Resistência do Direito à Tecnologia: uma análise teubniana de comunicação e regulação

AutorEduarda Moraes Chacon
CargoAdvogada. Membro do IBRADEMP, ABDTIC e AASP. Graduada em Direito pela UFRN. Pós-Graduada em Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas e em Relações Internacionais pela UnB. Email: eduardachacon.adv@gmail.com.
Páginas67-102
Resistência do Direito à Tecnologia (p. 67-102) 67
CHACON, E. M.
Resistência do Direito à Tecnologi a: um problema teubniano de comunicação e regulação
.
The Law,
State and Te lecommunications Re view
, Brasilia, v. 10, n. 2, p. 67-102, October 2018. [DOI:
https://doi.org/10.26512/lstr.v10i2.21494]
Resistência do Direito à Tecnologia: uma análise teubniana de
comunicação e regulação
Resistance of the Law to Technology: A Teubnian Analysis of Communication
and Regulation
Submetid o(
submitted
): 07/12/20 17
Eduarda Moraes Chacon*
Parecer(
revised
): 09/01/ 2018
Aceito(
accepted
): 07/03/2 018
Abstract
Purpose
The a rticle aims to confirm if there is resistance of the Law to Technology in order to
admit the protagonism achieved by the second in th e last year s and to adjust the first to this new
reality. Once confirmed the hypothesis, the purpose is to discuss how to overcome this resistance.
Methodology/approach/design
Review the works of Gunther Teubner, especia lly The Law a s an
Autopoietic System, in order to include Technology a s a second-degr ee system, the sa me way that
are Law, Economics and Politics.
Findings
Once is confirmed that the Technology was elevated to the ca tegory of a second-degree
subsystem, the logic of the intera ction between the other subsystems of the same cla ssification will
change and it will be demanded from Law the recognition of the new dynamics and its adjustment as
to viabilize the communication as a mechanism of pre-regulation between itself and the Technology.
Practical implications
Given the confirmation of the hypothesis and the fact that the Law is not yet
able to interna lize a version of reality that includes the Technology in an effective way, the text
explores in what ways this scenar io can be changed so that lawyers and la w enforcers will acquir e
the grammar they need, being no longer technologica l-illiterates.
Originality/value
This ar ticle is origina l because it reviews Teubner's work on systems to a dd a
new subsystem, Technology, while discusses the consequences of this change to the legal subsystem.
Keywords: la w, technology, Teubner, communication, grammar.
Resumo
Propósito
O artigo objetiva confirmar se há resistência do direito em relação à tecnologia no sentido
de admitir o protagonismo alcançado pela segunda nos últimos anos e se ajustar a esta nova realidade.
Verificada a hipótese, o propósito será debater como superar essa resistência.
Metodologia/a bordagem/design
Revisão das obras de Gunther Teubner, especialmente o direito
como sistema autopoiético, para inclusão da tecnologia como sistema de segundo grau equiparado a
direito, economia e política.
Resultados
Desde que a tecnologia foi alçada a categoria de subsistema de segundo grau, alterou-
se a lógica da interação entre os subsistemas de mesma classificação e passou a demandar-se do
direito que se ajustasse e reconhecesse a nova d inâmica para viabilizar a comunicação como
mecanismo de pré-regulação entre ele e a tecnologia.
Implicações prá ticas
Diante da confirmação da hipótese e da constatação de que o direito não está
conseguindo internalizar eficazmente uma versão de realidade que inclua a tecnologia, o texto explora
*
Advogada. Me mbro do IBRADEMP, A BDTIC e AASP. Graduada em Direito pela
UFRN. Pós-Graduada em Direit o Empresarial pela Fu ndação Getúlio Vargas e em
Relações Inter nacionais pela UnB. Emai l: eduardachacon.adv@gmail.com.
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State and Te lecommunications Re view
, Brasilia, v. 10, n. 2, p. 67-102, October 2018. [DOI:
https://doi.org/10.26512/lstr.v10i2.21494]
de que maneiras este cenário pode ser alterado para que os juristas e aplicadores do direito adquiram
a gramática de que necessitam, deixando de ser tecnológico-iliteratos.
Originalidade/ relevância
Este artigo é original porque revisita a o bra de Teubner sobre sistemas
para adicionar um novo subsistema, a tecnologia, e debater quais as consequências desta alteração
em relação ao subsistema jurídico.
Palavras-chave: direito, tecnologia, Teubner, comunicação, gramática
Introdução
O trabalho parte da assunção d e que a resistência do Direito à Tecnologia
se origina em um dilema Teubniano de comunicação e regulação.
Tendo a tecnologia sido promovida a sistema social de segundo grau, ao
lado do Direito, da Economia e da Política, o processo de acoplamento estrutural
se conturbou porque encontrou os últimos ainda sem instrumental linguístico, que
é a primeira fase da interação entre sistemas.
A solução para esta instabilidade depende de os juristas e aplicadores do
direito se abrirem ao sistema T ecnologia e começarem a compatibilizar a
realidade tecnológica com a realidade jurídica.
Ocorre que o jurista se encontra, atualmente, como um a nalfabeto
tecnológico. Se o Direito não compreende a linguagem tecnológica, como será
possível que apreenda uma versão da realidade so cial que é a tradução da
realidade tecnológica?
Com vistas a solucionar este p roblema, o primeiro capítulo do artigo
retrará a chamada questão do WhatsApp, episódios de suspensão dos ser viços do
aplicativo, para ilustrar na prática de que maneira o aplicador do direito,
tecnológico-iliterato, reflete no mundo real a resistência do Direito quanto à
Tecnologia.
Para assimilar o porquê desta resistência do Direito à Tecnologia, recorrer-
se-á à Teoria do Direito como Sistema Autopoiético de Gunther Teubner e se
procurará estabelecer primeiramente que a Tecnologia é um sistema de segundo
grau, hierarquica mente equiparado ao Direito, à Economia e à Política. Daí se
buscará perceber como os sistemas se relacionam com os respectivos meios
envolventes próprios e mútuos e como evoluem a partir desta interação.
Deste p onto em dia nte, objetivar-se-á absorver o papel da regulação na
teoria Teubniana para, enfim, iniciar a análise da relação entre o sistema Direito
e o sistema Tecnologia como resultado de autorregulação, regulação mútua e
evolução.
A partir do entendimento a respeito das razões que justificam a resistência
do Direito à Tecnologia, sugerir-se-á um plano de conciliação com algumas
demonstrações práticas de execução.
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Resistência do Direito à Tecnologi a: um problema teubniano de comunicação e regulação
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State and Te lecommunications Re view
, Brasilia, v. 10, n. 2, p. 67-102, October 2018. [DOI:
https://doi.org/10.26512/lstr.v10i2.21494]
A Questão do WhatsApp: um grande mal-entendido
A questão do WhatsApp (a ser desenvolvida neste capítulo) não deveria existir.
O que originou o equívoco foram ordens judiciais de suspensão do Over The
Top Service (OTT) decorridas da falta de compreensão por magistrados a respeito de
tecnicidades que regulam o funcionamento do aplicativo.1
Como se verá em maiores detalhes, a Tecnologia funciona de forma binária,
trabalhando com possibilidades e impossibilidades técnicas insuperáveis.
Desse modo, quando uma decisão judicial desafia o determinismo tecnológico
exigindo que programa execute um comando impossível, conclui-se que o autor da
ordem não possui conhecimento técnico suficiente para arbitrar o conflito entre a
aparente vontade da lei e o escopo da tecnologia.
A suposta violação do comando legal no caso do WhatsApp, que resultou em
punição equivalente à suspensão do serviço, reflete um vício de comunicação entre
Direito e Tecnologia e deste episódio decorreu uma enorme comoção social
justificada, a princípio, pelo repúdio da sociedade à interferência do Judiciário o que
significa que o sistema legal não está conseguindo apreender de forma clara as
mensagens do sistema social.
Aproveitando o ensejo a respeito da citada indignação social, as empresas de
tecnologia capitanearam um movimento junto a organizações jurídicas e sociais para
solicitar a interferência do Supremo Tribunal Federal (STF) na questão, alterando por
judicial o Marco Civil da Internet de forma que jamais um OTT possa ser novamente
suspenso ou bloqueado, não importa que circunstância fáticas se façam presentes no
caso concreto.
Se a suspensão do WhatsApp nos casos que originaram as ações em trâmite no
STF foi infeliz, a disposição legal que autoriza tais providências, contida no artigo 12
da Lei nº 12.965/14, não é absurda, mas tem potencial de se provar cautela
indispensável em outras oportunidades.
A ignorância do meio jurídico, generalizando o problema para os fins deste
trabalho, está oportunizando que um equívoco judicial se torne subterfúgio para o
ativismo judicial desacertado. Ao invés de bloquear disposições legislativas (por meio
de demandas judiciais) para impedir que futuros enganos ocorram pela extinção da
ferramenta jurídica, o correto seria aprimorar a gramática jurídica para que os
operadores do Direito pudessem fazer uso correto dessas mesmas ferramentas.
1
Para o s fins deste trabal ho, em consideraçã o ao conceito de deniable encr yption,
considerar-se-á como verdadeir a a alegação do WhatsApp de qu e já havia criptografia de
ponta-a-ponta no seu sistema à época das ordens judiciais.

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