Responsablidade civil do estado nos acidentes automobílbttcos causados porburaco, valeta ou desnivelamento da rodovia

Autor1.Northon Motta - 2.Janete Rosa Martins
Cargo1. Aluno da graduação e pós-graduação da URI, membro do Projeto de Extensão Mediação como forma de inclusão social. - 2. Mestre em Direito pela UNISC - Universidade de Santa Cruz do Sul, professora da graduação e da pós-graduação da URI
Páginas122-143

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Considerações iniciais

A responsabilidade civil do Estado vem tomando repercussão na população e nos tribunais pelas decisões tomadas pelos agentes políticos ao priorizar em certas áreas a aplicação do capital estatal. Diante de todos os direitos e deveres garantidos à população pela Carta Constitucional de 1988 e legislação ordinária, encontra-se o direito de o usuário das rodovias e estradas do Brasil um trafegar tranqüilo e seguro, mas, analisando-se as estatísticas, não é o que o Estado proporciona aos cidadãos.

Portanto, qual o alcance da responsabilidade civil do Estado em acidentes automobilísticos, pela má conservação das rodovias?

Tendo por base o §2° do art. Io do Código de Trânsito Brasileiro, "O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito", e no §6° do art. 37 da Constituição Federal, "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danosPage 123que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa", será traçado no presente trabalho quando a administração pública terá que indenizar o particular pelos danos causados ao se omitir em conservar as rodovias.

Para isso, analisaremos com conteúdos doutrinários e jurisprudências a questão da responsabilidade civil do Estado nos acidentes automobilísticos, a discussão entre a teoria subjetiva e a objetiva nas omissões em três casos: a) acidentes de trânsito causados por buraco, valeta ou desnivelamento da rodovia; b) pontes, viadutos e passagens de nível mal conservadas; c) semáforo defeituoso.

A responsabilidade civil do Estado se divide em duas teorias. A teoria objetiva tem como pressupostos o nexo causal entre a conduta e o dano, e o julgador terá que verificar se não há nenhuma excludente da responsabilidade, parcial ou total. Já a teoria subjetiva trabalha com a culpa do serviço quando o Estado não o presta, presta mal ou presta tardiamente, para obter a reparação, o particular necessitará provar os pressupostos da teoria subjetiva e a culpa do serviço.

1 Da responsabilidade civil do estado em acidentes automobilísticos na doutrina e na jurisprudência

Em conseqüência da análise das teorias sobre a responsabilidade civil do Estado, este capítulo tratará da aplicação da lei aos casos em concreto.

Diante da complexidade do tema, será impossível ter-se por concluído o trabalho sem explorarmos todas as hipóteses cabíveis sobre o assunto e comparar com o direito dado pelos tribunais.

Nesta senda, isolamos os casos em que, de alguma forma, a atividade comissiva ou omissa da Administração Pública ensejou o dano ao particular.

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1. 1 Teoria subjetiva/awte du service ou teoria do risco administrativo

A primeira questão que surge ao buscar o enfoque doutrinário e jurisprudencial sobre a questão é quanto à aplicação das teorias da responsabilidade civil do Estado, se os pressupostos configuradores da obrigação em reparar o dano são os mesmos quanto à ação e à omissão.

Quanto à ação, não há divergência de que a aplicação da teoria objetiva ou do risco administrativo é aplicável, justificado pela redação do §6° do art. 37 da Constituição Federal, onde se diz, in verbis, "As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."

Cretella Júnior emite a seguinte opinião:

[...] não apenas a ação produz danos. Omitindo-se, o agente público também pode causar prejuízos ao administrado e à própria Administração. A omissão configura a culpa in omittendo ou in vigilando. São casos de inércia, casos de não atos. Se cruza os braços ou se não vigia, quando deveria agir, o agente público omite-se, empenhando agir, não agiu. Nem como o bônus pater familiae, nem como bonus administrator. Foi negligente. Às vezes imprudente e até imperito.3

Nesse caso, o autor fundamenta que, quando a lei determina, obriga que a Administração tome tal atitude e que esta, ao não tomar, temos uma relevância duma omissão, semelhante ao encontrado no Código Penal, no §2° do art. 13, em que se responsabiliza aquele que devia e podia agir para evitar o resultado, ou seja, a Administração Pública tem o dever de manter as rodovias em condições para um trânsito seguro, com fluidez, sem interrupções e obstáculos, devendo manter sempre que possível a sua trafegabilidade. No entanto, é impossível lhe penalizar se ocorreu algum fato que esteja fora de sua alçada, como por exemplo, em uma enchente, em que as galerias pluviais e bueiros não deram vazão em escoar tal fluxo de água, causando alagamentos e danos à comunidade. Nesse caso, não se admite qualquerPage 125responsabilidade do Estado, visto que esta adotou as medidas possíveis para que a enchente não ocorresse, mas em virtude de um fato alheio, um fenômeno da natureza, não pode prever nem impedir o resultado.

Mas no caso em que a Administração Pública, desidiosamente, deixou de limpar os bueiros e entradas de galerias, impedindo a correta drenagem, veio a ocorrer a enchente, não há dúvidas que o ato omissivo - deixar de limpar os bueiros - causou a enchente. Na situação anterior configura-se a excludente de responsabilidade do Estado, tratada no capítulo anterior.

Dentro dos que defendem a aplicação da teoria subjetiva no caso de omissão, está o professor Bandeira de Mello ao dizer que "quando o dano foi possível em decorrência de uma omissão do Estado (o serviço não funcionou, funcionou tardia ou ineficientemente) é de aplicar-se a teoria da responsabilidade subjetiva"4, e justifica: "se o Estado não agiu, não pode, logicamente, ser ele o autor do dano. E se não foi o autor, só cabe responsabilizá-lo caso esteja obrigado a impedir o dano. Isto é: só faz sentido responsabilizá-lo se descumpriu dever legal que lhe impunha obstar o evento lesivo"5.

O autor condiciona a obrigação de indenizar somente naqueles casos em que era obrigatório ao Estado evitar o resultado, mas surge a dúvida de quando existiria esta obrigação, onde o autor coloca que "a normalidade da eficiência há de ser apurada em função do meio social, [...] das possibilidades reais médias dentro do ambiente em que se produziu o fato danoso"6, e exemplifica: "se o Poder Público licencia edificações de determinada altura, não poderá deixar de ter, no serviço de combate a incêndio e resgate de sinistrados, meios de acesso compatíveis para enfrentar eventual sinistro"7.

Para Celso Antônio, o Estado, ao se omitir, não é autor do dano, não causou o dano, sua omissão é relevante como condição de existência do dano, e não causaPage 126pois "causa é o fator que positivamente gera um resultado, condição é o evento que não ocorreu, mas que, se houvera ocorrido, teria impedido o resultado"8.

O autor, em síntese, diz que "só é razoável e impositivo que responda pelos danos que não causou quando estiver de direito obrigado a impedi-los"9, e diz mais, "se adotasse solução diversa conduziria a absurdos"10, em caso de "assalto em via pública, uma enchente qualquer, uma agressão sofrida em local público, o lesado poderia sempre argüir que o 'serviço não funcionou'. A admitir-se responsabilidade objetiva nestas hipóteses, o Estado estaria erigido em segurador universal!"11. Em tais casos, é absurda a hipótese de se atribuir o nexo causal e o dano como configuradores da responsabilidade civil objetiva, levaria o Estado à falência, face tantas situações como tais encontradas no dia-a-dia. Mas é "razoável que responda pela lesão patrimonial da vítima de um assalto se agentes policiais relapsos assistiram à ocorrência inertes e desinteressados ou se, alertados a tempo de evitá-lo, omitiram-se na adoção de providências cautelares"12, em tais casos, diz o autor, seria imputável ao Estado a obrigação de reparar o dano, caracterizado na culpa subjetiva, isto é, falha do serviço.

O autor adverte que jamais a responsabilidade por ato omissivo poderá ser confundida com responsabilidade objetiva nos casos de "culpa presumida", admitir-se-á nesse caso a presunção de culpa da Administração Pública, pois se tal não se configurasse, restaria impossível ao particular provar a falha do serviço, deverá, então, ocorrer a inversão do ônus da prova.13

Utilizam-se das palavras de Celso Antônio Bandeira de Mello os doutrinadores Caio Tácito, Themístocles Brandão Cavalcanti, Maria Helena Diniz e outros14.

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No entanto, a conduta omissiva é caractere para a responsabilização objetiva do Estado, ao qual adotam esta premissa em parte majoritária da jurisprudência, e outros doutrinadores, tais como Yussef Said Cahali, Odete Medauar, Álvaro Lazzarini, Carvalho Filho, Celso Ribeiro Bastos, Toshio Mukai e outros15.

Nesse sentido, o professor Carlos Roberto Gonçalves explica seu posicionamento:

É tranqüila a jurisprudência no sentido de que o DER como também o DNER e o Dersa, deve arcar com as conseqüências da existência de defeitos, como buracos e depressões nas estradas de rodagem, decorrentes do seu deficiente estado de conservação e da falta de sinalização obrigatória, da mesma forma que as Municipalidades respondem pela falta, insuficiência ou incorreta sinalização das vias públicas municipais.

Tal responsabilidade tem por fundamento a teoria do risco administrativo, acolhida pela nossa Constituição Federal, que sujeita as...

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