Sindicatos no Brasil no século XXI

AutorMaria Cecília De Almeida Monteiro Lemos
CargoDoutora em Direito, Estado e Constituição pela UnB
Páginas91-108
91
SINDICATOS NO BRASIL DO SÉCULO XXI: LIMITES E DESAFIOS
UNIONS IN BRAZIL OFF 21ST CENTURY: LIMITS AND CHALLENGES
Maria Cecilia de Almeida Monteiro Lemos
1
RESUMO: O p resente artigo se propõe, por meio de revisão bibliográfica, a resgatar o histórico do movimento
sindical brasileiro para compreender os seus limites e desafios, a partir da complexidade de sua formação. Para tanto,
o texto apresenta as bases do novo sindicalismo brasileiro, erigidas pela Constituição Federal de 1988, com ênfase
para os princípios da liberdade e da autonomia sindicais, do reconhecimento do direito de greve e da importância da
negociação coletiva, elementos essenciai s para a construção de uma sociedade civil democrática e inclusiva. Aponta
algumas das características do sindicalismo brasileiro, como a unicidade sindical, que geraram impactos em sua
atuação, como a pulverização do mo vimento sindical e a falta de representatividade. Na sequência, relaciona alguns
dos obstáculos encontrados pelo movimento sindical para o exercício efetivo da liberdade e autonomia sindicais, com
ênfase aos efeitos nefastos da Reforma Trabalhista realizada em 2017, decorrentes da onda neoliberal qu e assolou o
país com o golpe parlamentar desferido contra a democracia brasileira em 2016. Destaca questões como o preconceito
e a criminalização dos movimentos sociais como resquícios dos anos de regime militar, a existência de atos
antissindicais como uma prática cotidiana entre o empresariado brasileiro, além de questões relacionadas às novas
morfologias do trabalho, todas com impacto na organização sindical. Por fim, sugere alguns caminhos para a superação
dos limites à atuação sindical, destacando a importância de sindicatos f ortes em uma sociedade democrática e
comprometida com a redução das desigualdades sociais e o trabalho decente.
PALAVRAS-CHAVE: Sindicalismo no Brasil; Constituição Federal de 1988; Desafios e limites; Reforma
Trabalhista.
SUMÁRIO: 1. O contexto histórico de gestação do movimento sindical brasileiro; 2. O Direito Sindical na Matriz
Constitucional de 1988; 3. Os princípios basilares da estrutura sindical brasileira na matriz constitucional de 1988;
3.1. A autonomia sindical; 3.2. A liberdade sindical; 4. Limites a atuação do movimento sindical brasileiro: da reforma
trabalhista aos atos antissindicais; 5. A renovação do movimento sindical br asileiro: um pressuposto para a
democracia; Conclusão; Referências bibliográficas.
ABSTRACT: This article proposes, through a bibliographic review, to rescue the history of the origin of the Brazilian
trade union movement in order to understand its limits and challenges, based on the complexity of its formation. To
this end, the text presents the bases of the new Brazilian unionism, erected by the Federal Constitution of 1988, with
emphasis on the principles of freedom and union autonomy, recognition of the right to strike and the importance of
collective bargaining, essential elements for the cons truction of a democratic and inclusive civil society. It points out
some of the characteristics of Brazilian unionism, such as union uniqueness, which generated impacts on its
performance, such as the fragmentation of the union movement and the lack of rep resentativeness. Next, it lists some
of the obstacles encountered by the trade union movement for the effective exercise of freedom and union autonomy,
with emphasis on the harmful effects of the Labor Reform carried out in 2017, resulting from the neoliberal wave that
devastated the country with the parliamentary coup carried out against Brazilian democracy in 2016. It highlights
issues such as prejudice and the criminalization of social movements as remnants of the years of military rule, the
existence of anti-union acts as a daily practice among the Brazilian business community, in addition to issues related
to the new morphologies of work, all of which hav e an impact on the trade union organization. Finally, it suggests
some ways to overcome the limits to union action, highlighting the importance of strong unions in a democratic society
committed to reducing social inequalities and decent work.
Artigo enviado em 21/11/2022
Artigo aprovado em 16/12/2022
1
Doutora em Direito, Estado e Constituição pela UnB. Pós-Doutoranda em Derecho Lab oral na Universitat de
València, Espanh a. Mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC-SP. Especialista em Direito e Processo do
Trabalho pela PUC-SP e em Direito Constitucional do Trabalho pela UnB. Coordenadora adjunta e Professora Titular
do Programa de Mestrado em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas do UDF Centro Universitário, Brasília,
Brasil. http://lattes.cnpq.br/6077663536332911, https://orcid.org/0000-0002-2651-8030, e-mail:
mclemos@udf.edu.br.
92
KEYWORDS: Unionism in Brazil; Federal Constitution of 1988; Challenges and limits; Labo r Reform.
SUMMARY: 1. The historical context of the gestation of the Brazilian trad e union movement; 2. Trade Union Law
in the Constitutional Matrix of 1988; 3. The basic principles of the Braz ilian trade union structure in the 1988
constitutional matrix; 3.1. Union autonomy; 3.2. Trade union freedom; 4. Limits to the performance of the Brazilian
trade union movement: from labor reform to anti-union acts; 5. The renewal of the Brazilian trad e union movement:
a presupposition for democracy; Conclusion. References.
1 O CONTEXTO HISTÓRICO DE GESTAÇÃO DO MOVIMENTO SINDICAL
BRASILEIRO
O processo dialético de desenvolvimento da sociedade contemporânea apresenta avanços
e recuos, imbricado pelo desenvolvimento do modo de produção capitalista. Nesse processo, a luta
dos trabalhadores por mais direitos encontra protagonismo, atuando como motor da história, e o
ser coletivo o sindicato torna-se imprescindível para assegurar a equivalência na disputa entre
o sujeito trabalhador, que busca novas conquistas civilizatórias, e o capital, que visa a acumulação
de lucros.
No Brasil, o processo histórico de reconhecimento do trabalhador como sujeito de direitos
apresenta obstáculos peculiares, derivados da própria conformação da sociedade brasileira, na qual
a superexploração da força de trabalho escravizada e a desigualdade social atuaram como
elementos estruturantes. Uma vez que somente duas gerações nos separam do tempo em que se
admitia a escravidão, a naturalização da exploração da mão de obra barata
2
e o preconceito contra
os trabalhadores e a sua organização os sindicatos -, fazem parte do imaginário da sociedade,
influenciada pelos valores das classes dominantes, e são fatores que devem ser considerados
quando da análise dos desafios e limites do sindicalismo do século XXI.
O papel dos sindicatos como representantes legítimos dos trabalhadores e da negociação
coletiva e da greve como instrumentos de luta desses trabalhadores por mais direitos passou, ao
longo da história do Brasil, por fluxos e refluxos, decorrentes do momento político de maior ou
menor liberdade encontrados na sociedade civil.
Durante a chamada “Era Vargas” – fase conturbada e autoritária da história que durou de
1930 a 1945 deu-se um importante período de ampliação dos direitos dos trabalhadores
brasileiros, incluindo a regulamentação da organização dos sindicatos, pelo Decreto 19.770, de
1931, e a criação do Ministério do Trabalho. Em 1943, ainda sob a presidência de Getúlio Vargas,
toda a legislação trabalhista brasileira foi reunida na Consolidação das Leis do Trabalho CLT,
que reconheceu direitos importantes como a limitação de jornada e a garantia de um salário-
mínimo, dentre outros.
Em que pesem os avanços conquistados pela promulgação da CLT para os trabalhadores,
resultantes, em parte, da pressão derivada do ainda incipiente sindicalismo brasileiro, e da própria
2
BIAVASCHI, Magda Barros. O Direito do Trabalho no Brasil: 1930-19 42. A construção do sujeito de direitos
trabalhistas. São Paulo: LTr, 2007, p. 294-295.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT