Por uma descrição da justiça em luhmann

AutorFernando Rister de Sousa Lima, Orlando Villas Bôas Filho
CargoUniversidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), São Paulo, SP, Brasil. Doutor em Filosofia do Direito e do Estado/Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) São Paulo, SP, Brasil. Doutor em Direito
Páginas251-275
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POR UMA DESCRIÇÃO DA JUSTIÇA EM LUHMANN
FOR A DESCRIPTION OF JUSTICE IN LUHMANN
Fernando Rister de Sousa LimaI
Orlando Villas Bôas FilhoII
I Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM), São Paulo, SP, Brasil. Doutor em
Filosoa do Direito e do Estado. E-mail: fernando.lima@mackenzie.br
II Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM) São Paulo, SP, Brasil. Doutor em
Direito. E-mail: ovbf@usp.br
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v14i33.3055
Recebido em: 08.04.2019 Aceito em: 15.04.2019
Resumo: O propósito deste artigo é
descrever a justiça enquanto fórmula de
contingência, tal como proposta pelo
sociólogo alemão Niklas Luhmann. Para
tanto, em um primeiro momento, será
necessário apontar a especicidade que o
autor atribui à abordagem do direito para,
em seguida, sublinhar aspectos essenciais
de sua visão acerca da justiça. A pesquisa
bibliográca é o recurso metodológico
utilizado para reunir o referencial teórico
essencial ao deslinde da problemática,
guiada pela ideia de que o direito opera
com base no código binário lícito/
ilícito e a justiça do sistema jurídico é a
fórmula de contingência, cuja nalidade
é fornecer consistência e adequação
social às decisões jurídicas. Como
conclusão, pode-se, primeiramente,
armar que decisão justa é aquela
tomada obrigatoriamente sob o manto
da fórmula de contingência, ou seja, com
consistência e adequação.
Abstract: The purpose of this article
is to describe justice as a formula of
contingency, as proposed by the german
sociologist Niklas Luhmann. For such,
in a rst moment, it will be necessary to
point out the specicity that the author
attributes to the approach of the law to,
in turn, underline essential aspects of
mis vision of justice. The bibliographic
research is the methodological resource
used to assemble the essential theoretical
referential to the solution of the problem,
guided by the idea that the law operates
based on the binary code licit/ilicit
and the justice of the law system is the
formula of contingency, which goal is to
provide consistency and social adequacy
to law decisions. As a conclusion, one
can, at rst, claim that a fair decision is
the one which is mandatorily taken under
the scope of the formula of contingency,
that is, with consistency and adequacy.
Palavras-chave: Justiça. Consistência.
Adequação.
Keywords: Justice. Consistency.
Adequacy.
Sumário: 1 Introdução; 2 Premissas epistemológicas da justiça sistêmica; 3 A
fórmula de contingência como consistência interna e adequação social; 3.1 Justiça
não axiológica; 3.2 Justiça autorreferente ao direito; 3.3 Justiça cognitivamente
aberta; 4 Conclusão; Referências.
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Revista Direitos Culturais | Santo Ângelo | v. 14 | n. 33 | p. 251-275 | maio/agos. 2019.
DOI: http://dx.doi.org/10.20912/rdc.v14i33.3055
1 Introdução
No primeiro dia de aula do primeiro semestre da disciplina
Teoria Geral do Direito – ou sob a nomenclatura Introdução ao Estudo
do Direito (IED)1 –, o professor pergunta aos alunos por que escolheram
cursar a Faculdade de Direito. A resposta, quase sempre, gira em torno
da busca por justiça ou outro valor que materialize este sentimento.
Ademais, o vernáculo corrente no cotidiano forense diz respeito à
justiça ou à injustiça de determinada decisão. Estudar o ideário justiça2
permanece atual.3 Além do mais, o desenvolvimento econômico do
1 Algumas instituições recentemente adotaram a nomenclatura “Teoria Geral do
Direito” como a Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana Mackenzie
(FDIR-UPM), outras “Teoria do Direito” e boa parte ainda conserva as tradicionais
“Introdução ao Estudo do Direito” ou “Introdução à Ciência do Direito”.
2 Na temática justiça, encontram-se as mais diversas posições sobre o tema, seja
no plano da Teoria do Direito, da Filosoa ou mesmo da Sociologia Jurídica.
Entre tantos, convém mencionar Hans Kelsen, que se debruçou sobre o assunto
de forma exauriente, possui diversos trabalhos. Para o mestre de Viena, a justiça
absoluta não é cognoscível pela razão humana. Sendo, pois, o ideal de justiça algo
subjetivo, chega-se à beira da irracionalidade. Ao presente, ressaltam-se livros já
traduzidos para a língua portuguesa: O que é justiça? Trad. Luis Carlos Borges. São
Paulo: Martins Fontes, 1998; O problema da justiça. 3. ed. Tradução João Baptista
Machado. São Paulo: Martins Fontes, 1998; A ilusão da justiça. Trad. Sérgio
Tellardi. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. Ao contrário, por sua vez, John
Rawls, valora a justiça, colocando-a como condição da mantença das leis. Signica
dizer: leis e instituições devem ser reformadas ou abolidas quando são injustas.
Porém, ressalta ser uma injustiça tolerável se for crucial para evitar injustiça maior.
(Uma teoria da justiça. Trad. Almiro Pisetta e Lenita M. R. Esteves. São Paulo:
Martins Fontes, 1997). Sobre a justiça, ver p. 7, da qual se transcreve o seguinte
trecho: “Para nós o objeto primário da justiça é a estrutura básica da sociedade,
ou mais exatamente, a maneira pela qual as instituições sociais mais importantes
distribuem direitos e deveres fundamentais e determinam a divisão de vantagens
provenientes da cooperação social.”.
4 DE CICCO, Cláudio. História do pensamento jurídico e da losoa do direito. 3.
ed., reformulado. São Paulo: Saraiva, 2006.
3 Nesse ambiente social, a função do direito, num leviano resumo, ao longo da
história, tem-se centrado em educar, sanar e punir. O aplicador da norma constrói
uma decisão com intuito de educar o infrator, a pena deve ser suciente, e não
mais do que isso, para ensiná-lo a não mais repetir a conduta, segundo clássica
conquista iluminista. O Estado obriga o causador do ilícito a indenizar o dano,
assim oferece à vítima uma restauração ao estado anterior à lesão. Ora, é preciso
punir o agente delituoso, substituindo o particular que o faria pela justiça privada,
como uma prestação de contas sociais. As regras foram desrespeitadas, é preciso
vingar o Estado e a sociedade. Cf. LUHMANN, Niklas. La differenziazione del
diritto. A cura di Rafaelle De Giorgi. Milano: Mulino, 1990. p. 315. Ver ainda, ora
sob o foco das decisões judiciais, mas também num enfoque histórico, WAMBIER,

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