Delação Premiada

AutorRenato Marcão
CargoMestre em Direito Penal, Político e Econômico Membro do Ministério Público do Estado de São Paulo Professor de Direito Penal, Processo e Execução Penal
Páginas18-19

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1. Introdução

O instituto da delação premiada, de evidente notoriedade nos dias atuais, não é produto de criação recente no ordenamento jurídico brasileiro, mesmo assim demorou até que o legislador pátrio se embrenhasse na regulamentação normativa, e quando assim passou a proceder, novamente se descuidou de certas cautelas das quais não poderia olvidar.

Embora a legislação esteja sujeita a críticas variadas, a intenção revelada é positiva, não obstante a só adoção da delação premiada já exponha o reconhecimento da incapacidade do Estado frente às mais variadas formas de ações criminosas, e demonstre a aceitação de sua ineficiência ao apurar ilícitos penais, notadamente os perpetrados por associações criminosas, grupos, organizações criminosas, quadrilha ou bando, alicerçados em complexidade organizacional não alcançada pelo próprio Estado.

Em si mesma, premiada ou não, a delação dá mostras de ausência de freios éticos; pode apresentar-se como verdadeira traição em busca de benefícios que satisfaçam necessidades próprias em detrimento do(s) delatado(s), conduta nada recomendável, tampouco digna de aplausos.

Em relação à delação premiada, o que se vê é seu surgimento quando há desajuste entre os envolvidos; quando um se sente prejudicado pela persecução penal (em sentido amplo) e desamparado pelo(s) comparsa(s). O desespero, a simples intenção de beneficiar-se, ou ambos, constitui o mote da delação. Não há qualquer interesse primário em colaborar com a Justiça; não há qualquer conversão do espírito e do caráter para o bem; não há preocupação com o que é realmente justo e verdadeiro; não há, enfim, motivo de relevante valor moral para a conduta egoísta. Porém, dela se vale o Estado na busca da verdade real; dela se utiliza a Justiça na busca de sua finalidade mediata: a paz social.

Além das questões éticas, outros problemas podem ser identificados, e dentre eles podemos citar, por exemplo, a possibilidade do instituto gerar a "acomodação", a apatia da autoridade incumbida da apuração, passando a contar Page 19com a possibilidade de delação, poderá deixar de dedicar-se com mais afinco na realização de seu ofício; é possível que a delação proporcione de forma proposital o desvio no rumo das investigações, ainda que temporário, porém, com reflexos negativos à apuração da verdade etc.

Com suas vantagens e desvantagens, a delação premiada vem sendo usada largamente, e muitas vezes com pouco ou nenhum critério técnico, tanto que se tem notícia de vários casos em que houve delação premiada, porém, nada ficou documentado visando à "segurança do delator", e exatamente por isso nada foi comunicado nos autos do processo criminal a que se vê submetido, apesar do êxito das...

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