Responsabilidade socioambiental das usinas sucroalcooleiras da região do Triângulo Mineiro

AutorLucas de Souza Lehfeld - Cristina Veloso de Castro
CargoDoutor pela PUC/SP, Professor da UEMG ? Universidade do Estado de Minas Gerais- CampusFrutal - Mestre pela Unaerp, Coordenadora do Curso de Direito da UEMG ? Universidade do Estado de Minas Gerais
Páginas10-36
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL DAS USINAS SUCROA LCOOLEIRAS DA
REGIÃO DO TRIÂNGULO MINEIRO
THE ENVIRONMENTAL RESPONSIBILITY OF THE SUGAR-ALCOHOL MILSS IN THE TRIÂNGULO
MINEIRO REGION
Lucas de Souza Lehfeld1
Cristina Veloso de Castro2
Sumário: Introdução; 1 Principais impactos das usinas sucroalcooleiras; 2 Da proteção
constitucional do meio ambiente; 2.1 Do direito ambiental como interesse d ifuso; 2.2 Princípios
constitucionais do direito ambiental; 3 Responsabilidade socioambiental das indústrias sucroalcooleiras
do Triângulo Mineiro; 3.1 Da responsabilidade civil; 3.2 Da responsabilidade socioambiental; 3.3 Da
responsabilidade socioambiental decorrente dos impactos da indústria sucroalcooleira; C onclusão;
Referências.
Palavras-chave: socioambientalismo; responsabilidade socioambiental; impacto ambiental;
direito ambiental.
Introdução
As usinas sucroalcooleiras são importantes agentes de promoção do desenvolvimento econômico
de um país, assim como de seu avanço tecnológico. Estas possuem grande capacidade criadora e de
geração de recursos, num contexto onde o bem-estar comum depende cada vez mais de uma ação
cooperativa e integrada de todos os setores da economia e que faz p arte de um processo de
desenvolvimento que tem por objetivo a preservação do meio ambiente e a promoção do s direitos
humanos.
O conceito de responsabilidade socioambiental é bastante amplo, referindo-se à ética como
principal balizadora das ações e das relações com os diversos segmentos, com os quais as empresas
interagem: acio nistas, funcionários, consumidores, r ede de fornecedores, meio ambiente, governo,
mercado e comunidade.
Assim, a q uestão da responsabilidade social empresarial e ambiental diz respeito à postura legal
da sociedade empresária, à prática filantrópica por ela exercid a ou ao apoio dado à comunidade,
significando, dessa forma, uma mudança de atitude voltada para uma perspectiva de gestão empresarial
com foco na qualidade dessas relações e na geração de valores para todos.
Ao adicionar às suas competências básicas um comportame nto ético e socialmente responsável,
as sociedades empresárias adquirem o respeito das pessoas e comunidades que sofreram o impacto de
suas atividades, sendo assim gratificadas com o reconhecimento por parte de seus consumidores e com o
engajamento de seus colaboradores, fatores esses cruciais para conquistar vantagem competitiva e s ucesso
empresarial. Conjuntamente, a r esponsabilidade empresarial como estratégia de gestão contribui para a
construção de uma sociedade mais justa, próspera e onde a pr eservação ambiental é, acima de tudo, um
dever de todos.
Dessa forma, a discussão sobre r esponsabilidade empresarial diante do meio ambiente centraliza-
se na anál ise de como as sociedad es empresárias interagem com o meio em que elas habitam e prat icam
suas atividades. Tal atuação, seja esta r esponsável ou não, é que irá definir a tomada de decisões por parte
da referida sociedade empresária, a definição de sua estratégia de gestão, se esta irá res peitar ou não a
legislação ambiental vigente e quais os ganhos e perdas daí advindos como, por exemplo, perda de
competitividade e mercado externo.
Assim, a inte nção presente neste trabalho é mostrar de que forma a manutenção de u ma política
de responsabilidade socioambiental é vantajosa para as sociedades empresárias como um todo, pois, na
medida em que, para a sociedade esta política garante a preservação ambiental, a melhoria da qualidade
de vida, redução dos efeitos das mudanças climáticas globais, para as empresas possibilita novas
oportunidades de negócios, um mar keting social bastante favorável e ganhos de competitividade por meio
de certificação ambiental que as diferenciarão positivamente de suas concor rentes, resultando em maior
lucratividade.
1 Doutor pela PUC/SP, Professor da UEMG Universidade do Estado de Minas Gerais- CampusFrutal.
2 Mestre pela Unaerp, Coordenadora do Curso de Direito da UEMG Universidade do Estado de Minas Gerais.
Outro fator importante relaciona-se as implicações ambientais da expansão da atividade
canavieira, uma vez que há a necessidade do uso intensivo do s recursos naturais por meio de práticas
modernas da agricultura.
1 Principais impactos socioambientais da indústria sucroalcooleira
No setor sucroalcooleiro, vários são os impactos socioambientais a serem discutidos,
principalmente na região do Triângulo Mineiro aonde uma grande concentração de Usinas
Sucroalcooleiras.
O que se deve destacar ao longo da histór ia de formação desse setor, além do longo período de
intervenções, é a busca pelo aumento da produção de açúcar e posteriormente de álcool combustível. Essa
expansão, que variou de acelerada a moderada co nforme vários autores, não foi a mbientalmente
sustentável uma vez que buscava o aumento da produção a partir da introdução da cultura em novas áreas
de plantio, e nem sempre através de um aumento da pro dutividade da lavoura, ou da injeção de tecnologia
nos processos produtivos de fabricação de açúcar e álcool.
Porém, vários o utros problemas ambientais se agravaram principalmente o interior paulista e
Triângulo Mineiro, onde se localizam as principais usinas canavieiras do país. Dentre esses problemas
pode-se destacar: o assoreamento dos rios causado pela erosão e pela ocupação agrícola de áreas
geograficamente não adequadas; a compactação dos solos ocasionada pela i ntensificação da mecanização
nas lavouras; a destruição de reservas de matas nativas e ciliares para ampliação das lavouras; o aumento
das emissões de CO2; a eliminação de micronutrientes e da mesofauna a partir das queimadas;
contaminação de cursos d’água na lixiviação de pesticidas e fertilizantes; o aumento da produção de
subprodutos agroindustriais como a vinhaça, a torta de filtro e o bagaço.
Contudo, a preocupação com a questão ambiental não recebeu a mesma preocupação que o
aumento de produção, fatores essenciais para um desenvolvimento sustentável da agricultura canavieira
nunca foram levados em conta, e e mbora seja indiscutível o avanço ambiental trazido pela substituição de
parte do combustível fóssil por álcool, principalmente nos grandes centros urbanos, não se po de dizer o
mesmo dos impactos ecológicos de seu processo produtivo. A ampliação dos canaviais para a produção
de álcool acar retou na intensificação de pelo menos dois grandes problemas ambientais: 1) a degradação
de ecossistemas e a poluição atmosférica acusada pelas queimadas e, 2) a poluição de cursos d’água e do
lençol freático causado pela aplicação excessiva da vinhaça in natura3.
Os resíduos podem trazer inúmeros prob lemas socioambientais, como também alguns benefícios, da
seguinte forma:
A vinhaça é o principal subproduto da agroindústria canavieira por ser um efluente altamente
poluidor e apresentar-se em grande volume, dificultando seu transporte e eliminação. É um produto
resultante da destilação e fermentação da cana de açúcar no processo de fabricação de álcool, também
pode originar-se como subproduto da produção de açúcar sendo eli minada no proce sso de cristalização do
caldo da cana. No geral a vinhaça é rica em matéria orgânica e em nutrientes minerais co mo o potássio
(K), o cálcio (Ca) e o enxofre (S), e possui uma concentração hidrogeniônica ( pH) variando entre 3,7 e
5,0.4
A produção de vinhaça5 varia em função dos diferentes processos empregados na fabricação do
álcool, de maneira geral cada litro de álcool produzido em uma destilaria gera entre 10 e 15 litros de
vinhaça. Uma ap arente solução para o descarte racional na vinhaça é o que atualmente chama-se de
fertirrigação, ou sej a, a utilização desse prod uto rico em matéria orgânica aplicada in natura em ár eas de
plantio de cana.
A preocupação com o impacto ambiental da disposição da vinhaça nos cursos d’água é recente,
apenas em fevereiro 1967 no governo Jânio Quadro s o Decreto Lei n. 303 proibia a disposição de vinhaça
in natur a nos rios, lagos e baixios, busca ndo evitar a poluição das águas e do meio ambiente. Em 1976, o
governo de São Paulo expediu a Lei Estadual n. 997 e o Decreto n. 8468 instituindo o Sistema de
3 SZMRECSÁNYI, T. Tecnologia e degradação ambiental: o caso da agroindústria canavieira no Estado de São Paulo. Revista
Informações Econômicas. São Paulo, v. 24, n. 10, out./1994, p. 73-74.
4 LUDOVICE, M. T. Estudo do efeito poluente da vinhaça infiltrada em canal condutor de terra sobre o lençol freático.
Campinas, FEC-UNICAMP. Dissertação de Mestrado, 1996, p. 5-6.
5 CORTEZ et. a l. (1992, p. 13) coloca a proporção d e 1 litro de álcool para uma variação de 10 a 15 de vinhaça. SZMRECSÁNYI
(1994, p. 73) aponta para 10 ou mais litros de vinhaça para cada 1 litro de álcool. LUDOVICE (1996, p. 10) indica uma proporção
de 13 litros de vinhaça para cada litro de álcool.

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