Retificação no registro de imóveis

AutorChristiano Cassettari
Páginas393-422
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RETIFICAÇÃO NO REGISTRO DE IMÓVEIS
Temos como pressuposto que o registro sempre deve exprimir a verdade. Quando
por algum problema no sistema não houver essa total coincidência, deve o interessado
reclamar para o restabelecimento dessa correspondência. Nesse sentido, temos o art.
1.247 do CC, que assim estabelece: “Se o teor do registro não exprimir a verdade, poderá
o interessado reclamar que se retif‌ique ou anule”.
Assim, o citado artigo faculta à parte requerer a correção, quando esta for possível,
ou, sendo esta impossível, o cancelamento do próprio ato registrário. Isso se faz tendo
em vista que a segurança jurídica do nosso sistema se funda justamente nessa fé de que
o registro exprimirá a realidade, e, caso assim não o seja, o interessado terá como exigir
que se restabeleça essa correspondência. Todavia, antes de adentrarmos na análise do
procedimento retif‌icatório em si, é necessário deixar claro que esse ideal de coincidên-
cia entre o registro e a realidade nem sempre se alcança por meio da retif‌icação. Isso se
dá pois devemos sempre manter em mente que, quando falamos de REGISTRO, não
estamos nos referindo a um simples CADASTRO.
Quando falamos em CADASTRO IMOBILIÁRIO, devemos ter em mente uma
catalogação de propriedades segundo suas descrições físicas, com f‌inalidade predo-
minantemente f‌iscal, mas que se destina também a levantamentos estatísticos a f‌im de
direcionar as políticas públicas.
Contudo, quando falamos em REGISTRO IMOBILIÁRIO, estamos nos referindo
também a um tipo de catalogação que se baseia nas descrições físicas do imóvel (seme-
lhança), todavia essa catalogação se faz de forma diversa e para f‌ins diversos.
Quando falamos em sistema registral, estamos tratando de direitos. Esses di-
reitos, por sua vez, são derivados de regime da titulação proveniente de um sistema
jurídico que em última análise visa garantir a propriedade e os direitos reais sobre
ela incidentes.
Assim, a realidade que se busca atingir no Registro de Imóveis é a decorrente de
títulos hábeis para a produção, extinção ou alteração de direitos reais inscritíveis.
Dessa forma, um imóvel pode ter uma descrição fática inconteste que não pode
ser incerta no Registro de Imóveis por meio de uma mera retif‌icação. Isso pode se dar
pois parte desse imóvel é de uma área de posse, por exemplo, caso em que primeiro será
necessário que se declare a propriedade da parte, por meio do procedimento próprio,
para depois se fazer inseri-la na serventia imobiliária. Ou ainda pode ser o caso de o
imóvel não existir na serventia como um imóvel autônomo, tratando-se de uma fração
ideal de um imóvel maior, fato que não admite especif‌icação de área certa e determinada,
enquanto este continuar inserido em área maior por ferir o princípio da unitariedade
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REGISTRO DE IMÓVEIS • MONETE HIPÓLITO SERRA E MÁRCIO GUERRA SERRA
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da matrícula (cada matrícula deve conter um único imóvel, e cada imóvel deve ser re-
presentado por uma única matrícula).
Pode ocorrer, também, que a discrepância resulte de um erro ocorrido na forma-
ção do direito, por exemplo, na hipótese em que a parte queria vender dois hectares de
uma área, mas faz constar na escritura somente um. Nessa hipótese, seria necessária a
complementação da vontade para a correção do erro, visto que na realidade o procedi-
mento de registro foi correto. Temos então que a retif‌icação de registro visa a correção de
falha existente no procedimento de registro, e não de qualquer falha que tenha causado
discrepância entre a realidade fática e o sistema registrário.
Visto isso, temos que a retif‌icação do registro busca trazer precisão aos atos pratica-
dos pelo registro de imóveis, reforçando, assim, a segurança emitida pelo nosso sistema,
de modo que sempre foi permitida no direito brasileiro. Tanto é assim que o Código
Civil de 1916 já previa essa hipótese no art. 860, que dispunha: “se o teor do registro
não exprimir a verdade, poderá o interessado reclamar que se retif‌ique”.
Como já analisamos, o nosso sistema registrário atribui à inscrição imobiliária, em
regra, presunção relativa de veracidade, possibilitando que não só os vícios existentes
no título possam atingir o registro, como também que possíveis erros, omissões ou
imprecisões existentes no procedimento registrário possam ser corrigidos por meio da
retif‌icação.
Apesar de sempre ter existido em nosso sistema, a retif‌icação imobiliária passou por
uma grande transformação com o advento da Lei n. 10.931/2004, a qual ampliou muito
as hipóteses em que pode o registrador proceder administrativamente a retif‌icações de
atos existentes na serventia. Dessa forma, podemos af‌irmar que, após o advento da Lei n.
10.931/2004, na maioria das vezes poderá o registrador proceder às correções necessárias
sobre seus atos para que se espelhem na realidade, sem a necessidade da intervenção do
Poder Judiciário, seja em sua atuação administrativa, seja em sua atuação jurisdicional.
Em vista disso, faz-se necessária a análise do procedimento retif‌icatório antes da
Lei n. 10.931/2004, para que possamos entendê-lo e, assim, perceber a magnitude das
mudanças trazidas pela referida lei.
Dessa forma, o antigo art. 213 da Lei n. 6.015/73 dispunha que:
Art. 213. A requerimento do interessado, poderá ser reticado o erro constante do registro, desde que
tal reticação não acarrete prejuízo a terceiro. § 1º A reticação será feita mediante despacho judicial,
salvo no caso de erro evidente, o qual o ocial, desde logo, corrigirá, com a devida cautela. § 2º Se
da reticação resultar alteração da descrição das divisas ou da área do imóvel, serão citados, para se
manifestarem sobre o requerimento, em 10 (dez) dias, todos os confrontantes e o alienante ou seus
sucessores.
Da leitura do dispositivo acima, observa-se que antigamente tínhamos três pro-
cedimentos para a retif‌icação de erro registral, ou seja, em caso de erro evidente, de
retif‌icação de área e de retif‌icação de registro.
No primeiro procedimento, a correção podia ser realizada de ofício ou a requeri-
mento da parte, mas era reservada à correção de erros verif‌icados mediante uma sim-
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