Tipicidade e Interpretação no Direito Penal

AutorClaudio Brandão
CargoUniversidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
Páginas59-89
Tipicidade e Interpretação no Direito Penal1
Suitability to the Type of Crime and Criminal Law Interpretation
Cláudio Brandão
Universidade Federal de Pernambuco, Recife, PE, Brasil
Resumo: A tipicidade é a condição para que o
método penal se desenvolva e possibilite, em
face das exigências da Legalidade Penal, a ava-
liação dogmática da imposição de uma pena.
Ocorre que pela necessidade do uso da lingua-
gem para a realização desse juízo, desvela-se
uma crise, que é falsamente tratada a partir de
um silogismo. Nesse panorama, põe-se em re-
levo o papel do entimema no método penal, que
possibilita a própria crítica do sistema de dog-
mática do crime e descortina os caminhos para
a interpretação desse ramo do direito.
Palavras-chave: Silogismo. Entimema. Méto-
do Criminal.
Abstract: The suitability to the type of crime
is the condition for the criminal method to de-
velop and enable, in the way of the Criminal
Legality, the evaluation of the dogmatic requi-
rements for the imposition of a penalty. But
the need of the use of language to achieve this
criminal judgment reveals a crisis that is falsely
treated as a syllogism. In this view, reveals the
role of the enthymeme in the criminal method,
which enables the critique of dogmatic system
of crime and reveals the paths to the interpreta-
tion of this branch of law.
Keywords: Syllogism. Enthymeme. Criminal
Method.
1 Introdução: a atualidade da questão da tipicidade penal
O direito penal pensa e raciocina por meio de tipos (SAUER, 1956).
Para que algum fato ganhe relevância penal, por conseguinte, é necessá-
rio que ele esteja subsumido em um tipo; o que significa que o legislador
torna pertinente ao direito penal uma conduta quando a materializa em
uma lei (ASUA, 1945). Assim, sem a tipicidade, esvazia-se o conteúdo do
direito penal, porque, para os postulados da sua dogmática,
1 Recebido em: 06/09/2013
Revisado em: 11/10/2013
Aprovado em: 10/12/2013
Doi: http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2013v35n68p59
Tipicidade e Interpretação no Direito Penal
60 Seqüência (Florianópolis), n. 68, p. 59-89, jun. 2014
[...] a rigorosa delimitação do tipo, que pretende significar univo-
camente quais ações são puníveis, e a fixação de um mínimo e um
máximo, que deixa a individualização da pena muitas possibilida-
des, imprimem o selo do direito penal de nossa época. (MAYER,
2007, p. 39)
Porém a tipicidade, como juízo de correspondência entre a conduta
realizada e o modelo de comportamento proibido pela lei penal, represen-
ta um importante aspecto da crise por que passa o direito penal hodierno.
De um lado o legislador, que prevê o modelo abstrato de conduta
por meio da lei penal por ele elaborada, carece da técnica penal na ela-
boração das normas. No ordenamento jurídico brasileiro, os exemplos
avultam. Traga-se à colação o seguinte tipo penal, capitulado no parágra-
fo único do artigo 4º da Lei n. 7.492/86: “Se a gestão é temerária: Pena –
reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos e multa”.
Ora, o tipo penal deve ser um modelo abstrato de um comportamen-
to, logo deve individualizar a conduta proibida. O núcleo do tipo penal,
como sabido, é sempre um verbo, que, conceitualmente, expressa uma
conduta. Nessa hipótese, entretanto, o legislador se utilizou de um verbo
de ligação, demonstrando uma total ausência de técnica. Com efeito, a
alienação técnica do político atinge diretamente a tipicidade, no seu as-
pecto formal. De outro lado, o técnico, que aplica o direito penal, tende
a não vislumbrar o conteúdo material do tipo penal, que é o bem jurídico.
O método penal estabelece que se investigue a violação do bem jurídi-
co, que é o conteúdo da tipicidade, para que se justifique a violência da
pena. Porque a pena é uma forma de privação de direitos fundamentais, o
técnico não deve ser um aplicador autista da forma, isto é, não deve ser
politicamente alienado. Tal alienação política do técnico também põe em
xeque a questão da tipicidade, em seu aspecto material. Para além dela,
frequentemente se verifica a falta de preparo técnica do técnico, o que en-
cerra uma contraditio in terminis.
Profunda, sobre esse tópico, é a reflexão de Zaffaroni (2005, p. 77):
“[...] as mais perigosas combinações tem lugar entre fenômenos de alie-
nação técnica de políticos com outros de alienação política dos técnicos,

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