está se discutindo nessa ADC 18, de uma certa forma, não pode ser enfrentado de maneira correta se nós não voltarmos a essa discussão do art. 166. E vejamos por quê.

O que dispõe esse art. 166 do CTN? Textualmente. "A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la".

É muito claro qual foi o objetivo do legislador: evitar o aproveitamento dúplice - ou seja, evitar que o contribuinte tributário, evitar que o contribuinte de direito, aproveite duas vezes, ou seja, repassando o ônus tributário, o ônus econômico, para o consumidor final, e também aproveite o momento em que ele recupera aquele valor do Fisco. Ou seja: seria evitar essa, entre aspas, "apropriação indébita" pelo contribuinte de direito. Essa foi a vontade do legislador, não resta dúvidas, isso está muito claro.

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Pois bem, também não resta dúvida sobre o que é e qual foi o fundamento dessa vontade do legislador, que foi o da repercussão econômica. Está certo? E repercussão econômica, no caso, é o repasse do valor do tributo no preço dos bens e serviços. E foi com base nessa repercussão econômica que se fundou a classificação dos tributos em diretos e indiretos. E o que é um tributo direto, o que é um tributo indi-reto? Tributo direto é aquele tributo em que há repercussão, no que, nós temos a confusão entre [truncado na gravação], estranho à relação tributária. Essa classificação é orientada por uma outra que é muito utilizada na Ciência das Finanças, entre o contribuinte de fato e o contribuinte de direito, sendo o contribuinte de direito aquele que está no pólo passivo da obrigação tributária e o contribuinte de fato aquele que suporta o ônus econômico do tributo. Essa divisão serviu de fundamento para a classificação entre tributos diretos e indiretos.

Agora, qual é - admitindo-se, por ora, a compatibilidade dessa regra no sistema tributário - a abrangência desse dispositivo do art. 166 do CTN? Quais tributos esse dispositivo alcança? Por óbvio que, se temos um critério da repercussão econômica, e sendo o tributo para a economia, e somente para a economia, um custo, quem pode, repercute, está certo? Mas somente quando esse elemento, somente quando esse custo é tomado como relevante na hipótese tributária, somente quando a porta aberta do Direito torna relevante esse elemento, esse fato econômico que eu transformo em fato jurídico, é que ele passa a ser relevante para o Direito. Ou seja: é necessário que nós separemos entre a repercussão econômica pura e simples e aquela repercussão econômica que se tornou relevante para o Direito, aquela repercussão econômica que foi reforçada no fato jurídico. E onde nós tivemos, onde nós temos, essa repercussão econômica que se tornou relevante para o Direito, ou seja, que foi reforçada no fato jurídico? Naqueles tributos sujeitos à não-cumulatividade, está cer-to? Então, esse é o tanto de abrangência do art. 166 do CTN.

Admitindo-se o referido artigo como norma pertinente ao ordenamento jurídico, uma norma que está lá, resistindo, no ordenamento jurídico, então, esse seria o campo de irradiação do art. 166 do CTN.

Pois bem, agora eu coloco o seguinte ponto, para reflexão: se é necessário que nós tomemos como relevante a repercussão jurídica, e não puramente a repercussão econômica, que não se tornou relevante para o Direito. Sugiro que reflitamos sobre um outro ponto: quando é que essa repercussão jurídica efetivamente vai produzir os efeitos para os quais se destina, ou seja, os tributos indiretos. Creio que precisamos avaliar, investigar, é se essa repercussão se caracteriza, ou seja, se esse valor, que é repassado juridicamente para um terceiro, é efetivamente receita, ou não, para esse terceiro. O que eu proponho é que façamos uma inversão no raciocínio, para investigar se esse valor que a legislação permite que seja repassado pelo contribuinte tributário para a frente, até chegar ao contribuinte de fato, satisfaz, ou não, ao conceito de receita, exatamente para saber se estamos, ou não, diante de uma receita do contribuinte de direito. Porque, se nós não estivermos diante de uma receita do contribuinte de direito, podemos, talvez, estar diante de mais uma técnica legislativa para antecipar a cobrança de tributo numa fase mais adiantada ou a uma pessoa mais adiantada da cadeia de circulação da mercadoria - que é, na verdade, a mesma discussão que está sendo travada, hoje, na ADC 18. Então, esse tema do art. 166 é muito atual, presentemente.

Vejamos: o que é receita? E estamos diante de conceitos muito pacificados. Receita, segundo o Prof. Geraldo Ataliba, e uma entrada que passa a pertencer à entidade. Ou seja, é receita o que entra no patrimônio. E, pensando de forma analítica, ao mesmo passo surge a relação jurídica do contribuinte de direito, pensando no ICMS, pensando no IPI, para recolher para o Esta-

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do, uma determinada importância a título de tributo, certo? E é ele que deve recolher, está certo? E ele, de fato, normalmente repassa o ônus financeiro, ele já nasce para ele, ele já tem no seu passivo essa obrigação. Pergunta-se: o que entra no seu ativo, quando ele recebe, quando ele vende a mercadoria, é algo que acresce o seu patrimônio ou é algo que não acresce o seu patrimônio? Tem ou não tem uma correspondência? Se nós fizermos uma conta de liquidez, temos, ou não, uma compensação? Se nós utilizarmos o próprio conceito do IBRACON [Instituto dos Auditores Independentes do Brasil], nós temos que considerar acréscimos nos ativos ou decréscimos nos passivos, para sempre levar em consideração algo que possa alterar o patrimônio líquido.

Enfim, se, na verdade, não se caracteriza como receita, então, não temos algo positivo. Nós não temos aquele valor que é repassado, que não acresce o patrimônio. Ele, para o contribuinte de direito, se vier a ter uma recuperação, não vai representar nenhum acréscimo, porque ele já repassou para o Estado o correspondente daquele valor.

Pois bem. O direito do particular nasce do art. 165 do CTN ou nasce da própria Constituição Federal? Questão por demais debatida. Nós podemos, sem sombra de dúvidas, construir dois fundamentos para esse direito à repetição de indébito. Um fundamento imediato, a partir de uma norma geral de repetição do indébito, construída a partir do art. 165, e um fundamento constitucional. Se nada existisse no Código Tributário Nacional a tratar da repetição do indébito, o mesmo direito do particular, a repetição, já existiria. O silêncio do Código Tributário Nacional sobre a repetição do indébito já daria ao particular o direito à repetição. Por quê? Porque o direito de um Estado de cobrar tributos nasce da sua competência, e a competência que é repartida na Constituição Federal impõe limites objetivos. Ao Estado cabe cobrar aquilo que a lei lhe permite, é o princípio da estrita legalidade - ou seja, o Estado vai fazer aquilo que a lei lhe dá poderes para fazer, e não pode agir, nem um mínimo que seja, fora de tais limites.

Isso nos permite concluir que temos um fundamento imediato do direito à repetição de indébito na própria Constituição, e que qualquer cobrança fora dos limites permitidos na própria Constituição Federal, no próprio princípio da estrita legalidade, vai dar direito à repetição, e que esse direito à repetição não pode ser limitado por nenhum dispositivo abaixo dessa Constituição. E o art. 166 do CTN limita esse direito constitucionalmente prestigiado. E nós temos que visualizar o lado da regra-matriz da repetição do indébito, e todas construídas ao mesmo...

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