A necessidade de estudos comparativos para o desenvolvimento de instituições democráticas: defensoria pública e seu papel no acesso à justiça

AutorJulio Pinheiro Faro
Páginas150-171
P A N Ó P T I C A
Panóptica, Vitória, vol. 9, (n. 28), 2014
ISSN 1980-775
A NECESSIDADE DE ESTUDOS COMPARATIVOS PARA O
DESENVOLVIMENTO DE INSTITUIÇÕES DEMCRÁTICAS:
DEFENSORIA PÚBLICA E SEU PAPEL NO ACESSO À
JUSTIÇA
Julio Pinheiro Faro
1. INTRODUÇÃO
Segundo estudos comparativos, existem três grandes modelos de Advocacia
Pública. Apenas em um (adotado pela Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Paraguai e
Venezuela), há clara divisão entre as funções de representação do Estado, da
sociedade e dos necessitados, respectivamente, na Advocacia de Estado, no
Ministério Público e na Defensoria Pública, ficando os outros dois modelos
(adotados pela Argentina e Peru, e Colômbia e Uruguai) caracterizados pela
confusão de representações e atribuições (cf. Vieira e Faro, 2014: 21-30).
Esses três órgãos (Advocacia de Estado, Ministério Público e Defensoria
Pública), ou, de acordo com a preferência do poder constituinte brasileiro, essas três
funções essenciais à Justiça, formam a tríade da advocacia pública (cf. Pedra, Faro
e Vieira, 2014: 13), a qual, ao lado da advocacia privada, compõe o sistema
constitucional brasileiro de funções essenciais à Justiça.
Dentro dessa tríade da advocacia pública, há uma divisão entre órgãos que
cuidam do chamado interesse público secundário, como é o caso da Advocacia de
Estado, e órgãos que cuidam do interesse público primário, como é o caso do
Ministério Público e da Defensoria Pública. A partir dessa divisão, teríamos, então, a
seguinte divisão de funções: “a Defensoria Pública ou do Povo, normalmente
encarregada da defesa dos interesses dos membros da sociedade dotados de
escassos recursos, isto é, preocupada com a defesa dos necessitados; o Ministério
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Público ou o Fiscal de Estado, cujas funções são as mais variadas, desde
representar a sociedade perante órgãos jurisdicionais do Estado até garantir o
respeito aos direitos fundamentais e proceder à persecução penal; a Advocacia de
Estado ou Procuradoria de Estado, cujas atribuições são assessorar, prestar
consultoria e defender judicial e extrajudicialmente o Estado” (Vieira e Faro, 2014:
34).
Considerando tais funções, a Defensoria Pública parece ser a menos visada
em estudos acadêmicos. Aqui, no entanto, me desincumbo da tarefa de tentar fazer
um inventário sobre a Defensoria Pública nos sistemas constitucionais sul-
americanos, pois considero que o esforço despendido em Vieira e Faro (2014) tenha
resultado em um estudo que se pode aproveitar aqui.
A minha proposta é, aqui, bem outra. Proponho-me a delinear três questões
que se imbricam no rol de funções da Defensoria Pública, na tentativa de abrir o
horizonte dos estudos comparativos, para o crescimento contínuo dessa
importantíssima instituição democrática. As três questões são: o papel da Defensoria
Pública, o significado de acesso à Justiça e o método comparativo de interpretação
do Direito.
2. O PAPEL DA DEFENSORIA PÚBLICA
O marco legal do instituto da assistência judiciária é a Constituição brasileira de
1934 (arts. 5º, XIX, “c”, e 113, 32)1, exatamente o texto constitucional que teve
menores duração e eficácia no Brasil, que em 1937, com a nova Constituição
outorgada, teve-se a supressão da previsão. Depois, com o Código de Processo
1 Art. 5º. Compete privativamente à União: XIX – legislar sobre: c) normas fundamentais do direito
rural, do regime penitenciário, da assistência social, da assistência judiciária e das estatísticas de
interesse coletivo.
Art. 113. A Constituição assegura a brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade
dos direitos concernentes à liberdade, à subsistência, à segurança individual e à propriedade, nos
termos seguintes: 32) A União e os Estados concederão aos necessitados assistência judiciária,
criando, para esse efeito, órgãos especiais assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas
e selos.

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