Nota Técnica 3/13 - Transposição do RGPS para o RPPS

AutorWladimir Novaes Martinez
Ocupação do AutorAdvogado especialista em Direito Previdenciário
Páginas169-193

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Brasília, 28 de agosto de 2013.

REGIME PREVIDENCIÁRIO DOS SERVIDORES PÚBLICOS MUNICIPAIS DO REGIME GERAL PARA O REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL.

Implicações e desdobramentos decorrentes da alteração do regime previdenciário dos servidores públicos municipais, em face da instituição de Regime Próprio de Previdência Social.

INTRODUÇÃO

  1. Esta Nota tem o propósito de orientar especialmente o Município que planeja instituir o regime de previdência de que trata o art. 40 da Constituição Federal de 1988, tendo em vista relevantes implicações e desdobramentos relacionados à mudança de regime previdenciário do Regime Geral para o Regime Próprio de Previdência Social, sem a pretensão de abranger todas as questões jurídicas concernentes a esse tema, mesmo porque a referida mudança tem-se revelado fonte inexaurível de novas situações práticas.

  2. É, portanto, principalmente sob um ponto de vista prospectivo, de lege ferenda, que esta Secretaria de Políticas de Previdência Social - SPPS, no uso da competência atribuída à União pelo art. 9o da Lei n. 9.717, de 1998, por intermédio do Ministério da Previdência Social - MPS, edita a presente Nota Técnica, a par das regras gerais já estabelecidas em matéria de Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, sob supervisão e acompanhamento desta Pasta, considerando que todos os Estados e o Distrito Federal já instituíram RPPS, e que este é o caminho trilhado por quase dois mil municípios brasileiros.

  3. Sendo este o im que se colima, vejamos os temas sele-cionados nesta Nota.

    I - DA INSTITUIÇÃO DO REGIME JURÍDICO ÚNICO ESTATUTÁRIO E DO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL

  4. De acordo com a Constituição Federal de 1988, os Municípios têm competência para criar regime próprio de previdência social (art. 24, XII; art. 30, I e II; art. 40; e art. 149, § 1º), destinado a amparar o servidor civil titular de cargo efetivo1, mediante lei municipal em sentido estrito, que observará as disposições da Constituição Federal de 1988 para esse regime, sejam elas permanentes ou transitórias, bem como as regras gerais editadas pela União (art. 24, § 1º ).

  5. Como o âmbito subjetivo de proteção do regime próprio é o servidor titular de cargo efetivo, importa que o Município deverá adotar o regime jurídico estatutário, porque este regime é o aplicável no caso de cargo, como preleciona Lucas Rocha Furtado (grifos no original): "[...] a existência do cargo público está condicionada à adoção de regime jurídico estatutário, vale dizer, de regime jurídico público" Atualmente, após a decisão proferida pelo egrégio Supremo Tribunal Federal - STF no julgamento da Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade - ADI 2.135/DF, realizado em 02.08.2007, o Município que passar a adotar o regime estatutário deverá fazê-lo como único regime funcional, porque a possibilidade de um regime dual (estatutário e celetista), ante-riormente assegurada pela reforma administrativa decorrente da Emenda Constitucional - EC n. 19/1998, foi abolida por este julgado, que restabeleceu a eicácia da redação originária do art. 39 da Carta Magna , ex nunc, isto é, a partir da referida decisão, conforme o seguinte Acórdão: ADI 2.135-MC/DF.

    ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas. 1. A cobertura previdenciária pelo RPPS municipal determina a exclusão do servidor, ex vi legis, do Regime Geral, nos termos do art. 12, caput, da Lei n. 8.213/1991: "Art.

  6. O servidor civil ocupante de cargo efetivo ou o militar da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios, bem como o das respectivas autarquias e fundações, são excluídos do Regime Geral de Previdência Social consubstanciado nesta Lei, desde que amparados por regime próprio de previdência social". Consoante o Parecer da Consultoria Jurídica do MPS n. 3.165 (DOU de 31/10/2003), aprovado pelo Ministro da Pasta, com a seguinte ementa: Regimes Próprios de Previdência Social. Momento de criação, para ins de exclusão do Regime Geral. Necessidade de edição de lei em sentido estrito.

    1 - Considera-se instituído o regime próprio de previdên-cia social, para os ins liberatórios da proteção do servidor e das contribuições deste e da entidade pública para a qual trabalhe (arts. 12 da Lei n. 8.213/91 e 13 da Lei n. 8.212/91), a partir da vigência da lei, em sentido estrito, do Estado ou do Município, que estabeleça o regime previdenciário local.

    2 - Impossibilidade de consideração, para os ins acima especificados, das normas de aposentadorias e pensão por morte constantes da Constituição Federal, de Constituições Estaduais ou de Leis Orgânicas Municipais. Absorção obrigatória do art. 40 da Constituição Federal pelas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas Municipais. Competência privativa do Chefe do Poder Executivo para iniciativa de leis que disponham sobre aposentadoria de servidores públicos (art. 61, parágrafo 1º, II, "c", da Constituição Federal).

    3 - Invalidação do Parecer MPS/CJ n. 2.955/03.

    FURTADO, Lucas Rocha. Curso de direito administrativo.

  7. ed. rev. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2013, p.715.

    4 - Releva destacar ainda, segundo a abalizada doutrina de Lucas Rocha Furtado (Ob. cit., p. 720), que essa mesma reforma administrativa, de 1998, ao acrescentar o art. 247 ao corpo permanente da CF, trouxe uma vedação constitucional implícita, pois estaria ínsito a este preceito que, para o exercício de atividades típicas de Estado (ou exclusivas, como consta de sua redação), seria obrigatória a adoção do regime do cargo público, eis que o referido dispositivo determinou o estabelecimento de critérios e garantias especiais para a perda do cargo pelos servidores que desenvolvessem tais atividades, nas leis a serem editadas para as seguintes hipóteses: não aproveitamento na avaliação periódica de desempenho (art. 41, § 1º , III); e excesso de despesa do ente político com pessoal ativo e inativo (art. 169, § 7º). Ou seja, seria vedada a adoção do regime da CLT no caso de atividade exclusiva de Estado, como a dos servidores cuja área de atuação é o exercício da polícia administrativa (poder de

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    polícia/atividade ordenadora). Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas.

  8. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 2135 MC/ DF. Relator: Néri da Silveira. Relator p/ Acórdão: Min. Ellen Gracie. Acesso em: 15 fev. 2013. Notas taquigráicas, por maioria de votos, deferir parcialmente a medida caute-lar para suspender a eicácia do art. 39, caput, da Constituição Federal, com a redação da Emenda Constitucional n. 19, de 04 de junho de 1998, nos termos do voto do relator originário, Ministro Néri da Silveira. O tribunal assentou, também, que a decisão - como é próprio das medidas caute-lares - terá efeitos ex nunc, subsistindo a legislação editada nos termos da emenda declarada suspensa. Brasília, 02 de agosto de 2007.

  9. É certo que a interpretação sobre qual seria o regime jurídico único, exigido pela redação originária do art. 39 da Constituição Federal, vacilava entre o regime celetista e o estatutário, como assevera José dos Santos Carvalho Filho (grifos no original). Em sua redação originária, dispunha o art. 39, caput, da CF, que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios deveriam instituir, no âmbito de sua competência, regime jurídico único e planos de carreira para os servidores da administração pública direta, das autarquias e das fundações públicas. Muita polêmica se originou desse mandamento, porquanto, não tendo sido suiciente-mente claro, permitiu o entendimento, para uns, de que o único regime deveria ser o estatutário, e para outros o de que a pessoa federativa poderia eleger o regime adequado, desde que fosse o único. Na verdade, nunca foi dirimida a dúvida. O certo é que havia entidades políticas em que se adotou o regime estatutário, ao lado de outras (sobretudo Municípios), nas quais adotado foi o regime trabalhista.

  10. Mas, o entendimento que parece ter prevalecido na Corte Suprema é que a exigência constitucional de unicidade se refere ao regime jurídico estatutário, e não ao celetista. Neste sentido, vejamos os seguintes trechos do debate entre Ministros do col. STF, no julgamento da Reclamação no 5.381, ocorrido em 17.03.2008:

    A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - O Senhor Ministro-Relator me permite?

    O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (RELATOR)

    - Pois não.

    A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Vamos voltar. Quando foi promulgada, a Constituição estabelecia, no art. 39, o que desde 2 de agosto de 2007 este Plenário decidiu, suspendendo os efeitos da norma que tinha sido introduzida pela Emenda n. 19, e voltando, portanto, ao regime jurídico único. [....]

    A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - [...] Então, Excelência, pedi este aparte apenas para enfatizar que a dou-trina e a jurisprudência sempre izeram referência ao fato de que a relação jurídico-administrativa não comportava nada de regime celetista, máxime em se tratando de situações posteriores à Constituição de 1988, em cuja norma, inicialmente redigida no art. 39, não se poderia ter senão o regime estatutário ou o regime jurídico-administrativo.

    O SENHOR MINISTRO CARLOS BRITTO (RELATOR) - Esse "ou" a que Vossa Excelência se refere está na ADI também. Esse "ou" é sinônimo ou não? Vossa Excelência está dizendo regime jurídico estatutário.

    A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA - Estou acentuando o que colho desse art. 37, com o que era a norma do art. 39, que, nesse caso, só suscitou questões, na doutrina e na própria jurisprudência, quando veio a Emenda Constitucional n. 19. Aí, sim, porque surgiu de novo a igura do empregado e este seria sujeito ao regime celetista; mas não é este o caso. E, mesmo nesses casos, depois da nossa decisão de agosto quando foram...

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