A proibição da venda de animais de companhia em pet shops e na internet

AutorDéborah Lambach Ferreira da Costa, Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi
CargoDoutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Procuradora do Município de São Paulo aposentada. Professora do Curso de Graduação em Direito Civil. Grupo de pesquisa Biós ? Biodireito/Bioética/Biopolítica EMAIL: deborahlambach@gmail.com LATTES: http://lattes.cnpq.br/1002193677066082 ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3225...
Páginas36-55
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dor, volume 1 6 , n. 0 1 , p . 36- 5 4 , JAN ABR 2021
A proibição da venda de animais de companhia em
pet shops e na internet
THE PROHIBITION OF THE COMMERCIALIZATION OF COMPANION ANIMALS IN
PET SHOPS AND ON THE INTERNET
Recebido: 27.01.2021 Aprovado: 15.02.2021
Déborah Lambach Ferreira da Costa
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Ca-
tólica de São Paulo. Procuradora do Município de
São Paulo aposentada. Professora do Curso de Gra-
duação em Direito Civil. Grupo de pesquisa Biós
Biodireito/Bioética/Biopolítica
EMAIL: deborahlambach@gmail.com
LATTES: http://lattes.cnpq.br/1002193677066082
ORCID: http://orcid.org/0000-0002-3225-1731
Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi
Doutora em Direito pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo - PUCSP. Procuradora do
Estado de São Paulo aposentada. Coordenadora
acadêmica e professora do Curso de PósGradua-
ção Lato Sensu em Direito de Família e Sucessões
do COGEAE (PUCSP). Grupo de pesquisa Biós
Biodireito/Bioética/Biopolítica.
E-MAIL: hdaneluzzi@uol.com.br
LATTES: http://latts.cnpq.br/5103102878828449
RESUMO: O artigo trata da proteção dos animais de companhia na atualidade, com a proibição
da comercialização desses animais pelas chamadas pet shops e na internet, na esteira da evolução
do processo civilizatório, com a mudança de paradigma trazida pelos pensamentos filosóficos
e em decisão de vanguarda do STJ (RESP 1.797.175/SP), que admitiu a dimensão ecológica da
dignidade da pessoa humana e dignidade aos animais não-hu manos, reconhecendo aos
animais o status de sujeito de direitos, como seres sencientes e, por conseguinte, titulares de
interesses (quiçá direitos) que devem receber a proteção do ordenamento jurídico. Far-se
ainda uma incursã o na Lei Federa l 14.064/2020, bem como analisar-se-á o RESP 1.713.167-SP,
em que o Ministro Luis Felipe Salomão é enfático ao assinalar que a ordem jurídica o pode,
simplesmente, relegar a um plano secundário a relaçã o do homem com seu animal de
companhia, sobretudo nas relações familiares. A pesquisa bibliográfica e documental partiu de
um projeto de lei da cidade de Santos proibindo a venda de animais de companhia em pet shops,
(Lei Complementar n. 1051 de 9 de setembro de 2019), permitindo a análise dos dados coletados
pelo método dedutivo. Conclui-se que cada vez mais um consenso filosófico, social, cultural
e jurídico de que o animal precisa ter reconhecida a sua natureza de ser vivo sensível, ainda
mais os animais de companhia, integrantes das novas famílias (multiespécies), para que não
haja incongruência no regime jurdico dos animais no-humanos, que coisas não são.
PALAVRAS-CHAVE: Animais de companhia. Proibição de venda. Pet shops. Inte rnet.
ABSTRACT: This article discusses the protection of companion animals nowada ys, with the
ban on the commercialization of these animals by the so-called pet shops and on the internet,
in the wake of the evolution of the civilizing process, with the paradigm shift brought about by
the philosophical thoughts, in a vanguard decision by the STJ (RESP 1,797,175 / SP) that admit-
ted the ecological dimension of the dignity of the human person and dignity to non-human
animals, recognizing as the subject of rights, as they are sentient beings and, therefore, holders
of interests that should receive the protection of the legal system. Thus, there will also be an
incursion into Federal Law 14,064 / 2020), as well as the RESP 1.713.167-SP will be analyzed, in
which M inister Luis Felipe Salomão is emphatic in pointing out that the legal order cannot
simply relegate to a second ary level to relationship of man with his pet, especially in family
Déborah Lambach Ferreira da Costa e Maria Helena Marques Braceiro Daneluzzi
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relationships and nowadays. The bibliographic and documentary research sta rted from a bill
in the coastal city of Santos prohibiting the sale of companion animals in pet shops, (Comple-
mentary Law No. 1051 of September 9, 2019), allowing data analysis collected by the deductive
method. It is concluded that there is an increasing philosophical, social, cultura l and legal con-
sensus that animals must have recognized its nature as a living being sensitive, even more so
to companion animals, members of the new families (multi-species families ), so that there is no
inconsistency in the legal regime of non-human animals, which thing s are not.
KEYWORDS: Companion animals. The prohibition of commercialization. Pet shops. Internet.
1 Introdução
O presente artigo pretende discutir o impacto nas relações jurídicas proporcionado pela
mudança de paradigma trazida pelos pensamentos filosóficos ensaiados pelo ecocentrismo e pelo
biocentrismo e a proteção que é dada aos animais de companhia na atualidade, com o
reconhecimento de sua importância intrínseca, como membro da família, nas chamadas famílias
multiespécies e não mais como peças de mobiliário.1
A questão proposta, nessa linha de raciocínio, se circunscreve à proibição de
comercialização dos animais de companhia em pet shops e na internet, tendo como ponto de
partida a Lei Complementar n. 1051 de 9 de setembro de 2019 do Município de Santos,,2 no Estado
de São Paulo, que inaugurou, sem dúvida, a discussão de quanto se avançou no cuidado e bem-
estar dos animais de companhia. Em geral, o foco está na relação comercial entre comprador e
vendedor, seja em lojas ou em canis especializados, que reger-se-ia pelas normas do Código Civil
e Código do Consumidor, e não no animal por si só, justamente por serem protegidos de forma
indireta pela legislação infraconstitucional e por uma interpretação antropocentrista da
Constituição Federal (artigo 225 CF), que merece ser alargada, na dimensão ética da convivência
entre o homem e seu animal de companhia.3
Peter Wohlleben é otimista e entende que houve um grande avanço na relação histórica
entre homens e animais e isso se porque, cada vez mais, temos atribuído emoções aos animais
e, com isso, direitos. E o animal de companhia não pode mais ser simplesmente considerado como
repositório desse afeto e ser tratado como bem, na visão dualista do Código Civil.4
No desenvolver do pensamento aqui exposto, far-se uma rápida incursão na
Constituição Federal, inclusive nos princípios por ela trazidos na proteção ao meio ambiente e no
histórico do tratamento dos animais de companhia na Idade Média, passando-se pelas
transformações advindas com o afastamento do pensamento antropocentrista e com a
preocupação de cuidado com o centro da vida e do meio ambiente, tanto na legislação
infraconstitucional, com a Lei Sansão (Lei 14.064/2020) como na jurisprudência (RESP
1.797.175/SP e RESP 1.713.167-SP).
Por certo, a Convenção Europeia para a Proteção dos Animais de Companhia, aberta à
assinatura dos Estados membros do Conselho da Europa, em 13 de novembro de 1987, é um
marco histórico no reconhecimento de que o homem tem uma obrigação moral de respeitar todas
as criaturas vivas e da importância que os animais de companhia tem em virtude da sua
contribuição à qualidade de vida e, portanto, de seu valor para a sociedade. Além de conceituar o
animal de companhia, o que se verá adiante, traz diretivas de tratamento ao animal que garantam
a sua saúde e seu bem-estar.

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