Poluição eletromagnética: telefonia celular, risco sanitário-ambiental e a incidência do princípio da precaução.

AutorRoberto Carlos Batista
Páginas11-43
POLUIÇÃO
ELETROMAGNÉTICA:
TELEFONIA
CELULAR,
RISCO
SANITARIO-AMBIENTAL
E A
INCIDÊNCIA
DO
PRINCÍPIO
DA
PRECAUÇÃO
ELETROMAGNET1C
POLLUTION:
CELLULAR TELEPHONY
SYSTEM,
ENVIRONMENTAL AND SANITARY RISKS AND THE
PRINCIPLE OF PRECA UTION
Roberto
Carlos
Batista^
RESUMO
A exposição humana a campos eletromagnéticos gerados por telefo-
nes celulares e estações rádios-base oferecem riscos à saúde pública e ao
meio ambiente. Embora a ciência aindao tenha dados e diagnósticos
conclusivos,
medidas de cautelam sendo adotadas em diversos países. O
caso é de aplicação do princípio da precaução para a proteção dos bens
jurídicos
envolvidos (ambiente e saúde); qualificados como direitos huma-
nos
e fundamentais.
Palavras-chave
Meio Ambiente; Poluição Eletromagnética; Princípio da Precaução;
Saúde Pública; Telefonia Celular.
ABSTRACT
Human exposition to the electromagnetic fields generated by cellular
telephones and radio stations offer risks to the public health and the environ-
ment. Although science has not conclusive diagnostics, countries have adop-
(*) Mestre em Direito e Estado, especialista em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável pela
Universidade
de Brasília (UNB), doutorando em Direito pela Paris
1
Pathéon Sorbonne, integrante de
seu Centre de Recherche en Droit des Sciences et Techniques,
titular
da
1
- Promotoria de Defesa
do
Meio Ambiente e Patrimonio Cultural do
Distrito
Federal. E-mail:robertoob@mpdft.gov.br. Recebido
em
7.8.06.
Aprovado em 14.9.06.
ting
measures of caution. This is a situation that requires the application of the
precaution principle in order to protect the legal rights (environmental and
health), qualified as human
rights.
Key words
Electromagnetic Pollution; Cellular Telephony; Public Health; Environ-
ment; Principle of Precaution.
1.
INTRODUÇÃO
A tecnologia e sua sofisticação seduzem
cada
vez mais o consumidor
com seus produtos e serviços; sempre associados à inovação, ao conforto,
ao bem-estar do homem pós-moderno. No entanto, os riscos que represen-
tam quase nuncao revelados,
apesar
de ameaçarem, muitas
vezes
bens
jurídicos
ligados diretamente à vida como a saúde e o meio ambiente. O caso
da telefonia celular é um exemplo marcante.
A partir dos anos 90, assiste-se no mundo todo um incremento substan-
cial
na aquisição de telefones móveis. Estima-se que, atualmente, cerca de
dois
bilhões de pessoas façam uso desse serviço, ou seja, quase um terço
da população mundial(1). E, dessa cifra, segundo divulgado recentemente
pela Agência Nacional de Telecomunicações
(ANATEL),
só no Brasil, no
final
dos de maio de
2006,
o número de acessos ao serviço totalizou
92.377.336(2).
As promoções e inúmeras propagandas acentuando as "van-
tagens" de um ou outro aparelho de pouco peso e dimensão, com determina-
da estética, com recursos de fotografia e filmagem, oferecidos por uma ou
outra operadora, instigaram no público certa compulsão pela aquisição e
uso de celulares. É comum a utilização de tais aparelhos até mesmo por
crianças menores, com idade inferior a 12 anos.
Apesar da utilidade dos serviços que, por vezes, chega a poupar vidas,
com a comunicação instantânea, efeitos deletérios devem ser avaliados, no
âmbito do ambiente e da saúde pública e, como conseqüência, medidas
assecuratóriaso de ser previstas em uma política pública integrada,
visando sempre à qualidade de vida da população.
A preocupação da sociedade
civil
consciente, da comunidade científica,
de alguns Estados e de organismos internacionais vem sendo recentemente
acentuada, diante da probabilidade de poluição eletromagnética ensejada pelo
(1) Segundo informação divulgada em matéria publicada
pela
Folha
on
line,
disponível em «http://
www1 .folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u18986.shtml». Acesso em
11.07.06.
(2) Disponível em: http://www.anatel.gov.br/biblioteca/releases/2006/release_19_06_2006mm.pdf. Aces-
so em
11.07.06.
(3) Conjunto das edificações (meio ambiente urbano) cujos padrões mínimos e harmoniao exigidos
para um equilíbrio paisagístico e
urbanístico,
que garantirão à população bem-estar, melhores condições
e qualidade de vida.
mecanismo de funcionamento dos celulares, bem como pelas chamadas
estações rádios-base
(ERBs),
um conjunto de antenas transmissoras e
receptoras estruturadas em torres, postes, suportes que recebem e emitem
sinais
através de ondas do
tipo
eletromagnética, para efetuar a comunicação
dos
aparelhos celulares. Seu funcionamento
dá-se
através de radiofreqüên-
cia ou microondas, que produzem uma radiação não-ionizante, ou seja,
aquela queo chega a provocar lesões ou desintegração físicas, poiso
tem a capacidade de romper com as moléculas de ADN, mas ensejam
aumento de temperatura, podendo afetar a saúde humana. Na faixa de tais
radiações, os campos eletromagnéticos
(CEM),
que variam de 0Hz a 300
kHz,o considerados de baixa freqüência (como é o caso das linhas de
transmissão
de eletricidade); aqueles que variam de 300 kHz a 300 GHzo
considerados
de alta freqüência (como é o caso das ERBs).
No que se refere às ERBs, nota-se que a poluição eletromagnética
manifesta-se tanto no ambiente natural, como no
artificial.(3)
Em face da maior
oferta dos serviços de telefonia móvel e a sua privatização, o mercado compe-
titivo
busca oferecer um alcance mais amplo de transmissão, com qualidade
superior.
Logo, as empresas, a
cada
dia, multiplicam o número de equipa-
mentos nas cidades, muitas
vezes
sem controle e de forma desordenada,
ficando
a população sujeita aos impactos e riscos muito graves. Embora
aindao cabalmente comprovada, a correlação com danos à saúde tem
mobilizado
as autoridades públicas e organismos internacionais a se ocupar
da questãoo relevante.
A primeira parte desse trabalho apresentará a problemática da poluição
eletromagnética oriunda das
ERBs
e telefones celulares (hoje objeto de
tantos
estudos e publicações). No primeiro momento, far-se-á um painel
do
tratamento do assunto na Europa, com
ênfase
na França. Já a segunda
parte, apreciará um caso concreto oriundo da atuação do Ministério Público
do
Distrito
Federal
e Territórios, que deu origem a uma
ação
judicial (mandado
de segurança coletivo, autos do Processo n.
2004002007932-3)
interposta
pela Associação Nacional das Operadoras de Celulares
(ACEL)
em face dos
Secretários de Estado do Distrito
Federal
de Coordenação das Administra-
ções Regionais e de Fiscalização das Atividades Urbanas, perante o Tribu-
nal de Justiça daquela Unidade da
Federação.
Verificar-se-á também a
inci-
dência do princípio da precaução no caso examinado.
2. O
CAMPO
ELETROMAGNÉTICO
E A
PREOCUPAÇÃO
DO
PÚBLICO
As ondas eletromagnéticas existem desde o surgimento do universo. A
sua forma mais comum é a luz; contudo, a exposição humana a tais ondas

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