A sociedade civil contra a população: Uma teoria crítica do constitucionalismo de 1988 / The Civil Society against the Population: A critical theory of 1988 Brazilian Constitutionalism

AutorPablo Holmes
CargoProfessor associado do Instituto de Ciência Política (UnB) e na Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília-UnB. É graduado (2004) e mestre (2007) em direito pela Faculdade de Direito do Recife - UFPE e doutor em sociologia pela Universidade de Flensburg, Alemanha (2012). Foi Käte Hamburger Fellow no Centre for Global ...
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 1, 2022, p. 279-311.
Pablo Holmes
DOI:10.1590/2179-8966/2020/49456| ISSN: 2179-8966
279
A sociedade civil contra a população: Uma teoria crítica do
constitucionalismo de 1988
The Civil Society against the Population: A critical theory of 1988 Brazilian
Constitutionalism
Pablo Holmes¹
¹ Universidade de Brasília, Brasília, Distrito Federal, Brasil. E-mail: pabloholmes@unb.br.
ORCID: https://orcid.org/0000-0003-3612-3283.
Artigo recebido em 23/03/2020 e aceito em 17/11/2020.
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 1, 2022, p. 279-311.
Pablo Holmes
DOI:10.1590/2179-8966/2020/49456| ISSN: 2179-8966
280
Abstract
The article presents what it conceives as the three main constitutional theories on the
Brazilian Constitution of 1988. Drawing on Partha Chatterjee, it thus presents a
deconstructive approach to an important underlying distinction behind all those theories:
the distinction between Civil Society and State. It claims that, in order to understand the
political system in postcolonial contexts, a different distinction is needed: namely the
distinction between Civil Society and Population.
Keywords: Brazilian Constitutionalism; Postcolonialism; Critical Theory.
Resumo
O texto apresenta três teorias constitucionais que orientaram o pensamento e a prática
constitucional no contexto da Carta de 1988: a teoria da efetividade constitucional, a
teoria da constituição dirigente e a teoria crítica da constituição. A partir de uma
interpretação do teórico político indiano Partha Chatterjee, o artigo apresenta uma
proposta desconstrutiva da distinção entre Estado e Sociedade civil que orienta, em
diferentes medidas, essas três teorias constitucionais, chamando a atenção para outra
distinção: Sociedade Civil/População.
Palavras-chave: Constitucionalismo brasileiro; Constituição de 1988; Pós-Colonialismo;
Teoria Crítica.
Rev. Direito e Práx., Rio de Janeiro, Vol. 13, N. 1, 2022, p. 279-311.
Pablo Holmes
DOI:10.1590/2179-8966/2020/49456| ISSN: 2179-8966
281
1. Introdução
Neste artigo, aponto, de forma esquemática, três jovens tradições interpretativas acerca
da Constituição de 1988 e realizo uma reflexão crítica sobre as teorias hegemônicas no
debate constitucional brasileiro. A primeira dessas tradições, dominante na academia
jurídica, é a Teoria Constitucional da Efetividade (TCE); a segunda é a Teoria da
Constituição Dirigente (TCD); e uma terceira, de inspiração sociológica e com formulação
um pouco mais plural, chamo de Teoria Cr ítica da Constituição (TCC), a partir da qual
proponho um debate construtivo.
Depois de apresentá-las, eu apresento um olhar desconstrutivo para a forma
como as teorias constitucionais brasileiras dão prosseguimento à tradição política
europeia sobre o direito e o Estado. Com isso, penso que é possível observar um ponto
cego em nossa tradição constitucional: uma relativa incapacidade das distinções teóricas
utilizadas em relação ao caráter estruturalmente assimétrico da ordem constitucional em
um contexto pós-colonial como o brasileiro. Nesse sentido, uso a ideia de desconstrução
como Luhmann, ou seja, como uma forma de observação de segunda ordem: uma
observação das distinções usadas por um observador (uma teoria, por exemplo), para
observar a realidade (LUHMANN, 1993). No nosso caso, observo a observação da
realidade constitucional pelas teorias constitucionais de 1988.
Para tanto, proponho que observemos o sistema político a partir de uma
distinção diferente da distinção entre Estado e Sociedade Civil, que é estruturante para o
pensamento político moderno e central nas teorias constitucionais hegemônicas no
Brasil. Acompanhando a reflexão do teórico político indiano P artha Chatterjee (1993,
1997, 2004, 2011), proponho que compreendamos o complexo constitucional
(Estado+Sociedade Civil) como um mesmo corpo político ao qual deve ser acrescentada
uma outra distinção: Estado+Sociedade Civil/População. As implicações teóricas dessa
proposta não são desprezíveis. De acordo com Chatterjee, em contextos pós-coloniais, o
corpo político constitucional (Estado+Sociedade Civil) funciona como uma estrutura
oposta à figura política da população, a qual funciona apenas como objeto passivo de
processos de modernização: como um corpo político que serve de matéria prima para o
“desenvolvimento” e se organiza como uma “sociedade política”.
O exercício desconstrutivo que proponho não consiste em uma tentativa de
superar as três interpretações dominantes tampouco se trata de um trabalho de história

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT