O teletrabalho e os riscos psicossociais ante a mitigação da tutela labor-ambiental

AutorJuliana Caravieri Martins
CargoProfessora Adjunta na Faculdade de Direito (graduação e mestrado) da Universidade Federal de Uberlândia Doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie
Páginas104-123
104
REVISTA TRABALHISTA DIREITO E PROCESSO — ANO 18 — N. 62
O teletrabalho e os riscos
psicossociais ante a mitigação
da tutela labor-ambiental(*)
Juliana Caravieri Martins(**)
Resumo:
Em todas as facetas nas quais o meio ambiente é compreendido — o meio ambiente natural;
o meio ambiente articial; o meio ambiente cultural e o meio ambiente do trabalho — a
prevenção dos riscos ambientais deve estar na agenda das empresas e do Estado. Entretanto,
na atualidade, é crescente o processo de precarização do trabalho humano, inclusive com
o uso da tecnologia como no caso do teletrabalho inserido no texto celetista pela Lei n.
13.467/2017. A tecnologia deveria tornar o ser humano mais senhor do seu tempo, mas,
no contexto do capitalismo global, ela o escraviza com jornadas extenuantes e contínuas
que desrespeitam a delimitação entre local de trabalho e de moradia, impossibilitando
a desconexão do trabalho. Tal situação contribui para o agravamento dos riscos psicos-
sociais, principalmente na modalidade de teletrabalho, acentuando o adoecimento dos
trabalhadores.
Palavras-chave:
Teletrabalho — Riscos psicossociais — Saúde — Meio ambiente do trabalho.
Abstract:
In all facets in which the environment is understood — the natural environment; the
articial environment; the cultural environment and the work environment — the
prevention of environmental risks must be on the agenda of companies and the state.
However, nowadays, the process of precariousness of human work is increasing, including
the use of technology as in the case of teleworking inserted in the celetist text by Law n.
13.467/2017. Technology should make man more lord of his time, but in the context of
global capitalism it enslaves him with strenuous and continuous journeys that disregard
(*) O presente artigo é fruto dos debates realizados
no Grupo de Pesquisa Reformas Trabalhistas e os
Retrocessos no Mundo do Trabalho: Perspectivas
para a América Latina vinculado à Universidade Federal
de Uberlândia e cadastrado no diretório dos grupos de
pesquisa do Brasil – CNPq. Disponível em: <http://dgp.
cnpq.br/dgp/espelhogrupo/9445618228736834>.
(**) Professora Adjunta na Faculdade de Direito (graduação
e mestrado) da Universidade Federal de Uberlândia.
Doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade
Presbiteriana Mackenzie, Doutora em Ciências da
Integração da América Latina pela Universidade de São
Paulo. Mestra em Direito Constitucional pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Especialista em Direito
do Trabalho pela Universidade Braz Cubas e Especialista
em Economia Empresarial pela Universidade Estadual de
Londrina.
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Bebida é água
Comida é pasto
Você tem sede de quê?
Você tem fome de quê?
A gente não quer só comida
A gente quer comida, diversão e arte
A gente não quer só comida
A gente quer saída para qualquer parte
A gente não quer só comida
A gente quer bebida, diversão, balé
A gente não quer só comida
A gente quer a vida como a vida quer.
Comida (1987) — Titãs
1. Introdução
No plano internacional, a Organização
Internacional do Trabalho propõe aos seus
Estados-membros, incluindo o Brasil, a imple-
mentação do trabalho dec ente entendido como
aquele “adequadamente remunerado, exercido
em condições de liberdade, equidade e segu-
rança, capaz de garantir uma vida digna(1).
No plano interno, a Constituição brasileira de
1988 reconheceu o direito ao trabalho digno
(1) ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. Agenda
nacional de trabalho decente. Disponível em: <http://www.
oitbrasil.org.br/sites/default/les/topic/decent_work/doc/
agenda_nacional_trabalho_decente_536.pdf>. Acesso
em: 17 ago. 2019.
como instrumento de armação da dignidade
humana do trabalhador, tanto no âmbito de
sua individualidade como pessoa, como em
seu contexto familiar e social.
A valorização do trabalho encontra-se
enfatizada no art. 1o, IV da CF, bem como
se espraia pela ordem econômica (art. 170
da CF), ao assegurar a todos existência dig-
na, conforme os ditames da justiça social, e
pela ordem social (art. 193 da CF) que tem
como objetivo o bem-estar e a justiça sociais,
dialogando com a função socioambiental
da empresa. De acordo com Celso Antônio
Bandeira de Mello(2), “a Constituição não é
simples ideário. Não é apenas uma expressão
de anseios, de aspirações, de propósitos. É a
transformação de um ideário, é a conservação
de anseios e aspirações em regras impositivas.
Em comandos. Em preceitos obrigatórios para
todos: órgãos do Poder e cidadãos”. Portanto,
evidencia-se a força normativa da Constituição
de 1988, o caráter vinculativo e obrigatório de
suas disposições sejam regras ou princípios.
Entretanto, em dissonância com a Consti-
tuição e vários tratados de direitos humanos
(2) MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Ecácia das normas
constitucionais e direitos sociais. 1. ed., 3. tir. São Paulo:
Malheiros, 2011. p. 11.
the boundary between workplace and dwelling, making it impossible to disconnect from
work. is situation contributes to the aggravation of psychosocial risks, especially in the
form of teleworking, accentuating the illness of workers.
Keywords:
Teleworking — Psychosocial risks — Health — Work Environment.
Índice dos Temas:
1. Introdução
2. Trabalho digno e o meio ambiente do trabalho sadio
3. O teletrabalho e o agravamento dos riscos psicossociais pela tecnologia imposta pelo
capitalismo neoliberal
4. Conclusão
5. Referências
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