O princípio do poluidor-pagador na jurisprudência do STF e do STJ: uma análise crítica

AutorDanielle de Andrade Moreira, Letícia Maria Rêgo Teixeira Lima, Izabel Freire Moreira
Páginas367-432
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Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.16 n.34 p.367-432 Janeiro/Abril de 2019
Danielle de Andrade Moreira
Doutora e Mestre em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Professora
adjunta da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, com atuação junto ao Programa de
Pós-Graduação em Direito e ao Núcleo Interdisciplinar de Meio Ambiente (NIMA/PUC-Rio). Coorde-
nadora do Grupo de Pesquisa Direito, Ambiente e Justiça no Antropoceno (JUMA) do NIMA/PUC-
Rio. Membro do Conselho Consultivo do NIMA/PUC-Rio. Coordenadora Acadêmica do Curso de
Pós-graduação lato sensu (nível especialização) em Direito Ambiental da PUC-Rio.
E-mail: daniamoreira@puc-rio.br
http://dx.doi.org/10.18623/rvd.v16i34.1341
Letícia Maria Rêgo Teixeira Lima
Mestranda em Teoria do Estado e Direito Constitucional pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro (PUC-Rio). Especialista em Direito Ambiental Brasileiro pela PUC-Rio. Bacharel em Di-
reito pela PUC-Rio. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Direito, Ambiente e Justiça no Antropoceno
(JUMA) do NIMA/PUC-Rio.
E-mail: leticialima.ambiental@gmail.com
Izabel Freire Moreira
Especialista em Direito Ambiental Brasileiro pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
(PUC-Rio). Bacharel em Direito pela PUC-Rio.
E-mail: izafreire.m@gmail.com
O PRINCÍPIO DO POLUIDOR-PAGADOR NA
JURISPRUDÊNCIA DO STF E DO STJ: UMA
ANÁLISE CRÍTICA1
RESUMO
O reconhecimento da importância e do potencial – muitas vezes subestimado
do princípio do poluidor-pagador tem o condão de fortalecer os diversos
instrumentos jurídico-ambientais dedicados a promover a distribuição
equitativa dos ônus e bônus socioambientais e a concretização do direito
fundamental ao meio ambiente equilibrado. Este texto reete a respeito
de pesquisa, desenvolvida em 2014 e atualizada em 2017 e 2018, sobre a
aplicação do princípio do poluidor-pagador pelo Supremo Tribunal Federal
(STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ). O principal objetivo foi o de
analisar criticamente como o referido princípio – consideradas sua origem
histórica, relevância e amplitude – tem incidido na jurisprudência relativa à
tutela jurídica do meio ambiente, tendo em vista a busca pela efetividade do
direito fundamental ao meio ambiente equilibrado. O estudo compreendeu
levantamento bibliográco e documental, acompanhado de catalogação
e análise crítica do material selecionado; a metodologia adotada incluiu
levantamento, sistematização e análise qualitativa de acórdãos julgados no
período de 1993 a 2018 no âmbito do STF e STJ. Foi possível observar que,
no que concerne à sua dimensão reparatória, o princípio do poluidor-pagador
tem cumprido importante papel no aperfeiçoamento da responsabilidade
1 A pesquisa foi nanciada pelo CNPq (bolsas de iniciação cientíca).
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civil ambiental, servindo de o condutor teórico para a solução de vários
dos desaos à reparação integral dos danos ambientais. Quanto à dimensão
preventiva do referido princípio, igualmente relevante para a melhor aplicação
de ferramentas que promovam a justiça distributiva em matéria ambiental,
de-se vericar sua signicativa subutilização.
Palavras-chave: Princípio do poluidor-pagador; externalidade ambiental
negativa; internalização de custos ambientais; prevenção e reparação de danos
ambientais; responsabilidade civil ambiental.
THE POLLUTER-PAYS PRINCIPLE IN THE BRAZILIAN SUPERIOR
COURTS: A CRITICAL ANALYSIS
ABSTRACT
The recognition of the importance and potential – often underestimated – of
the polluter-pays principle has the power to strengthen the various legal and
environmental instruments dedicated to promoting the equitable distribution
of socio-environmental burdens and bonuses and the realization of the
fundamental right to a balanced environment. This text reects a research,
developed in 2014 and updated in 2017 and 2018, on the application of the
polluter-pays principle by the Federal Supreme Court (STF) and Superior
Court of Justice (STJ) in Brazil. The main objective was to analyze critically
how this principle – considering its historical origin, relevance and extent
– has had an impact on the case law regarding the legal protection of the
environment, according to the search for the eectiveness of the fundamental
right to a balanced environment. The study comprised a bibliographical and
documentary survey, along with cataloging and critical analysis of the selected
material; the methodology included a survey, systematization and qualitative
analysis of decisions pronounced by the Courts in the period from 1993 to 2018
within the scope of STF and STJ. In relation to its reparatory dimension, it was
possible to observe that the polluter-pays principle has played an important
role in improving environmental civil liability, as a theoretical guideline for
the solution of several of the challenges to the full reparation of environmental
damages. As to the preventive dimension of this principle, which is equally
relevant for the better application of tools that promote distributive justice in
environmental matters, it was possible to verify its signicant underutilization.
Keywords: Polluter-pays principle; negative environmental externality;
internalization of environmental costs; prevention and remedying of
environmental damage; civil environmental liability.
Danielle de Andrade Moreira & Letícia Maria Rêgo Teixeira Lima & Izabel Freire Moreira
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INTRODUÇÃO
O processo de coletivização e despatrimonialização por que
passaram os ordenamentos jurídicos ao longo do século XX resultou em
signicativas mudanças nos objetivos e papeis representados pelo Direito,
que, para além de solucionar conitos, passou a ter como primordial função
a promoção da justiça social. A proteção constitucional do meio ambiente
é uma das expressões deste processo de expansão do conteúdo dos direitos
humanos. O direito ao meio ambiente é reconhecido como direito humano
e fundamental, de titularidade difusa e intergeracional. No âmbito dos
direitos humanos de terceira geração ou direitos fundamentais de terceira
dimensão, associa-se, como não poderia deixar de ser, a garantia do direito
à vida digna à manutenção do meio ambiente equilibrado. Evidente é,
portanto, a conotação existencial e coletiva deste direito, cuja construção
se dá a partir da reação da sociedade à crise ambiental.
O amadurecimento do sistema jurídico-ambiental, impulsionado
pela constitucionalização da proteção jurídica do meio ambiente, resulta
na constatação de que o Direito Ambiental, enquanto ramo autônomo do
Direito, tem como um de seus papeis essenciais a promoção da justiça
distributiva em matéria ambiental, tendo em vista a garantia da qualidade
de vida para as presentes e futuras gerações.
Neste contexto, ganha destaque o princípio do poluidor-
pagador (PPP), voltado para a internalização dos custos ambientais no
funcionamento de atividades potencialmente poluidoras. À luz deste
princípio, pretende-se que as externalidades ambientais negativas – ou, em
outras palavras, os custos ambientais externos – sejam computados como
custos de produção. A promoção da justiça distributiva ambiental depende
do reconhecimento de que cabe principalmente ao poluidor – ou potencial
poluidor – arcar com os custos preventivos e reparatórios decorrentes da
degradação ambiental por ele gerada ou que ele é capaz de gerar.
Reconhecida a importância e o potencial muitas vezes
subestimado – do princípio do poluidor-pagador como um dos alicerces
do Direito Ambiental, fortalecem-se os diversos instrumentos jurídico-
ambientais dedicados a promover a distribuição equitativa dos ônus e
bônus socioambientais, com o objetivo de concretizar o direito de todos ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, nos termos do artigo 225 da
Este texto apresenta os resultados de pesquisa desenvolvida em

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