Metamorfose urbana - entre a renovação e a conservação: breves comentários sobre a proteção do Patrimônio Cultural Arquitetônico no contexto das Ordens Urbanísticas do Brasil e de Portugal / Urban transformation - between the renovation and...

AutorNathália Arruda Guimarães
Páginas71-131
Metamorfose urbana -- entre a
renovação e a conservação:
breves comentários sobre a
proteção do Patrimônio
.Cultural Arquitetônico no
contexto das Ordens
Urbanísticas
do
Brasil
e de
Portugal
1. Sumário. 2. Alguns Conceitos Fundamentais.
2.1. O Direito Urbanístico: objeto, evolução e autonomia.
2.2. Desenvolvimento sustentável e sua repercussão em matéria
de Direito Urbanístico, Ambiental e do Patrimônio Cultural.
2.3. A renovação e o crescimento urbanos
x
Proteção do
Patrimônio Cultural.
2.4. Fatores de renovação urbana. 2.5. O Patrimônio Cultural.
3. Preservação do Patrimônio Cultural das cidades e a Constituição.
4. A distribuição de- competências na_preservação do
Patrimônio Cultural no Brasil e Portugal. 5. O planejamento
urbanístico no Brasil e em Portugal e os bens de interesse
cultural. 5.1. Funções dos planos urbanísticos.
6. A participação da sociedade na preservação do Patrimônio Cul-
tural: o papel do cidadão e as consequências para o proprietário.
6.1. E como fica o proprietário? 6.2. Da desapropriação indire-
ta e o direito de indenização do proprietário.
7. Proteção do Patrimônio Cultural e os Planos Urbanísticos nos
Tratados e Convenções Internacionais.
8. Conclusões. 9. NUlas. 10. Referências bibliográficas.
Revista de Direito da Cidade
vol.06, nº 02. ISSN 2317-7721
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1. Sumário
Assiste-seatualmente, em nível do Direito Público, uma grande am-
pliação de ramos especiais.
Tal
especializa.~otem surgido em resposta
aos novos fatos da
vida
social,bem como denotam, sob o ponto de vista
político, a atuação' do Estado Social, que passa a tomar como tarefas
questões dantes deixadas ao livre jogo dos mercados ou da natureza.
Essa nova postura do Estado induz os cidadãos a um cres-
cente interesse pela melhoria da qualidade de vida que hoje não se
limita mais apenas às exigências mínimas de sobrevivência, mas
também orienta-se no sentido da afirmação de uma cidadania
preenchida por valores de solidariedade coletiva.
1
Nesse contexto de atuação Estatal, o legislador, constitu-
cional e ordinário, em reconhecimento aos novos bens jurídicos,
promove novas leis, as quais fundam sistemas especializados, ca-
pazes de estabelecer a tutela jurídica com contornos específicos
em função dos fatos sociais em questão.
O
Direito Urbanístico, o Direito Ambiental e o Direito
do Patrimônio Cultural são exemplos desses novos interesses esta-
tais e sociais. Pautados em premissas constitucionais, são ramos
em desenvolvimento que tratam de questões de interesse público,
cujas normas disciplinam, com maior ou menor abrangência, a
medida da utilização do solo, das propriedades que o compõem,
bem como criam novos paradigmas face
à
renovação urbana, ele-
mento constante nos espaços habitados.
É assim que a atenção dada aos problemas urbanos e so-
bretudo aos problemas confrontados com a cidade construída
fundamenta-se nas atuais exigências culturais, ambientais, sociais
e econômicas. E, se antes a "urbe" designava o espaço material da
vida dos homens, o lugar onde seus habitantes se protegiam entre
muros, hoje a cidade inflige a circulação caótica dos automóveis,
as distribuições de atividades e serviços, a degradação e o afasta-
mento da natureza e a dinâmica de constantes modificações que
visam atingir um "desenvolvimento urbano".
E predomina hoje, principalmente nas cidades dos países
elTIdesenvolvimento, a idéia de que o crescimento das cidades espelha
o "desenvolvimento" e o "progresso".2 Como se a cidade pudesse ser
mais humana e mais viável se continuar a crescer e a renovar-se.
O
mito do "desenvolvimento" das cidades é extremamente difundido
na cultura brasileira e
não
resta dúvida de que tal imagem repercute
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na expansão da cidade e no deslocamento de interesses. O crescimento das cidades
acentua, todavia, os desequilíbrios geográficos, aumentando a disparidade entre
regiões ricas e regiões pobres, degrada as relações sociais, perpetua, sobre formas
diversas, o consumo da terra considerado como um recurso inesgotável e acentua os
conflitos entre os governos e os habitantes e, por inúmeras vezes, justifica a destrui-
ção de bens culturais, em nome de uma renovação vinculada tão somente a interes-
ses especulativos. Promover os instrumentos urbanos capazes de garantir o direito
à cidade urbanizada tal qual prometida pelas legislações constitucionais, requer,
ainda, altos i~vestimentos públicos muitas vezes incompatíveis os limites dos
bens ambientais
e
com a situação econômica das cidades.
A Lei n.O 48/98, que estabelece as bases da política de Ordenamento
do Território e do Urbanismo em Portugal, prevê na alínea "e", do artigo 6.°,
como objetivo da política urbana, a "adequação dos níveis de densificação ur-
bana, impedindo a degradação da qualidade de vida, bem como o desequilíbrio
da organização socioeconômica e social". Tal norma explicita a preocupação do
legislador português em estabelecer um desenvolvimento equilibrado.
No Brasil, a preocupação resta explícita no texto da Política Urbana
(Estatuto da Cidade), uma vez que esta tem por objetivo a garantia do direito
a cidades "sustentáveis",3 o que passa, necessariamente, pelo controle do cresci-
mento e da densificação populacional.
É de se desenvolvere destacar,portanto, tal aspecto nas políticas urbanas. O
crescimento
das
cidades pressiona a renovação dos centros urbanos, a ampliação
das
vias de circulação, a destruição de prédios antigos para a construção de arranha-céus,
estaçõesde trens, metrôs e tantos outros instrumentos necessários para a conexão dos
diversos pontos
da
cidade, muitas vezesinserida em contextos metropolitanos.
O presente trabalho pretende desenvolver algumas das questões trazidas
pela renovação urbana, entendida aqui como o fenômeno da transformação das
cidades,
4
seja causada pelo crescimento, pelos desastres naturais, pelas refor-
mas promovidas pelos particulares e pelos órgãos públicos, bem como pelas
demandas diversas que levam à transformação das cidades e o confronto entre
est~ fato e o interesse crescente pela proteção e conservação dos bens culturais
imóveis, inseridos nos contextos urbanos da construída.
Trataremos da matéria sob o ponto de vista do Direito Urbanístico,
verificando aspectos que distinguem e unem esse ramo jurídico ao Direito do
Patrimônio Cultural. Avaliaremos especificamente os planos urbanos, buscan-
do demonstrar suscintamente em que medida estão convocados a atuar na
questão da proteção dos bens culturais de natureza imóvel.
A abordagem, assim, destacará o papel do plano local na realização da
proteção do Patrimônio construído no Brasil e em Portugal e suscitará algumas
questões ligadas ao direito ambiental e sua contribuição para a construção de
conceitos aplicáveis à proteção das cidades históricas e ao Direito Urbanístico.
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