A pessoa idosa em situação de risco social

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A PESSOA IDOSA EM SITUAÇÃO
DE RISCO SOCIAL
3.1 A VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA IDOSA
Tradicionalmente, a violência contra a pessoa idosa se materializa através de três
grandes grupos: a) a violência sociopolítica; b) a violência institucional; c) a violência
intrafamiliar. Dentro de cada um deles, enquadram-se formas especícas em sua ma-
nifestação, como a violência física, psicológica, patrimonial, sexual, medicamentosa,
além das hipóteses de abandono e negligência (e, até mesmo, a autonegligência).
Aliás, o próprio Estatuto da Pessoa Idosa detalha que “considera-se violência
contra a pessoa idosa qualquer ação ou omissão praticada em local público ou pri-
vado que lhe cause morte, dano ou sofrimento físico ou psicológico” (art. 19, § 1º).
No ponto, Larissa Tenfen aduz que “o Estatuto do Idoso trouxe importante instru-
mento para identicação da ocorrência das violências contra as gerações idosas por
meio da obrigatoriedade da noticação quando da ocorrência de maus-tratos, o que
auxilia na realização de diagnóstico situacional no país, ainda que a subnoticação
e subdiagnosticada seja um fato”.1
Nos próximos tópicos, cada um desses grupos de violência será analisado e, a
partir desse exame, será possível se identicar em qual contexto as formas especícas
se apresentam.
3.1.1 A violência sociopolítica
A violência sociopolítica é representada a partir da violência vivenciada no con-
texto social e político, de forma bastante abrangente, vinculada “às relações sociais
mais gerais que envolvem grupos e pessoas consideradas delinquentes e às estruturas
econômicas e políticas da desigualdade nas relações exclusão/exploração”.2 É o caso,
por exemplo, de uma série de estereótipos xados no pensamento social e reproduzi-
dos quase que inconscientemente por grande parte da população, que podem agravar
1. SILVA, Larissa Tenfen. Entre violetas e violências: em busca da proteção da pessoa idosa. Disponível em: https://
ibdfam.org.br/artigos/1478/+Entre+violetas+e+viol%C3%AAncias%3A+em+busca+da+prote%C3%A7%-
C3%A3o+da+pessoa+idosa++. Acesso em: 19 jan. 2023.
2. AR AÚJO, Ludgleydson Fernandes de; LOBO FILHO, Jorgeano Gregório. Análise psicossocial da violência
contra idosos. Psicologia: Reexão e Crítica, 22(1), 153-160. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/prc/
v22n1/20.pdf. Acesso em: 19 jan. 2023.
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DIREITO DAS FAMÍLIAS E DA PESSOA IDOSA • Patricia Novais calmoN
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sobremaneira a qualidade de vida desse segmento e, ainda, o seu pleno fruir dos seus
direitos fundamentais.
A própria (e, infelizmente, bastante comum) associação de idade avançada com
incapacidade para diversos atos de sua vida pode representar a perpetuação velada de
uma violência em face da pessoa idosa.3
Torna-se essencial, portanto, a quebra de tabus sobre o tema, principalmente com
uma maior conscientização da população a respeito do processo de envelhecimento,
a demonstrar que se trata de um fato natural e inerente ao tempo ao qual vivemos, em
que a população é muito mais ativa e longeva. Nesse sentido, aliás, a Política Nacional
do Idoso deve se reger pelo princípio que assenta que “o processo de envelhecimento
diz respeito à sociedade em geral, devendo ser objeto de conhecimento e informação
para todos” (art. 3º, III, PNI). Ademais, o Estatuto da Pessoa Idosa também determina
que serão inseridos conteúdos voltados ao processo de envelhecimento, ao respeito e à
valorização do idoso nos currículos mínimos dos diversos níveis de ensino formal, de
forma a eliminar o preconceito e a produzir conhecimentos sobre a matéria (art. 22, EPI).
Mas o viés sociopolítico vai além, já que abrange também a violência falada pela
mídia e noticiada em órgãos ociais como o Disque 100. Sob essa perspectiva, indireta-
mente, acabam por se enquadrar nesse grupo a violência institucional e a intrafamiliar
que são objeto de noticação aos órgãos ociais do governo. Justamente por isso, e, para
evitar qualquer tipo de confusão em relação a dados estatísticos, prefere-se estudar esse
tipo de violência como aquela implementada, fortalecida e perpetuada pela sociedade
através de discursos políticos e de denição de políticas públicas, seja não deferindo a
tutela adequada a esse segmento, seja criando discriminações negativas em razão da
idade.
Não se pode esquecer que em muitos casos será necessária a criação de distinções
positivas (ações armativas) a favor da pessoa idosa, para que, com isso, se atinja a ver-
dadeira igualdade (como o fomento à celebração de contratos de trabalho com pessoas
idosas, por exemplo).
Por m, pensa-se que poderá ocorrer a incidência da teoria do impacto adverso ou
desproporcional quando se estiver diante da violência sociopolítica, já que esta “ocorre
quando medidas públicas ou privadas que não são discriminatórias em sua origem nem
estão imbuídas de intuito discriminatório,4 “acabam por ensejar manifesto prejuízo,
3. É o caso, por exemplo, da tradicional “placa de idoso”, representada por uma pessoa encurvada e incapaz de se
locomover sem a ajuda de uma muleta. Por considerá-la pejorativa, o Projeto de Lei do Senado 126, de 2016
o uso de símbolos desprovidos de caráter pejorativo na identicação de pessoa com deciência e de idoso.
Explicação da Ementa: Desobriga a utilização do “Símbolo Universal de Acesso” em locais e serviços que são
utilizados por pessoas portadoras de deciência, e em seu lugar obriga a utilização de símbolos desprovidos
de caráter pejorativo.
4. MARTEL, Letícia de Campos Velho. Adaptação razoável: o novo conceito sob as lentes de uma gramática
constitucional inclusiva. Disponível em: https://core.ac.uk/download/pdf/16031666.pdf. Acesso em: 19 jan.
2023.
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