Sociedade de consumo. O fresh restart na superdívida do consumidor

AutorLuciana Mirella Lacerda de Jesus - Ricardo Maurício Freire Soares
CargoProfessor de direito - Advogada
Páginas70-82
70 REVISTA BONIJURIS I ANO 30 I EDIÇÃO 652 I JUN/JUL 2018
DOUTRINA JURÍDIcA
Luciana Mirella Lacerda de Jesus ADVOGADA
Ricardo Maurício Freire Soares PROFESSOR DE DIREITO
O
FRESH RESTART
NA
SUPERDÍVIDA DO CONSUMIDOR
A estabilização da moeda, a concessão de crédito e a ampliação da
sociedade de consumo criou a figura do superendividado, que não
tem proteção alguma da lei
1. MARCO hISTÓRICO DO
SUPERENDIVIDAMENTO NO BRASIL
De acordo com o Instituto de Defesa do
Consumidor1, o advento do Plano de
Estabilização Econômica, mais conhe-
cido como Plano Real, em 1994, acarre-
tou significativas mudanças no cenário
nacional, notadamente a estabilização
da economia e, por conseguinte, a re-
gressão do imposto inflacionário e o crescimento
do poder aquisitivo da população.
Nesse contexto, como as instituições bancárias
deixaram de lucrar com a inflação, com expressiva
redução das operações de depósito à vista, volta-
ram a lucrar com as operações de crédito, que se
mostravam cada vez mais proveitosas e seguras
em face do aumento da renda média familiar.
Nessa linha, os setores financeiros e comerciais
desburocratizaram e diminuíram as exigências
para a concessão de créditos, possibilitando que
um maior contingente populacional pudesse des-
frutar de operação, até então inviável, notadamen-
te para as classes sociais de baixa renda. Com isso,
novos grupos de brasileiros, antes marginalizados,
foram inseridos na sociedade de consumo, passan-
do a utilizar o crédito para fazer as suas aquisições.
Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Fe-
braban)2, de 2001 a 2005 o número de cartões de
crédito no Brasil teve um aumento de 118%, sendo
que nas classes C, D e E o incremento foi de 144%.
Dessa feita, no ano de 2000 o número de cartões
de crédito em utilização perfazia o montante de
119 milhões, enquanto em 2007 já somavam 413 mi-
lhões.
Por sua vez, em 2008 as operações de crédito
no país atingiram 1.187 bilhões de reais, correspon-
dentes a 40,2% do produto interno bruto, segundo
dados do Banco Central do Brasil3.
Lamentavelmente, a concessão do crédito não
foi atrelada à educação e ao oferecimento de in-
formações essenciais para promover o consumo
consciente, muito menos quanto à divulgação dos
riscos de possível superendividamento pelo con-
sumidor.
Desse modo, o consumidor agraciado com a
concessão do crédito, principalmente por meio da
disponibilização de empréstimos, cartão magné-
tico e limite de cheque especial, não foi instruído
acerca das consequências maléficas de sua utili-
zação, como a incidência de taxas de juros exor-
bitantes, os prejuízos decorrentes do pagamento
mínimo, hipóteses de configuração de crédito ro-
tativo, dívidas no formato bola de neve, ausência
de participação nos contratos de adesão, inacessi-
bilidade do seu conteúdo e, quando acessível, de
dicil compreensão.
Destarte, a maior parte dos consumidores, até
hoje, realiza o consumo desconhecendo o cenário

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