Termos de contratos: incentivos ou ameaças?

AutorElio Ferrato
CargoMestre em Administração. Doutorando do Programa de Engenharia de Produção da Universidade Metodista de Piracicaba. E-MAIL: kandra@uol.com.br
Páginas342-351

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1 Introdução

Douglass North, em entrevista a Monica Weinberg, da Revista Veja, editada em novembro de 2003, na seção Entrevista, sob o título "Para um país enriquecer", faz declarações importantes iniciando por uma máxima que diz: "só vão progredir os países que desenvolvem instituições sólidas". Nessa entrevista, North conta que nos tempos do faroeste, os Estados Unidos já tinham leis claras para assegurar o direito de propriedade e o cumprimento dos contratos. Indagado porque em 1800 a renda per capita dos Estados Unidos e a do Brasil eram idênticas e, um século mais tarde, os americanos haviam deixado os brasileiros para trás, sendo hoje a diferença de renda da ordem de quinze vezes, North diz que, apesar de haver várias explicações para o fenômeno do distanciamento da renda entre esses países, ele gosta de concentrar em uma delas: as chamadas instituições. Quando ele usa a palavra instituição se refere a uma legislação clara que garanta os direitos de propriedade e impeça que contratos virem pó da noite para o dia. Ainda se refere a um sistema judiciário eficaz, com agências regulatórias firmes e atuantes, e completa: "só assim, com instituições firmes, um país pode estar preparado para dar o salto qualitativo de patamar".

Vale agregar a essa rica fala de North a sua observação sobre a história americana do século XIX quando, embora estivessem nos tempos do faroeste, os americanos já possuiam leis sofistica das que asseguravam a liberdade religiosa, o direito ao habeas-corpus, o direito à propriedade privada e a certeza coletiva de que, se assinassem um contrato, ele seria cumprido. Assim, os proprietários de terra e os donos de firmas se sentiam estimulados a investir em novas tecnologias e em mão-de-obra.

Embora não seja a quebra de contrato, que é o cerne do ensaio em questão, o principal motivo que leva as empresas brasileiras a recorrerem ou a responderem à Justiça, ele está em quarto lugar conforme Demarest & Almeida; Leite, Tosto e Barros Advogados; Veirano Advogados, depois de reclamações trabalhistas em primeiro lugar, ações tributárias em segundo e reclamações de consumidores em terceiro lugar, de acordo com publicação da revista Exame de 12 de maio de 2004, cujo artigo trata do tema Concorrência.

A quebra de contrato ou "hold-up" é objeto de análise de alguns autores proeminentes na área de conhecimento da Nova Economia Institucional, que teve estudos iniciados por Ronald Coase, cujo artigo sob o título "The Problem of Social Cost" (COASE, 1960) representou a evolução do pensamento econômico sobre o direito. Esses estudos receberam contribuições importantes de Oliver E. Williamson, Benjamin Klein, Crawford e Alchian, Oliver Hart, Zylbersztajn, entre outros. É importante fazer constar que outros autores como Demsetz, Barzel, Werin e Wijkander, Masten, Macneil, Joskow, Schwartz, Lafontaine e Shaw, Shepard, Hylton, Cooter e Ulen, Parisi, Azevedo, entre outros, também contribuiram com temas teóricos e empíricos valorosos como direito de propriedade, duração de contratos, contratos de franquias, formas contratuais no varejo, contratos incompletos, só para mencionar alguns deles. Ressalta-se que o trabalho de Zylbersztajn e Sztajn (2005), como organizadores de uma nova área de conhecimento no Brasil, que introduz o conceito de contratos, dentro do tema principal da Economia dos Contratos, sob a forma de publicação de um livro com o título de Direito e Economia: Análise Econômica do Direito e das Organizações, representa uma contribuição importante para a sociedade brasileira, que passa por uma fase de transição na revisão de seus valores morais, ético-legais, econômicos e, portanto, é bem-vindo este novo tesouro literário coordenado por eles e que conta com artigos de apoio de Armando Castelar Pinheiro, Basília Aguirre, Benito Arruñada, Bernado Mueller, Érica Gorga, Maílson da Nobrega, Oliver Williamson, Paulo Furquim de Azevedo, Pérsio Arida e Veneta Andonova.

Subjacentemente a várias teorias de contrato, este trabalho objetiva dar uma contribuição à análise do hold-up, que aqui se refere à quebra contratual, podendo ser esta intencional ou não, de forma real ou de blefe, como uma possível saída para uma falha na estratégia de negócios, tendo como vetor o contrato que formaliza as relações na estrutura de governança híbrida, em um primeiro momento, e, posteriormente, na estrutura de governança da integração vertical, tendo por análise o clássico exemplo entre General Motors e Fisher Body, usando, na primeira seção do ensaio, como referencial teórico, um framework probabilístico de hold-up desenvolvido por Benjamin Klein. Na segunda seção, discutem-se os custos das especificações contratuais, com a inclusãoPage 343 de algumas idéias de Oliver Hart a respeito; na terceira seção pensa-se sobre os termos do contrato definindo as categorias de self-enforcing, aqui vistas como o âmbito de fazer-se valer ou fazerse cumprir os termos do contrato. Na quarta e última seção, conclui-se o ensaio apresentando uma avaliação do tema questionando a validação do título deste trabalho, sem levar em conta sua concreta exequibilidade, seja na Common Law ou na Civil Law, que pode tornar-se objeto de uma pesquisa particular e específica a respeito no futuro. Pretende-se, com este trabalho, portanto, explorar a problematização envolvida na confecção de um contrato, destacando a pergunta crucial se ele representaria uma real oportunidade de negócio ou, então, poderia tratar-se de uma ameaça, um risco mortal para a organização.

2 Um framework probabilístico de "hold-up" nas relações da estrutura de governança híbrida

Estrutura de governança, neste trabalho, é entendida como um conjunto de formas organizacionais que administra ou governa uma determinada transação econômica. Uma das três estruturas de governança que aqui são discutidas, na ótica da teoria da Economia dos Custos de Transação - (ECT), por exemplo, a integração vertical, deve ser vista como um conjunto de transações sob a mesma propriedade e sujeito a controles administrativos geridos por uma estrutura em que há ordem e graduação de autoridade. O conceito pode assumir tanto o significado de integração vertical como de hierarquia, definido como o processo pelo qual etapas tecnologicamente distintas e sequenciais reúnem-se em uma hierarquia. É bastante comum ser encontrada a integração vertical nos grandes complexos industriais, principalmente, e isso pode ser exemplificado pelo caso no Brasil da General Motors e a Delphi, em que por muitos anos a GM estabeleceu uma relação de coordenação sobre a Delphi e acabou vendendo a empresa a outro grupo independente, na metade da década de 1990, como forma de redução de custos transacionais em suas operações, passando, a partir daí, a vivenciar uma outra estrutura de governança, a híbrida, ou seja, uma relação de contratos de longo prazo, fato contrário ao caso da General Motors e Fisher Body nos Estados Unidos da América que se discorre a seguir.

Oliver E. Williamson (1988) demonstra, através da teoria da ECT que, em função da alta especificidade dos ativos, os custos de transação são mais elevados no modelo de estrutura de governança da integração vertical (H), que, comparativamente com o modelo híbrido(X), o qual pode ser entendido aqui por relação contratual de longo prazo por duas ou mais empresas independentes administrativa e juridicamente, e, por último, com o modelo de estrutura de mercado (M), em que a especificidade dos ativos é baixa, as partes têm liberdade de transacionar, sem dependência um do outro, sendo que o preço é o principal elo de ligação na relação, como pode ser visto na Figura 1 a seguir. Antes, porém, vale explicar que a Teoria da ECT tem sido um referencial teórico importante para a compreensão das razões que levam as organizações a passarem a trabalhar sob múltiplas estruturas empresariais, implicando um feixe de contratos.

[ VEA LA FIGURA EN EL PDF ADJUNTO ]

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Especificidade de ativos refere-se ao grau em que um ativo pode ser reempregado em usos alternativos e por usuários alternativos, sem sacrifício do seu valor produtivo, conforme Williamson (1996).

Para discutir o "hold-up", sugere-se a análise do framework do "oportunismo" apresentado nos trabalhos de Williamson e no de Klein e Alchian, que representam uma contribuição importante para a compreensão do papel dos contratos (WILLIAMSON, 1975, 1979, 1985...

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