A sociedade internacional em Francisco Suárez

AutorPaulo Emílio Vauthier Borges de Macedo
CargoUniversidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Páginas95-114
A Sociedade Internacional em Francisco Suárez1
The International Society in Francisco Suarez
Paulo Emílio Vauthier Borges de Macedo
Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro – RJ, Brasil
Resumo: Este texto analisa a noção de socie-
dade internacional em Francisco Suárez. Porque
a vontade constitui elemento essencial do seu
conceito de Direito, alguns autores criticaram
Suárez por ver nele o precursor do positivismo
voluntarista dos teóricos de Direito Internacio-
nal do século XIX. Mas isso é um equívoco.
A sociedade internacional suareziana é mais do
que a mera vontade dos Estados, pois se baseia
num conceito bastante transcendente: a Cari-
dade. Assim, neste trabalho, procura-se refutar
uma concepção difundida, mas imerecida do
teólogo espanhol. O artigo empregou o método
de abordagem indutivo e suas fontes primárias
foram as obras de Suárez e as secundárias, as
dos seus comentaristas.
Palavras-chave: Francisco Suárez. Sociedade
Internacional. Voluntarismo.
Abstract: This text examines the notion of
international society in the thought of Francisco
Suarez. Since will is an essential element of his
concept of Law, some authors have criticized
Suarez in regarding him the precursor of the
Voluntarist Positivism in International Law
theorists of the nineteenth century. However,
this is a mistake. Suarezian International society
is more than the mere will of the States, because
it is based on a concept quite transcendental:
Charity. Hence, this work attempts to refute a
widely spread yet undeserved misconception
of the Hispanic Theologian. This paper has
employed the inductive method of approach, and
its primary sources were the works of Suarez,
and its secondary those of his commentators.
Keywords: Francisco Suárez. International
Society. Voluntarism.
1 O autor agradece o importante apoio e fomento do CNPq.
Recebido em: 15/04/2016
Revisado em: 20/11/2016
Aprovado em: 07/03/2017
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2017v38n76p95
96 Seqüência (Florianópolis), n. 76, p. 95-114, ago. 2017
A Sociedade Internacional em Francisco Suárez
1 Introdução
Francisco Suárez, um dos maiores escritores da Escolástica Espa-
nhola, nasceu em Granada, em 5 de janeiro de 1548 e morreu em Lisboa,
em 24 de setembro de 1617. Proclamado pela Igreja como Doctor Exi-
mius et Pius, foi um dos fundadores do direito internacional. O interna-
cionalista norte-americano James Brown Scott (1934, p. 183-184), numa
feliz analogia, considera Francisco de Vitória o expositor inicial, Francis-
co Suárez o filósofo, e Hugo Grotius o sistematizador.
Suárez foi um pensador da segunda vaga da Escolástica Espanho-
la. Os grandes problemas da sua vida, portanto, não são mais aqueles do
tempo de Francisco de Vitória: as Grandes Navegações, a descoberta do
Novo Mundo e o direito dos índios. Não há dúvidas de que Vitória consti-
tui uma grande referência, e que a colonização e a guerra contra os índios
ainda são problemas bastante prementes à época de Suárez. Mas ele teve
de lidar com a Reforma, um evento religioso da maior importância para
um teólogo católico. E, para aquele que se tornaria um dos primeiros in-
ternacionalistas e alguém preocupado em assegurar a universalidade de
alguns valores, o fato de a Cristandade não se encontrar mais unida tor-
naria o gênero humano presa fácil do pensamento cético e relativista em
termos morais que se avizinhava com um Charron e um Montaigne.
De fato, foi o teólogo mais importante da Contra Reforma. Quando
o rei Jaime I obriga mais um juramento de fidelidade na Inglaterra (o que
afastaria o poder do Papa mesmo em questões espirituais) e inicia uma
polêmica com o Cardeal Belarmino, Roma recorre ao seu teólogo mais
importante da época que eleva a discussão e escreve uma obra científi-
ca de mais de oitocentas páginas, a Defensio Fidei Catholicae adversus
anglicanae sectae errores. Neste texto, desenvolve concepções bastante
modernas, como a origem popular do poder, o contrato social e a ideia de
limites ao poder do soberano, muito antes da filosofia britânica.
Suárez desenvolve estes institutos também em razão da sua influ-
ência nominalista. No entanto, o que o torna pioneiro na Teoria Política é
objeto de críticas bastante severas em Teoria do Direito Internacional. Na
primeira metade do século XX, debateu-se, de maneira aguerrida, acer-

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT