A sentença inconstitucional e a impugnação do executado

AutorPedro Gomes de Queiroz
CargoMestre em Direito Processual pela UERJ
Páginas519-578
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume XIV.
Periódico da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ.
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. www.redp.com.br ISSN 1982-7636
519
A SENTENÇA INCONSTITUCIONAL E A IMPUGNAÇÃO DO EXECUTADO
Pedro Gomes de Queiroz
Mestre em Direito Processual pela UERJ. Especialista em
Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro. Bacharel em Direito pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
Advogado no Rio de Janeiro.
Resumo: O presente trabalho tem por fim investigar a natureza jurídica da sentença
transitada em julgado baseada em norma declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal
Federal, bem como as formas oferecidas pelo ordenamento jurídico brasileiro vigente e
pelo Novo Código de Processo Civil para impugnar este tipo de sentença.
Palavras-chave: coisa julgada, sentença inconstitucional, ação rescisória, relações
jurídicas de trato continuado, impugnação à execução contra a Fazenda Pública, Projeto do
Novo Código de Processo Civil.
Abstract: This paper aims to investigate the juridical nature of the r es judicata based in a
norm declared unconstitutional by the Supreme Court of Brazil, as well as the means
offered by the current Brazilian Law and by the Bill of the New Code of Civil Procedure to
object this kind of judgment.
Key words: res judicata, unconstitutional judgment, motion to annul a res judicata,
continuing juridical relation, objection to execution against the State, Bill of the New Code
of Civil Procedure.
Sumário: 1. Conceito e natureza jurídica da coisa julgada. 2. Fundamentos da coisa
julgada. 3. Coisa julgada e cognição exaustiva. 4. Limites objetivos da coisa julgada. 5. A
tese da relativização da coisa julgada. 6. A natureza jurídica da sentença baseada em norma
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume XIV.
Periódico da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ.
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. www.redp.com.br ISSN 1982-7636
520
declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal. 7. As reformas do Código de
Processo Civil e a impugnação à sentença baseada em lei ou ato normativo declarado
inconstitucional pelo STF. 8. A origem do precedente do Supremo Tribunal Federal que
declara a inconstitucionalidade da norma. 9. Momento da declaração de
inconstitucionalidade da norma pelo Supremo Tribunal Federal. 10. A questão da mutação
constitucional. 11. Os efeitos da declaração de inconstitucionalidade sobre as sentenças
transitadas em julgado que declarem ou constituam relações jurídicas de trato continuado.
12. Os efeitos da declaração de constitucionalidade do STF sobre as sentenças transitadas
em julgado que digam respeito a relações jurídicas de trato continuado. 13. A impugnação
da sentença inconstitucional no Projeto do Novo CPC. 14. A impugnação à execução
contra a Fazenda Pública no Novo CPC. 15. Conclusão.
1. Conceito e natureza jurídica da coisa julgada
De acordo com o art. 6º, § 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro
(Decreto--se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de

1. O artigo 467 do Código de Processo Civil, por sua vez, define
ue torna imutável e indiscutível a sentença, não
2-3.
De acordo com Eduardo Talamini, por muito tempo vigorou a noção tradicional, de
índole romanística, de que a coisa julgada seria um efeito da sentença. De acordo com essa
concepção, tratar-se-ia de um dos vários efeitos produzidos pela sentença ou, ainda,
identificar-se-ia com o próprio efeito declaratório4.
1 BRASIL. Decreto-lei n.º 4.657, de 4 de sete mbro de 1942. Disponível em:
. Acesso e m: 01 nov. 2014.
2 BRASIL. Código de Processo Civil (Lei n.º 5.869, de 11 de j aneiro de 1973). Disponível em:
. Acesso em: 01 nov. 2014.
3 GRECO, Leonardo. Instituições de Processo Civil. v. II. 2. ed. Rio de janeiro: Forense, 2011, p. 289 -290.
4 TALAMINI, Eduardo. Partes, terceiros e coisa julgad a (os limites subjetivos da coisa julgada) In: DIDIER
JÚNIOR, Fredie; WAMBIER, T eresa Arruda (Coord.). Aspectos polêmicos sobre o s terceiros no Pro cesso
Civil e assuntos afins. Revista dos Tribunais: São Paulo, 2004, p. 193 -246.
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP. Volume XIV.
Periódico da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ.
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. www.redp.com.br ISSN 1982-7636
521
Enrico Tulio Liebman distinguiu de forma precisa os efeitos da sentença do
instituto da coisa julgada. Segundo sua lição, a coisa julgada é uma qualidade (autoridade)
dos efeitos da sentença, sejam eles quais forem
5, e não um de seus efeitos6.
José Carlos Barbosa Moreira observou que a coisa julgada não consiste
propriamente na imutabilidade da sentença, mas na imutabilidade do conteúdo do comando
da sentença. O processualista carioca aduz que os efeitos da sentença eventualmente se
modificarão ou serão extintos quer porque isso às vezes deriva da sua normal atuação,
como no efeito condenatório, quer porque, desde que o objeto seja direito disponível, as
partes podem, posteriormente, ajustar solução diversa. Assim, as partes separadas
judicialmente em processo litigioso podem, posteriormente, retomar o vínculo conjugal ou
o credor de dívida objeto de condenação pode remiti-la. Entretanto, será impossível obter
outro comando, de qualquer juiz, para aquele mesmo objeto de processo antes decidido
pela sentença revestida da coisa julgada7. Da mesma forma, Barbosa Moreira defende que
o conteúdo da sentença é indivisível. Assim, a coisa julgada não impediria apenas o
reexame do direito material, mas também da causa de forma ampla, do objeto litigioso. Ou
seja, a imutabilidade da sentença não atingiria apenas os seus efeitos (declaratórios,
constitutivos ou condenatórios), de modo que seria defeso ao juiz, no mesmo processo ou
em outro, alterar a apreciação dos fundamentos e dos fatos constantes da sentença8.
Segundo Leonardo Greco, embora a concepção do conteúdo da sentença como um
todo indivisível seja correta, pois os fatos e fundamentos da sentença delimitam seus
efeitos de direito material, não se pode extrair dela nenhuma consequência prática, uma
vez que a coisa julgada alcança, tão somente, os efeitos de direito material da sentença,
mas não a sua fundamentação. O autor oferece exemplo que auxilia na compreensão da
crítica:
5 De aco rdo com a classificação tradicional, vigente à época de Liebman, os efeitos da sentença seriam
declaratórios, constitutivos ou condenatórios.
6 LIEBMAN, Enrico Tulio. Eficácia e autoridade da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 1984, p.1-70 apud
TALAMINI, Eduardo. Op. cit., p. 193-246.
7 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Ainda e sempre a coisa julgada. Revista dos Tribunais, São Paulo:
RT, n. 416, 1970 apud TALAMINI, Eduardo. Op. cit., p. 193-246.
8 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Eficácia da sentença e autoridade da coisa julgada. In: Temas de
Direito Processual: 3ª série. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 112 apud GRECO, Leonardo. Instituições de
Processo Civil. v. II. 2. ed. Rio de janeiro: Forense, 2011, p. 299.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT