Não é não - como contracondutas na direção do 'cuidado de si

AutorMaria Simone Vione Schwengber - Naira Leticia Giongo Mendes Pinheiro
CargoDoutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, RS - Doutoranda em Educação nas Ciências pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul-RS
Páginas266-286
Rev. direitos fundam. democ., v. 26, n. 3, p. 266-286, set./dez. 2021.
DOI: 10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v26i31777
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
NÃO É NÃO COMO CONTRACONDUTAS NA DIREÇÃO DO “CUIDADO DE SI”:
UMA ANÁLISE FOUCAULTIANA
NO, IT IS NOT AS COUNTER-CONDUCT IN THE DIRECTION OF “SELF-CARE”:
A FOUCAULTIAN ANALYSIS
Maria Simone Vione Schwengber
Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul RS. Mestra em Educação nas Ciências da Saúde pela
Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul-RS.
Naira Leticia Giongo Mendes Pinheiro
Doutoranda em Educação nas Ciências pela Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul-RS.
Resumo
Este artigo analisa a campanha Não É Não e alguns de seus
desdobramentos. Discutimos essa campanha como manifestação de
resistência, de contracondutas (FOUCAULT, 2008) em relação as
atitudes de assédio percebidas como atos de violência, que limitam as
liberdades individuais e coletivas no que se refere aos corpos das
mulheres nos espaços públicos. Propomos um percurso teórico-
metodológico para análise inspirado na perspectiva foucaultiana. O
corpus de análise é constituído por recortes de dizeres enunciativos e
de imagens postadas em páginas das redes sociais digitais. Das
análises, destacamos que Não É Não reivindica o direito das mulheres
de terem seus corpos preservados do assédio e de violências,
deslocando-se do lugar submisso que lhes foi (é) imposto. Assim, na
campanha Não É Não mobiliza-se a escrita, que produz um
deslocamento nos usos e instaurando uma singularidade em relação
ao que já foi feito com e por meio dos corpos, e, aos modos de como
já foi dito, indica transformações nas regras de enunciabilidades,
inaugurando o lugar de fala (pública) desse grupo de mulheres.
Entendemos essas ações como contracondutas, como disponibilidade
numa relação ética de “cuidado de si”.
Palavras-chaves: Assédios. Corpos. Mulheres. Violência. Cuidado de
si.
NÃO É NÃO COMO CONTRACONDUTAS NA DIREÇÃO DO...
267
Revista de Direitos Fundamentais & Democracia, Curitiba, v. 26, n. 3, p. 266-286, set./dez., de 2021.
Abstract
This article looks at the No Is Not campaign and some of its
developments. We discuss this campaign as a manifestation of
resistance, of counter-conduct (FOUCAULT, 2008) regarding
harassment attitudes perceived as acts of violence, which limit
individual and collective freedoms regarding women's bodies in
public spaces. We propose a theoretical-methodological path for
analysis inspired by the Foucaultian perspective. The corpus of
analysis consists of clippings of enunciative words and images
posted on pages of digital social networks. From the analysis, we
highlight that No Is Not claims the right of women to have their bodies
preserved from harassment and violence, moving from the
submissive place that was (is) imposed on them. Thus, in the
campaign Is Not Does not mobilize writing, which produces a shift in
uses and establishing a singularity in relation to what has already
been done with and through the bodies, and, as it has been said,
indicates changes in enunciability rules, inaugurating the (public)
place of speech of this group of women. We understand these
actions as counter-conduct, as availability in an ethical relationship
of “self-care”.
Key-words: Harassment. Bodies. Women. Violence. “self-care”.
1. OS OLHARES LASCIVOS SOBRE OS CORPOS DAS MULHERES
BRASILEIRAS
Este artigo analisa a campanha Não É Não (2017-2019) e alguns de seus
desdobramentos (materiais), os quais denominamos como manifestações de
resistência ou ainda como contracondutas (FOUCAULT, 2008). A campanha
organizada por um grupo de mulheres brasileiras adquiriu força e potência em 2018
nas redes sociais digitais e nas ruas do Brasil durante o carnaval.
1
A campanha, em
2019, expandiu e é retomada em outros festejos populares, como os de São João,
2
país a fora.
1
É uma das maiores festas brasileiras, o que faz com que o Brasil seja conhecido como o país do
Carnaval, embora não é uma festa originalmente brasileira. Carnaval é uma celebração popular com
características muito diferentes de uma região para outra. A folia carnavalesca é considerada uma festa
com qualidades políticas e satíricas, autorganizada geralmente pela população jovem. Carnaval (em
latim carne levare) era uma espécie de “despedida da carne”, e significava “adeus às carnes”. O
Carnaval é festejado em diversas espacialidades, como ruas, praças, avenidas, casas, terraços,
quintais, clubes e passarelas de samba, que são alguns dos espaços que compõem a geografia
carnavalesca (SOIHET, 2008).
2
Caracteriza-se por uma festa/evento geralmente comemorada nos meses de junho/julho no Brasil, e
coloca-se entre as maiores do mundo. É uma festa da cultura junino-nordestina, com celebrações que
mantêm viva a cultura popular brasileira, rica em crenças, alimentação, danças e músicas. É vista como
uma celebração à vida, com espontaneidade e alegria, sendo significativos os encontros das
corporeidades, especialmente na sua acepção como ser comunicativo e social (NÓBREGA, 2010).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT