O presente fugidio das crises constitucionais: uma interrogação acerca da questão concernindo a Modernidade da Constituição

AutorRicardo Martins Spindola Diniz
CargoDoutorando em Direito na Unidade de Pesquisa em Direito da Universidade de Luxemburgo. Mestre em Direito pela Universidade de Brasília. Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Goiás. E-mail: ricardo.spindola@uni.lu
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Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol.13, N.02, 2022, p.978-1015.
Ricardo Martins Spindola Diniz
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/51174| ISSN: 2179-8966
O presente fugidio das crises constitucionais: uma
interrogação acerca da questão concernindo a
Modernidade da Constituição
The escaping present of constitutional crises: an interrogation on the question
concerning the Modernity of the Constitution
Ricardo Martins Spindola Diniz1
1 Universidade de Luxemburgo, Esch-sur-Alzette, Luxemburgo. E-mail:
ricardo.spindola@uni.lu. ORCID: https://orcid.org/0000-0001-5127-5766.
Artigo recebido em 21/05/2020 e aceito em 19/12/2020.
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.
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Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol.13, N.02, 2022, p.978-1015.
Ricardo Martins Spindola Diniz
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/51174| ISSN: 2179-8966
Resumo
Denunciam-se crises constitucionais a todo o momento. Ainda que cada vez mais a
capacidade de mobilização popular desse conceito venha diminuindo, em que cada vez
menos pessoas se vejam dispostas a ir às ruas em defesa da Constituição em crise, o
conceito de crise retém, incontestavelmente, sua importância, tanto retórica como
historiográfica. Não obstante, uma teoria das crises constitucionais resta ausente. O
presente artigo se propõe a enfrentar essa ausência, interrogando-a tanto na literatura
dedicada ao conceito de crises constitucionais quanto questionando o sentido dessa
ausência em sua conexão com o conceito de Constituição ele próprio.
Palavras-Chave: Constituição; Soberania; Eternidade; Crise; Exceção.
Abstract
Constitutional crises are denounced now and then. Even if one notices a decrease in the
capacity of this concept to ignite popular mobilization, as there seems to be fewer
persons inclined to go to the streets in defense of the Constitution in crisis, the concept
of crisis retains, unquestionably, its importance, both rhetorically and
historiographically. Nevertheless, a theory of constitutional crises remains absent. The
present article proposes to confront this absence, interrogating the literature dedicated
to the concept of constitutional crises, on the one hand, and questioning the meaning of
this absence in its connection to the concept of the Constitution itself.
Keywords: Constitution; Sovereignty; Eternity; Crisis; Exception.
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Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol.13, N.02, 2022, p.978-1015.
Ricardo Martins Spindola Diniz
DOI: 10.1590/2179-8966/2020/51174| ISSN: 2179-8966
Introdução
Qual é o fundamento da supremacia da Constituição? Perguntar por tanto significa
interrogar a totalidade conjuntural do direito a partir de um dos seus conceitos
fundamentais. Outros textos normativos, como leis, portarias, decretos, e mesmo
decisões judiciais parecem ter sua interpretatividade pressuposta na condição de
serem letra morta, isto é, na ruptura entre a contingência de sua positivação e o
sentido da sua legitimidade. A interpretação dos textos constitucionais, ao contrário,
seja metodologicamente, seja como fundamento de sua especialidade, parece se
lançar insistentemente às origens daquilo que se interpreta. Para além da referência
mais imediata que essa indicação pode chamar, isto é, do recurso aos trabalhos da
constituinte para sustentar as interpretações projetadas a partir e em vista do texto
constitucional, mesmo que se afaste essa via "originalista", a supremacia da
Constituição, e as consequências daí advindas, pressupõe sua excepcionalidade. É só
por ser excepcional que, ao contrário de outras estruturas autoritativas, sua
interpretação prático-normativa precisa projetá-la como um texto vivo, no qual se
articula a permanência do evento ou momento do qual é ao mesmo tempo gramática e
memória.
Quer-se investigar as implicações compreensivas da modernidade da
Constituição e da sua normatividade, isto é, os fundamentos que vingam no fato da
forma constitucional aparecer como o único modo possível de se interpretar e realizar
o direito contemporaneamente. Poder-se-ia anotar, justamente, que a continuidade e
sucesso de um texto constitucional dependeriam do quão bem ele condiciona a
suspensão do imprevisível e encobre objetivamente as mudanças que inevitavelmente
acontecem à sua margem. Prova de tanto é o esforço exigido para se inscrever na sua
textualidade tempos e eventos outros sem que eles se vejam reduzidos ao
alargamento da sua fundação, à continuidade da sua eventualidade, um contrassenso,
sem dúvida, mas, como indicado, de todo efetivo e constitutivo do horizonte
tecnológico do direito moderno. A vigência da Constituição parece, portanto,
engendrar, de uma maneira muito peculiar, entre fundação e crise, a introjeção do
futuro no passado e a extensão do passado no futuro.
Colocar a modernidade da Constituição em questão, da perspectiva filosófica a
que ora se filia significa, portanto, interrogar o seu ser-todo, a totalidade da

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