Dos atos praticados pela pessoa jurídica com excesso de poderes e sua oponibilidade a terceiros - Um necessário cotejo entre a teoria ultra vires e a teoria da aparência

AutorDenis Donoso
CargoAdvogado em São Paulo Professor de Direito Civil e Processo Civil Especialista e mestrando em Processo Civil pela PUC/SP
Páginas18-19

Page 18

Pretendo, com este breve ensaio, tratar do polêmico e relevante assunto da validade dos atos praticados pela pessoa jurídica com excesso de poderes e sua validade em relação a terceiros.

Para tanto, traçarei resumidamente as posições existentes, propondo uma solução. Antes, contudo, falo das duas teorias existentes sobre o tema (ultra vires e aparência), porque concluirei pela mitigação de ambas.

De acordo com a chamada teoria ultra vires, construção doutrinária bem antiga, qualquer ato praticado em nome da pessoa jurídica, por seus sócios ou administradores, que ultrapassasse seus poderes, é nulo. Ao terceiro, caberia apenas mover ação contra aquele que extrapolou os limites sociais.

Em contraposição à teoria ultra vires, surgiu a teoria da aparência, mais modernamente, com caráter mais protetivo ao terceiro de boa-fé que contrata com a sociedade. Se o terceiro de boa-fé - tido por aquele que justificadamente desconhecia as limitações do objeto da sociedade ou de quem a "represente" - contrata com a sociedade, tem o direito de exigir o cumprimento da avença, ensejando à sociedade ação regressiva contra quem praticou o ato. Isto porque, aparentemente, aos olhos do terceiro de boa-fé, não há vícios no ato.

Como se vê, para a teoria ultra vires, o ato praticado fora dos poderes delimitados é nulo. Para a teoria da aparência, ao contrário, é válido e obriga a pessoa jurídica.

Qual teoria foi acolhida pelo ordenamento civil vigente? Para alguns, adotou-se a teoria ultra vires; para outros, permanece a teoria da aparência; por fim, há quem veja um sistema misto.

Esta resposta decorre, a meu ver, da análise sistemática de dois dispositivos: os artigos 47 e 1.015 do Código Civil. Resume-se em saber se eventual cláusula de limitação imposta ao administrador nos atos constitutivos da sociedade tem eficácia erga omnes ou limitada à relação da sociedade com o administrador.

Para a primeira parcela de entendimento, a interpretação do art. 47, a contrario sensu, pode revelar que o atual diploma civil adotou a teoria ultra vires, ao contrário do que se entendia quando vigorava o antigo Código Civil1 . Daí dizer-se que "quando o administrador exceder de suas prerrogativas, a pessoa jurídica isentar-se-á das conseqüências do ato de seu administrador que, nesses termos, responderá pessoalmente pelos atos praticados"2 .

Destarte, para esta primeira vertente, a cláusula limitativa de poderes teria eficácia erga omnes (desde que cumpridas as devidas...

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