A oportunidade da Emenda Constitucional n. 66/2010

AutorPaulo Hermano Soares Ribeiro - Edson Pires da Fonseca
Ocupação do AutorProfessor de Direito Civil das Faculdades Pitágoras de Montes Claros, MG e da FADISA - MG. Tabelião de Notas. Advogado licenciado. - Professor de Direito Constitucional e Teoria do Direito na FADISA e na FAVAG - MG
Páginas133-136

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É do Direito Canônico o dogma da sacralidade do casamento. O fundamento do matrimônio estaria nas leis divinas, cujo controle não pertence aos homens, e sendo sagrado, uma vez que adentramos seus portais, rarefeita se mostra a possibilidade de exercício da auto-nomia privada na sua dissolução.

O Estado, amparado pela cultura religiosa, sustentou a sacralidade nas entrelinhas dos textos legais e interferiu duramente, enquanto presente o ambiente favorável a essa interferência, na constituição e dissolução do casamento. O sistema jurídico nacional herdou das Ordenações de Portugal, com naturalidade, a necessária influência da Igreja nos assuntos relacionados com o casamento. A Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas manteve a observância do Concílio de Trento e da Constituição do Arcebispado da Bahia, relativamente à constituição e indissolubilidade do matrimônio. Mesmo com a secularização, as bases e princípios absorvidos do Direito Canônico permaneceram impregnados na legislação, principalmente no que tange a sua indissolubilidade, ressalvado o chamado divórcio não vincular. Esse panorama se repete no Código Civil de 1916 e torna-se ainda mais agressiva quando as Constituições de 1934, 1937, 1946 e 1967 inserem em seu texto o princípio da indissolubilidade.1Contudo, a mesma sociedade aparentemente compreensiva e tolerante com a indissolubilidade legal, se mostrava subversiva no

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plano da realidade: os separados (mas ainda vinculados) buscavam na informalidade das relações não matrimonializadas a renovação de suas expectativas de vida comum. Vencia-se o esmorecimento que a esdrúxula situação legal produzia com uma criativa alternativa marginal: ao mesmo tempo eram vinculados a um casamento legal embora irreal no plano de fato, e, inseridos em uma nova relação ilegal, mas real no plano fático.

O dogmático e o político foram fissurados, com inevitável dor e sofrimento, pela Emenda Constitucional n. 09 de 28 de junho de 1977 que inseriu no ordenamento a possibilidade do divórcio vincular. Principiou-se a conformar realidade e direito, ao se permitir que pessoas casadas pudessem fazer cessar o vínculo conjugal e manterem-se dentro da legalidade em novas relações.

As novas possibilidades homenageavam a autonomia e autodeterminação das pessoas, mas ainda era insuficiente, porque o Estado continuava a exigir razões objetivas e prova da culpa atribuída a um dos consortes para o rompimento do casamento, em indevida...

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