O respeito a autonomia da vontade do paciente com transtorno mental e de comportamento

AutorAline Naiade da Silva Alves
Páginas263-288
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O RESPEITO A AUTONOMIA DA VONTADE DO
PACIENTE COM TRANSTORNO MENTAL E DE
COMPORTAMENTO
Aline Naiade da Silva Alves
Sumário: 1. Introdução. 2. Da invisibilidade ao modelo social: modelo de
prescindência, modelo médico ou reabilitador, e modelo social. 3. O
tratamento conferido a pessoa com transtorno mental e/ou de
comportamento no ordenamento jurídico brasileiro. 3.1. A incapacidade na
legislação brasileira. 3.2. O advento do estatuto da pessoa com deficiência
e seu reflexo no instituto da incapacidade. 4. Autonomia da vontade do
paciente. 4.1. Um breve histórico da relação médico-paciente. 4.2. O
respeito a autonomia da vontade do paciente. 5. Contornos para uma
efetiva proteção da pessoa com deficiência. 6. Considerações finais.
1. Introdução
As pessoas com deficiência mental ou intelectual sempre
despertaram a curiosidade e o medo das pessoas. A preocupação com os
transtornos mentais e de comportamento ao longo da história não se
limitava à ciência médica, em verdade, é um tema muito recorrente na
religião, no direito e, sobretudo, no imaginário popular.
Ao longo da existência humana as pessoas com transtornos foram
objeto de políticas públicas de caráter paternalista e assistencialista. Desse
modo, no ordenamento jurídico brasileiro, desde as Ordenações Filipinas,
estabeleceu-se a curadoria dos então denominados “mentecaptos” para os
atos da vida civil. Posteriormente o Código Civil de 1916 consagrou a
teoria das incapacidades, de modo a extirpar por completo a
autodeterminação dos “loucos de todo gênero”. A redação original do
Código Civil de 2002 abrandou a discriminatória qualificação, todavia
manteve a incapacidade absoluta para pessoas com “enfermidade ou
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deficiência mental”, que não possuam discernimento para a prática dos atos
da vida civil.
É com a internalização, com status supralegal, da Convenção sobre
os Direitos das Pessoas com Deficiência e posteriormente o advento do
Estatuto da Pessoa com Deficiência que o vetusto instituto das
incapacidades sofreu profundas alterações. A pessoa com deficiência não
mais se inclui entre o rol dos absolutamente incapazes de exercício dos
direitos desde a internalização da Convenção, mas é com a Lei
13.105/2015 que essa derrogação se tornou explícita.
Com a profunda mudança de paradigma que a Convenção e o
Estatuto trouxeram para o ordenamento jurídico brasileiro, sobretudo os
assuntos que cercam o direito civil, restam questionamentos acerca da
autonomia da vontade dos pacientes com transtornos mentais e/ou de
comportamento.
No presente trabalho, propõe-se a discussão de contornos, acerca
da autonomia da vontade, a fim de aplicar a ponderação para garantir uma
efetiva promoção da autodeterminação das pessoas com transtornos
mentais e de comportamento, sem deixar de lado a efetiva proteção
daqueles que demandam uma maior tutela por parte do Estado.
2. Da invisibilidade ao modelo social: modelo de prescindência,
modelo médico ou reabilitador e modelo social
A cultura, o momento histórico e a sociedade são fatores
fundamentais para designar as características de um determinado povo e os
parâmetros que o orienta. O trato ofertado às pessoas com deficiência
também se submete a esses fatores, o que gera diferentes tipos de
tratamentos destinados a elas ao longo da história da humanidade até o
advento do que se denomina como “modelo social”, o qual encontra na
Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, bem
como no seu protocolo facultativo a sua maior expressão.
O filme “300”, dirigido por Zack Snyder, retrata a batal ha de
Termópilas, durante as Guerras Médicas entre gregos e persas, no ano de
480 A.C. período Clássico. O filme sugere que os espartanos só foram
definitivamente abatidos em razão da traição de Efialtes, um homem com
-formação e que tinha o sonho de servir ao exército espartano. Ele
indicou ao exército de Xerxes uma trilha em Amôpaia, a qual serviu para

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