Quadros, Goulart e a política externa independente: a consolidação do autonomismo na política externa

AutorMariana Bernussi e Rodrigo Amaral
Páginas173-188
173
Capítulo 10
QUADROS, GOULART E A POLÍTICA EXTERNA
INDEPENDENTE: A CONSOLIDAÇÃO DO
AUTONOMISMO NA POLÍTICA EXTERNA
Mariana Bernussi1
Rodrigo Amaral2
Introdução
A transição para a década de 1960 marca a consolidação de
um projeto de Política Externa Independente (PEI). A literatura
sobre a política externa brasileira (MOURA, 1980; 2012; BUENO,
2008; VISENTINI, 2013; SILVA, 1995; ALTEMANI, 2005;
FONSECA, 1998; PINHEIRO, 2010) aponta que se trata de uma
virada de paradigma estrutural do comportamento internacional
brasileiro. A vocalização crítica acerca da tradicional política
externa brasileira (PEB) até então era evidente em acadêmicos da
1 Doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais San Tiago
Dantas - UNESP, UNICAMP, PUC-SP. Mestre e graduada em Relações
Internacionais pelo IRI-USP. Professora de Relações Internacionais no IBMEC-
SP. Pesquisadora do Núcleo de Estudos Transnacionais de Segurança
(NETS/PUCSP) e do Grupo de Estudos Sobre Conflitos Internacionais
(GECI/PUC-SP). E-mail: maria na.medebernussi@professores.ibmec.edu.br
2 Doutor e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais
San Tiago Dan tas - UNESP, UNICAMP, PUC-SP. Graduado em Relações
Internacionais pela PUC-SP. Professor de Relações I nternacionais na PUC-SP,
Coordenador do Grupo de Trabalho Oriente Médio e Norte da África do Conselho
Latino-Americano de Ciências Sociais (CLACSO) e pesquisador do Grupo de
Estudos Sobre Conflitos Internacionais (GECI/PUC-SP). E-mail:
rada mara l@pucsp.br
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CEPAL3 e do ISEB4, como Helio Jaguaribe (2013), que narrava a
subserviência brasileira sob a roupagem de desenvolvimento
associado tipicamente marcada na política exterior do país desde Rio
Branco como um problema estrutural brasileiro. Basicamente, o
argumento era que o Brasil jamais conseguiria encontrar uma
posição autônoma e de real desenvolvimento se não buscasse
mecanismos que o desassociassem das amarras dominantes do
capital estrangeiro e das potências internacionais.
É possível interpretar que a PEI institucionaliza e transforma
essa ambição autonomista e globalista em um projeto de política
exterior. Ela foi implementada entre 1961 e 1964, durante a
administração de Jânio Quadros da União Democrática Nacional
(UDN) - presidente controverso, com perfil conservador na política
interna, mas explicitamente favorável à implementação de um
projeto autonomista internacionalmente (QUADROS, 1961) - e
continuou com o presidente João Goulart, do Partido Trabalhista
Brasileiro (PTB), sucessor direto de Quadros após sua renúncia em
25 de agosto de 1961.
A primeira metade dos anos 1960 foi um período marcado
pela busca por uma política externa mais autônoma em relação aos
Estados Unidos da América (EUA) e ao “primeiro mundo” de
maneira geral. A PEI é precedida e sucedida por momentos de
alinhamento automático aos EUA, ou o que outros chamam de
desenvolvimento associado. Mas mais do que isso, representa um
ponto de inflexão na história das relações internacionais do Brasil,
inaugurando um estilo de política externa mundial e multilateral.
Justamente o golpe militar de 1964 encerra de maneira brusca
esta política. No entanto, suas premissas autonomistas e
3 Comissão Econômica para a América Latina criada em 1948 no âmbito do
Conselho Econômico e Social da ONU.
4 Instituto Superior de Estudos Brasileiros, órgão público de pesquisa e
desenvolvimento criado em 1 955, foi presidido pelo próprio Hélio Jaguaribe,
elaborava teses nacionais-desenvolvimentistas que pretendiam superar a condição
de dependência do Brasil aos EUA.

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