Uso de placebo em experimentos clínicos envolvendo seres humanos no Brasil

AutorCristina Esteves Jordão, Poliana Reche Mêdola, Luciane Cruz Lopes, Pedro Luis Rosalen
Páginas31-46
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USO DE PLACEBO EM EXPERIMENTOS C LÍNICOS
ENVOLVENDO SERES H UMANOS NO B RASIL
USE OF PLACEBO IN CLINICAL EXPERIMENTS
INVOLVING HUMAN BEINGS IN BRAZIL
Cristina Esteves Jordão(*)
Poliana Reche Mêdola(**)
Luciane Cruz Lopes(***)
Pedro Luis Rosalen(****)
RESUMO
O uso do placebo em pesquisa clínica desperta controvérsias espe-
cialmente em estudos envolvendo seres humanos. O propósito deste traba-
lho é analisar o emprego ético de grupo controle-placebo e a proteção dos
sujeitos da pesquisa em estudos clínicos realizados no Brasil, desde a
Resolução do Conselho Nacional de Saúde CNS 196/96. Fez-se revisão
sistemática (1997 a 2006) nas bases de dados
Lilacs
,
Medline
e
SciELO
,
de estudos clínicos realizados no país com o uso de placebo e analisou-se
sua natureza e aceitação ética, tendo em vista as disposições da referida
Resolução.
Palavras-chave
Brasil; Placebo; Seres Humanos.
(*) Analista de Controle de Qualidade, farmacêutica e bioquímica com pós-graduação em Farmaco-
logia Clínica na Universidade Metodista de Piracicaba.
E-mail:
.
(**) Coordenadora de Estudos, Centro de Estudos e Pesquisas Oncológicas de Sorocaba CEPOS —
SP, farmacêutica e bioquímica com pós-graduação em Farmacologia Clínica da Universidade Meto-
dista de Piracicaba.
E-mail:
.
(***) Coordenadora de curso de pós-graduação em Farmacologia Clínica na ASSPE, UNIMEP e
UNISO.
Email:
.
(****) Professor titular do Departamento de Ciências Fisiológicas da Faculdade de Odontologia de
Piracicaba da Universidade Estadual de Campinas — UNICAMP.
E-mail:
.
Recebido em 9.4.08. Aprovado em 13.5.08.
Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
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ABSTRACT
The use of placebo in clinical research is controversy especially in studi-
es involving human beings. The purpose of this study is to analyze the employ-
ment of ethical placebo-control groups and the protection of human beings in
clinical studies in Brazil, since the Resolution CNS n. 196/96 (National Health
Council). It was made a systematic review (1997 to 2006) in Lilacs, Medline
and SciELO databases of clinical studies with used placebo and it was analyzed
their principles and ethical acceptation, considering the mentioned resolution.
Keywords
Brazil; Human Being; Placebo.
INTRODUÇÃO
Desde o Código de Nuremberg(1), iniciou-se uma reflexão sobre a ne-
cessidade de se estabelecer limites com diretrizes morais, legais e éticas em
experimentos envolvendo seres humanos, quase a totalidade dos documen-
tos, internacionais ou nacionais, enfatiza a proteção do sujeito no plano de
pesquisa especialmente na área médica, com a finalidade de impedir abu-
sos em pesquisas desta natureza(2).
Posteriormente, com a Declaração de
Helsinque
(3) outros documentos
de natureza ética, assim como revisões da própria Declaração pela Associa-
ção Médica Mundial, foram produzidos para a melhoria da qualidade de
vida, proteção e dignidade de sujeitos de pesquisas médicas(4).
Neste sentido, o Conselho Nacional de Saúde aprovou em 10 de outu-
bro de 1996 a Resolução CNS n. 196(5), sobre ética em pesquisa envolvendo
(1) TRIALS of war criminals before the Nuremberg military tribunals under Control Council Law n. 10.
Washington: Government Printing Office
, v. 2, p.181-182, 1949.
(2) FORTES, P. A. C. As pesquisas em seres humanos.
Cadernos de Ética em Pesquisa
, Brasília,
v.1, n. 2, p. 22, 1998.
(3) WORLD MEDICAL ASSOCIATION. Declaration of Helsinki. Recommendation guiding physicians
in biomedical research involving humans subjects.
JAMA
, Chicago, v. 277, n.11, p. 925-926, Mar.
1997.
(4) SARDENBERG, T. et al. Análise dos aspectos éticos da pesquisa em seres humanos contidos
nas Instruções aos autores de 139 revistas científicas brasileiras.
Revista da Associação Médica
Brasileira
, São Paulo, v. 45, n. 4, p. 295-302, 1999.
(5) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos.
Brasília: Conselho Nacional de Saúde, 1996. Disponível em:
sao/conep/resolucao.html>. Acesso em: 20 nov. 2007.
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seres humanos, atualizada, e que atende às necessidades de evolução da
ciência e tecnologia do país e principalmente garante a proteção e dignida-
de aos sujeitos da pesquisa. Nela se definem referências éticas (de reflexão
e diretrizes quanto ao julgamento de valores, para o responsável da pesqui-
sa, a instituição e o patrocinador), assegurando o compromisso ético e os
direitos do sujeito da pesquisa. Com o objetivo de fazer cumprir essas nor-
mas foram criados o Conselho Nacional de Ética em Pesquisa — CONEP e
os Comitês de Ética em Pesquisa — CEP, para funcionarem como controle
social do sistema de avaliação de pesquisa. Em 2004, o país tinha 415 CEP
sob cadastro no sistema(6).
Entre os aspectos éticos da Resolução CNS n. 196/96, a restrição para
o uso de placebo em pesquisas envolvendo seres humanos é de “ter plena-
mente justificada, quando for o caso, a utilização de placebo, em termos de
não maleficência e de necessidade metodológica”, item III.3f(7).
A Declaração de
Helsinque
(8) define a utilização em qualquer estudo
médico do melhor método existente de diagnóstico e terapêutica para cada
paciente, incluindo os do grupo-controle, se houver esse grupo no estudo,
não excluindo o uso de placebos inertes em estudos nos quais não existam
métodos diagnósticos ou terapêuticos comprovados.
Em 2002, fez-se uma Nota de Esclarecimento sobre o Parágrafo 29, à
revisão da Declaração de
Helsinque
da 52ª Assembléia Geral da AMM (As-
sociação Médica Mundial), Anexo II, referente ao uso de placebo no qual
constam os cuidados extremos com o uso do placebo, que, em geral, só
pode ser usado no caso de inexistência de terapia, além de haver necessi-
dade de uma apropriada revisão ética e científica do estudo. Nesta nota,
consta ainda que pesquisas são eticamente aceitáveis por sérias razões
metodológicas e científicas para determinar a eficácia ou a segurança de um
método profilático, diagnóstico ou terapêutico ou quando um método profilá-
tico, diagnóstico ou terapêutico estiver sendo pesquisado por condição irre-
levante e que não oferece risco adicional de danos sérios e irreversíveis aos
pacientes a administração do placebo(9).
Há importância no uso do placebo em pesquisas de novos medica-
mentos, principalmente pelo interesse econômico e de desenvolvimento das
indústrias farmacêuticas. Porém, justifica-se o uso de placebo na compara-
(6) FREITAS, C. B. D.; LOBO, M.; HOSSNE, W. S. Oito anos de evolução: um balanço do Sistema
CEP-CONEP.
Cadernos de Ética em Pesquisa
, Brasília, v. 6, n. 16, p. 20-30, 2005. Disponível em:
. Acesso em: 20 nov. 2007.
(7) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos
,
cit.
(8) WORLD MEDICAL ASSOCIATION. Declaration of Helsinki. Recommendation guiding physicians
in biomedical research involving humans subjects, cit.
(9) OLIVEIRA, G. G.
Ensaios clínicos
: princípios e práticas. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.
p. 255-256.
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ção no tratamento com o novo fármaco, se não houver tratamento mínimo e
de eficácia comprovada para a doença(10).
Os avanços na área de pesquisa clínica estão cada vez mais eviden-
tes, a ética e o sujeito de pesquisa são assuntos discutidos em universidades
e instituições públicas e privadas, já existindo casos nos quais o CONEP não
aprova pesquisas clínicas, onde o medicamento em teste for comparado
com um placebo, sendo o grupo controle tratado com outro medicamento já
utilizado, permitindo que o sujeito de pesquisa receba tratamento(11).
Diante dessas disposições, este estudo visa verificar se, na vigência
da Resolução CNS n. 196/96(12), pesquisas brasileiras editadas que envolve-
ram o uso de placebo têm aplicado a legislação na avaliação e no julgamen-
to de valores.
I. MATERIAIS E MÉTODOS
Publicações de artigos científicos completos de estudos clínicos no Brasil,
de janeiro de 1997 a janeiro de 2006, foram localizadas por meio das seguintes
bases de dados:
SciELO
(
SciELO — Scientific Electronic Library Online em http://
www.SciELO.br),
Medline
(base de dados criada e mantida pela
National Library
of Medicine
— NLM, em http://www.ncbi.nlm.nih.gov) e
Lilacs
(Literatura Latino-
Americana e do Caribe em Ciências da Saúde em https://www.bireme.br).
Os descritores utilizados foram: “placebo”, “seres humanos” (“ser hu-
mano” ou “
humans
”) e “Brasil” (ou
Brazil
).
De acordo com as referências bioéticas como: autonomia, beneficên-
cia, não-maleficência e justiça, constantes na Resolução CNS n. 196/96(16),
foram avaliados os artigos selecionados. Igualmente, utilizando-se como
base o item III da Resolução citada que abrange a ética no uso de placebos,
os artigos foram avaliados segundo aspectos envolvendo: a) objeto do estu-
do; b) tipo de estudo realizado e efeito placebo; c) aprovação por Comitê de
Ética; d) sujeito da pesquisa; e e) alegações que justificam o uso do placebo.
Verificou-se o objeto de cada estudo, categorizando-os em “farmácos
novos”, “fármacos já registrados, fase 4” e “fármacos registrados, mas para
uso diferente do registro”. Foram consideradas as áreas de pesquisa, as
áreas temáticas (Resolução CNS n. 196/96, VIII-4), o tipo de estudo realiza-
do (multicêntrico, cego, duplo-cego, simples-cego, randomizado, assim como
a presença de efeito placebo nos resultados obtidos)(13).
(10) COMISSÃO NACIONAL DE ÉTICA EM PESQUISA. A CONEP responde: Três questões básicas.
Cadernos de Ética em Pesquisa
, Brasília, v. 1, n. 2, p. 4-6, 1998.
(11) PINTO M.
Relatório setorial final
: setor farmacêutico — Lab. Nacionais. Rede DPP FINEP, 2004.
Disponível em: . Acesso em: 20 abr. 2007.
(12) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos
,
cit.
(13) Id. Ibid.
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Os artigos foram agrupados em relação àqueles que informaram se a
pesquisa foi aprovada por Comitê de Ética e selecionada considerando o
ano de edição. Quanto à proteção do sujeito de pesquisa, observou-se se
o artigo informou o uso do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ou
equivalente e se houve tratamento de recuperação (medicação de resgate).
A justificativa do uso do placebo foi definida conforme as diretrizes aci-
ma assinaladas, caso esta informação não constasse de forma clara no artigo.
Os critérios de exclusão aplicados na estratégia de busca eletrônica e
manual dos artigos foram: 1) artigos de revisão bibliográfica; 2) artigos de
estudos que não envolviam seres humanos; 3) artigos que mencionavam o
Brasil, mas o estudo não ocorreu no país; 4) artigos com mais de um registro
nas bases de dados e, nestes casos, utilizou-se a base de dados
Lilacs
como
referência, pois se trata de uma base do Sistema BIREME e que compreende
a literatura relativa às Ciências da Saúde, incluindo a Literatura Latino-Ameri-
cana e do Caribe(14); e 5) artigos incompletos que não puderam ser acessados
eletronicamente ou pelo sistema de comutação de artigos entre bibliotecas.
II. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados das buscas nas três bases de dados utilizando-se os
descritores informados permitiram a localização de 218 artigos científicos
completos (Tabela 1), envolvendo estudos clínicos com emprego de grupo
controle-placebo e realizados no Brasil, indexados no período de janeiro de
1997 a janeiro de 2006.
Tabela 1. Número de artigos indexados em bases de dados de estudos
clínicos com emprego de grupo controle-placebo no Brasil;
janeiro de 1997 a janeiro de 2006
(14) BIREME/OPAS/OMS.
Biblioteca Virtual em Saúde e o controle bibliográfico da produção cientí-
fica da América Latina e Caribe
: o sistema e bases de dados
LILACS
. São Paulo: Bireme, 2006.
Disponível em:
Lilacs
>. Acesso em: 30 maio 2006.
Base de
dados
Lilacs
Medline
SciELO
Total
Total de
artigos (1)
1541
115.584
214
116.633
Total de
artigos com
descritores (2)
444
192
61
697
Artigos
incluídos (n)
152
64
02
218
Percentual de
incluídos (%)
69,7
29,4
0,9
100
NOTA: (1) Descritor placebo. (2) Descritores: placebo, Brasil ou
Brazil
e ser humano
ou
human
.
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A escolha das bases bibliográficas
Lilacs
,
Medline
e
SciELO
para este
trabalho deveu-se à abrangência nacional e internacional na área da saúde
destas bases.
Observa-se na Tabela 1 que a maioria dos artigos foram divulgados na
base de dados
Lilacs
(69,7%), sendo assim considerada a base de referência.
O Brasil é maior colaborador da
Lilacs
, tendo contribuído com média ponde-
rada anual de 13.366 registros, o que representa 52,6% da contribuição total
e, em 2005, a contribuição do país chegou a 63,2%. A
Lilacs
constitui-se no
principal índice bibliográfico da Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), fato que
se justifica por estar voltada para a divulgação da literatura científica produ-
zida na América Latina e no Caribe na área de Ciências da Saúde. Desde
sua criação em 1982, vem ampliando significantemente o número de perió-
dicos e outros documentos indexados. Algumas revistas indexadas na
Lilacs
estão disponíveis em texto eletrônico na
SciELO
, havendo assim registros
múltiplos de 59 artigos do total de 61(15).
A base de dados
Medline
contém citações bibliográficas e resumos de
artigos editados em mais de 4.000 revistas biomédicas dos Estados Unidos
e de 70 países, com mais de 10 milhões de referências bibliográficas, desde
1966(16). Esta base representou neste levantamento 29,4% dos artigos avalia-
dos, dos quais, 19,3% (37 artigos do total de 192) eram artigos também
registrados na base de dados
Lilacs
. Por outro lado, 31 artigos da
Lilacs
foram identificados na base
Medline
. A Bireme colabora com a base de
dados
Medline,
indexando artigos. Em 2006, foram 1.640 artigos de revistas
para esta base de uma média mensal de 328 artigos(17).
As bases de dados revelam, segundo o primeiro descritor “placebo”,
um número de registros elevado, 116.633 artigos. No entanto, quando se
adiciona o segundo descritor “Brasil” ou “
Brazil
”, o número total reduz consi-
deravelmente para 697 artigos (Tabela 1). Os limites definidos, assim como
os critérios estabelecidos no estudo, delimitaram a busca e apontaram que
alguns estudos foram realizados no Brasil, mas, por serem pesquisas multi-
cêntricas, os dados não foram somados aos estudos no país de origem.
Ademais, por não estar explícito em alguns artigos que o Brasil teve partici-
pação no experimento não foram considerados no trabalho.
Dos 142 registros bibliográficos que não tinham disponibilidade ele-
trônica na íntegra ou pelo sistema de comutação de artigos entre bibliotecas,
83 artigos eram teses de doutorado ou mestrado, o que impediu a inclusão
neste trabalho.
(15) PINTO M., op. cit.
(16) PELLIZZON, R. F.; POBLACIÓN, D. A.; GOLDENBERG, S. Pesquisa na área da saúde: seleção
das principais fontes para acesso à literatura científica
. Acta Cirurgica Brasileira
, v.18, n. 6, 2003.
(17) BIREME/OPAS/OMS.
Biblioteca Virtual em Saúde e o controle bibliográfico da produção cientí-
fica da América Latina e Caribe
: o sistema e bases de dados
LILACS
, cit.
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A quantidade total de artigos incluídos de acordo o período estabeleci-
do é pequena (218), considerando que o índice anual de crescimento de
pesquisa clínica no período de 1997 a 2001 foi superior a 10% ao ano,
segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA — 2003). Além
disso, somente em 2002(18), 846 projetos foram aprovados pelo CONEP. Ob-
servou-se que o número de pesquisas realizadas no período de 1999 a 2000
cresceu 71%, segundo o CONEP com o início do controle social definido
pela Resolução CNS n. 196/96(19); mas, esses números não refletem na pro-
dução científica nacional avaliada nesse estudo com base nos limites seleci-
onados.
Em outubro de 2005, a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal
de Ensino Superior (Capes) divulgou dados sobre a produção científica bra-
sileira que cresceu 15% em 2004. E, segundo o documento, quanto à impor-
tância das pesquisas clínicas feitas no país, os cientistas garantem que o
aumento não foi apenas quantitativo, mas, também, qualitativo(20).
O crescimento científico foi também confirmado por edições realizadas
por especialistas como o
Institute for Scientific Information
(ISI, Filadélfia,
EUA):(21)
Entre os 30 países mais destacados no
ranking
da ciência mundial os
quais são responsáveis por 90% dessa produção, o crescimento do
Brasil, em tão curto espaço de tempo, só foi menor do que o de alguns
poucos países desse conjunto, que também tiveram crescimento ex-
cepcional: Coréia do Sul, Taiwan, China, Espanha e Turquia.
Verificou-se pelo levantamento apresentado que no período de janeiro
de 1997 a janeiro de 2006 o crescimento da produção científica nacional foi
intenso; porém, não foi possível confirmá-lo por meio dos descritores e limi-
tes utilizados nessa pesquisa, portanto, a produção científica nacional não
está nítida neste estudo.
Uma das razões para explicar o crescimento da produção científica
brasileira é a constância de investimentos internos em pesquisa e desenvol-
vimento nos últimos anos e também o aperfeiçoamento das instituições de
pesquisa, além de mudanças decorrentes de fusões políticas adotadas pe-
(18) VILARDAGA, V. Autorização para testes clínicos com brasileiros cresce 10% ao ano.
Revista
Pesquisa FAPESP
, São Paulo, n. 83, jan. 2003. Disponível em: .
Acesso em: 20 abr. 2007.
(19) LEITE, F.; SILVA, J. C. Em nome da ciência: Brasil já tem 500 mil “cobaias” humanas.
Folha de
S. Paulo
, São Paulo, 29 jun. 2001.
(20) ACADEMIA BRASILEIRA DE REUMATOLOGIA. A Produção Científica Brasileira.
Boletim Acadêmico
— ABR
, Recife, v. 6, n. 1, p. 4-5, jan./mar. 2006. Disponível em:
boletim/boletim11.pdf>. Acesso em: 20 nov. 2007.
(21) GUIMARÃES, J. A. A pesquisa médica e biomédica no Brasil: comparações com o desempenho
científico brasileiro e mundial.
Ciência & Saúde Coletiva
, Rio de Janeiro, v. 9, n. 2, p. 303-327, 2004.
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las fundações nacionais como o Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico — CNPq e a Capes(22).
Entre os artigos analisados, destacam-se alguns dados, especialmente
o ano de edição e as regiões do Brasil onde foram realizados os estudos.
Notou-se que 61,0% das publicações concentraram-se de 2002 a 2005. Além
disso, 37,6% das pesquisas foram realizadas nos Estados de São Paulo e do
Rio de Janeiro. Na região Sudeste, concentra-se a maioria das universida-
des que desenvolvem estudos clínicos e também uma grande quantidade de
CEP (241), representando 58,1% dos Comitês do país em 2005(23).
Da análise dos dados, observou-se que a área médica é onde se reúne
a maioria dos estudos, sendo que as especialidades que divulgaram pesquisas
com placebo, considerando seus limites, foram as de Neurologia e Psiquiatria
(26,2%), Imunologia (9,6%), Odontologia (7,8%) e Ginecologia (6%).
A avaliação quanto à presença de efeito placebo foi constatada em
8,7% (19 edições) do total dos artigos analisados. Destes, 6 trabalhos eram
da especialidade médica de Neuropsiquiatria (psicofármaco), que vem utili-
zando e debatendo intensamente o uso do placebo. As agências regulado-
ras dos Estados Unidos, do Japão e a comunidade científica internacional
defendem o uso do grupo controle-placebo em pesquisas que utilizam psi-
cofármacos, sendo considerado indispensável para a determinação de tra-
tamentos eficazes nos transtornos mentais. A alegação para o uso do grupo
controle-placebo deve-se às possíveis interferências de fatores específicos
durante um estudo com outros fármacos e um psicofármaco. Porém, é neces-
sária sempre a avaliação ética quanto ao uso, assim como um termo de
consentimento livre e esclarecido, elaborado e aplicado de forma correta,
garantindo-se ao sujeito da pesquisa o entendimento quanto ao seu risco-
benefício(24).
Levando em consideração o item VIII-4c da Resolução CNS n. 196/96(25)
que dispõe das atribuições da CONEP em aprovar e acompanhar os protoco-
los de pesquisa em áreas temáticas especiais, todos os artigos foram enqua-
drados na área temática 3, ou seja, a maioria são estudos que envolvem
fármacos, medicamentos, vacinas e testes diagnósticos novos (fases I, II e III)
ou não registrados no país (ainda que na fase IV). Há ainda estudos referentes
ao uso com modalidades, indicações, doses ou vias de administração diferen-
tes daquelas estabelecidos, incluindo emprego em combinações.
(22) ZORZETTO, R. et al
.
The scientific production in health and biological sciences of the top 20
Brasilian Universities.
Brazilian Journal of Medical and Biological Research
, São Paulo, v. 39, n.12,
p. 1513-1520, 2006.
(23) FREITAS, C. B. D.; LOBO, M.; HOSSNE, W. S., op. cit.
(24) VERSIANI, M. A necessidade do Grupo-Controle com placebo em pesquisas sobre a eficácia de
tratamentos psiquiátricos.
Revista Bioética
, Brasília, v. 8, n. 1, p. 29-42, 2000.
(25) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos, cit.
Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
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Na Tabela, 2 apresenta-se os resultados referentes ao objeto do estu-
do: edições com citações quanto à “fármaco novo”, “fármaco já registrado,
fase 4” e “fármaco já registrado, mas, não para o fim estudado”, resultando
maior número de estudos com fármacos registrados (81,2%). As pesquisas
realizadas na fase 4 abrangem experimentos pós-registro do produto e/ou
da especialidade medicinal, podendo ser estudos de vigilância pós-registro,
para estabelecer o valor terapêutico, o surgimento de novas reações adver-
sas e/ou confirmação da freqüência de surgimento das já conhecidas e as
estratégias de tratamento, aplicando as normas éticas e científicas das de-
mais fases(26). Entre os fármacos registrados observou-se que 54,7% dos
artigos referiam-se a estudo de comprovação terapêutica e não menciona-
vam outras características da fase 4, como surgimento de reações adversas
e estratégias de tratamento.
Tabela 2. Número de edições com citações sobre “fármacos novos”,
“fármacos já registrados, fase 4” e “fármacos já registrados,
mas para uso diferente do registro”
A Tabela 3 refere-se ao “tipo de estudo realizado”, informando a preva-
lência de estudos “duplo-cego” (80,3%), desejável, pois, reduz o risco de
interferências(27).
Objeto do estudo
Fármaco novo
Fármaco já registrado, fase 4
Fármaco já registrado, mas para uso diferente do
registro
Outros (vacinas e testes diagnósticos novos)
Total
Artigos (n)
25
94
83
16
218
Porcentual (%)
11,5
43,1
38,1
7,3
100
(26) BRASIL. Ministério da Saúde. Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Considerações e
definições para Pesquisa Clínica. [s.d.]. Disponível em:
pesquisa/def.htm>. Acesso em: 20 mar. 2006.
(27) CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DE HARMONIZAÇÃO. Manual para boas práticas clínicas:
versão Harmonizada Tripartite (USA, Europa e Japão). Tradução de Marion Roussel, 1996. Disponí-
vel em: . Acesso em: 30 maio 2006.
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40
Tabela 3. Número de edições com citações sobre o tipo de estudo:
cego ou duplo-cego, “randomizado” e multicêntricos
Estudos controlados ao acaso (randomizados) foram descritos em
94,0% (Tabela 3) das edições, mas as pesquisas que não informaram a
distribuição ao acaso, “randomização”, (5,9%) podem ter falhas, sendo ou
não exigência da revista este dado para divulgação, que consta no Manual
de Boas Práticas Clínicas(28). A “randomização” é reconhecida como cientifi-
camente desejável para se avaliar um tratamento novo, devendo ser realiza-
da eticamente somente quando os sinais e sintomas que o sujeito de pesqui-
sa poderia apresentar não causariam nenhum dano irreversível(29).
Os estudos multicêntricos são recomendados e de importância para a
pesquisa, pois utilizando o mesmo protocolo pode-se obter resultados di-
versos em centros diferentes, o que é estatisticamente melhor que dados
obtidos de único experimento, uma vez que se observa diversidade e maior
quantidade de pacientes para o estudo(30). Porém, pode-se ver nos resulta-
dos da Tabela 3 que apenas 12,4% dos estudos são multicêntricos, enquan-
to 45,9% dos artigos não citam onde a pesquisa foi realizada. Os protocolos
do exterior submetidos aos Comitês de Ética em Pesquisa geralmente estão
prontos(31), o que pode ser a razão pela não inclusão do Brasil na edição da
pesquisa. É importante que estudos multicêntricos internacionais informem
os países participantes, fato este não considerado na legislação nacional e
internacional, mas relevante para saber o que de fato ocorre no país quanto
à pesquisa em seres humanos.
A aprovação do estudo por “Comitê de Ética” foi informada com frequên-
cia nas edições como consta na Tabela 4, em 75,2% dos artigos, seguindo a
exigência da Resolução CNS n. 196/96(32), o que reflete a importância da
legislação vigente e o seu cumprimento, uma vez que toda pesquisa envol-
vendo seres humanos deve ser submetida à apreciação de um Comitê de
Ética. As edições que não citam a aprovação por Comitê de Ética, 24,8%,
podem não se enquadrar nas exigências e normas (Instruções aos autores)
Tipo de estudo
Artigos (n)
Porcentual (%)
Cego
13
5,9
Duplo-cego
175
80,3
Randomizado
205
94,0
Multicêntricos
27
12,4
(28) Op. cit.
(29) LEWIS, J. et al.
Placebo-controlled trials and the Declaration of Helsinki.
Lancet
, London,
v. 359, n. 9314, p. 1337-1340, 2002.
(30) HOSSNE, W. S.; VIEIRA, S. Pesquisas com cooperação estrangeira: qual cooperação?
Cader-
nos de Ética em Pesquisa
, Brasília, v. 6, n. 14, p. 3-5, 2004. [editorial].
(31) Id. Ibid.
(32) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos, cit.
Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
Cristina Esteves Jordão/Poliana R. Mêdola/Luciane C. Lopes/Pedro Lui s Rosalen
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para divulgação em revistas. Algumas delas solicitam informação sobre a
aprovação por Comitê de Ética, não se exigindo que isso conste no artigo.
Convém salientar que os estudos internacionais também devem ter a apro-
vação por Comitê de Ética, conforme a Declaração de Helsinque(33).
Tabela 4. Número de edições com citações sobre a aprovação do
estudo por Comitê de Ética e obtenção de Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TCLE)
Informam aprovação
por Comitê de Ética
164
75,2
Obtenção de TCLE
163
74,8
Artigos (n)
Porcentual (%)
Normas relativas à ética da pesquisa em seres humanos contidas nas
“instruções aos autores de revistas de Ortopedia e Traumatologia” foram
estudadas e observou-se que 52,6% não faziam referência a aspectos éti-
cos(34), assim como estudo de revistas de Medicina e Biomedicina de Língua
Inglesa não apresentaram referência à ética nas “Instruções aos Autores” em
24% dos estudos(35). Na área de saúde no Brasil, 139 revistas científicas
brasileiras foram analisadas e apenas 20,8% apresentaram referências éti-
cas nas Instruções aos Autores(36). De acordo com esses dados conclui-se
que aspectos éticos devem ser enfatizados nas “Instruções aos Autores”
assim como deve ser observado por eles no momento da submissão do
artigo, evitando assim que sejam divulgados de forma não ética.
Quanto ao “sujeito de pesquisa e sua proteção” foram verificados os
artigos que informaram se os pacientes da pesquisa assinaram o “Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido” (TCLE) antes da participação no estudo.
Verifica-se pela Tabela 4 que 74,8% das edições informaram a assinatura,
exigência da Resolução CNS n. 196/96(37) cumprida, sendo indispensável
para a realização da pesquisa.
No porcentual de artigos que informaram a assinatura do TCLE, foram
consideradas as formas alternativas de obtenção do termo de consentimen-
(33) WORLD MEDICAL ASSOCIATION. Declaration of Helsinki. Recommendation guiding physicians
in biomedical research involving humans subjects, cit.
(34) SARDENBERG, T. et al. Análise dos aspectos éticos da pesquisa em seres humanos contidos
nas Instruções aos autores de 139 revistas científicas brasileiras, cit.
(35) AMDUR, R. J.; BIDDLE, C. Institutional review board approval and publication of human research
results.
JAMA
, Chicago, v. 277, n. 11, p. 909-914, 1997.
(36) SARDENBERG, T. et al., op. cit., p.295-302.
(37) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
Diretrizes e normas regulamentadoras sobre pesquisa envolvendo seres humanos, cit.
Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
Uso de Placebo em Experimentos Clínicos Envolvendo Seres Humanos...
42
to e entre os artigos que não informaram incluem-se os que não realizaram
por se tratarem de estudos psiquiátricos autorizados pelos CEPs. Entretanto,
o percentual de 25,2% é elevado para não se informar a existência de TCLE
ou equivalente. Esta é uma das informações que necessita ser avaliada
pelos pesquisadores e editores das publicações, apesar da maioria das
“Instruções aos Autores” não exigir a declaração de TCLE.
A possibilidade de uso de medicação de resgate nos estudos está
indicada em 59,2% dos artigos (Tabela 5), mas, apenas, 25,7% informaram
o uso quando aplicado. O uso de medicação de resgate, com a finalidade de
proteção ao sujeito de pesquisa(38), pode ser necessário em caso de interrup-
ção de tratamento por algum motivo ou de alguma reação adversa.
Tabela 5. Número de edições com citações sobre
a possibilidade de uso de medicação de resgate
Medicação
de resgate
Aplica-se
Quando aplicável, existe informação
Quando aplicável, não existe informação
Não se aplica
Artigos(n)
129
56
73
89
Porcentual(%)
59,2
25,7
33,5
40,8
Os sujeitos de pesquisa estavam isentos de tratamento na maioria das
edições (85%) e, em 6,4%, eram voluntários sadios. Várias alterações na
Declaração de Helsinque foram propostas; porém, não aceitas quanto ao
uso do placebo. Em 2000, assegurou-se que “no final do estudo todos os
doentes devem continuar a ter acesso aos melhores métodos de tratamento
identificados no estudo”(39). Desvios nas normas preestabelecidas para solu-
ção de questões de saúde urgentes serão permitidos pelas Comissões de
Ética desde que os requisitos éticos na condução dos ensaios clínicos não
sejam diminuídos, sendo considerada urgente a disponibilidade de produ-
tos eficazes que já existam a todos que deles necessitem.
Considerando as diretrizes éticas avaliadas, 88,5% continham a justi-
ficativa do uso do placebo e os demais artigos (11,5%) não justificavam, pois,
tanto a metodologia utilizada, como os resultados, não foram subsídios sufi-
cientes para tal(40).
(38) LEWIS, J. et al., op. cit., p.1337-1340.
(39) LIMA, C. Ensaios clínicos: vulnerabilidade e relativismo ético.
Acta Medica Portuguesa
, Lisboa,
v. 18, p. 221-226, 2005. Disponível em:
221-226.pdf>. Acesso em: 20 mar. 2007.
(40) EMANUEL, E. J.; MILLER,
F. G.
The ethics of placebo-controlled trials-a middle ground.
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New England Journal of Medicine
, Boston, v. 345, n. 12, p. 915-919, sept. 2001.
Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
Cristina Esteves Jordão/Poliana R. Mêdola/Luciane C. Lopes/Pedro Lui s Rosalen
43
No período de 2002 a 2004, foram analisados 636 projetos, pelo CONEP,
sendo 42 reprovados. Entre esses, 7 (16,6%) não continham razão ética
para o uso de placebo, ou
washout
(justificativa inaceitável)(40). Sugere-se
que, pelo mesmo motivo de reprovação aplicado pelo Conep, 25 artigos
(11,5%) não deveriam ter sido aprovados por Comitê de Ética, em primeira
análise, pois implica na não observância da legislação e na não proteção do
sujeito de pesquisa. No entanto, há de se considerar que nenhuma norma ou
lei vai impedir eventuais abusos em pesquisa e problemas de natureza ética
são os principais motivos de reprovação de projetos, incluindo o uso do
placebo(42).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na análise dos artigos científicos, observaram-se informações limita-
das sobre as pesquisas, dificultando assim a avaliação ética do experimen-
to. A forma de edição dos artigos científicos também interferiu no trabalho,
não contendo a justificativa para o uso do placebo.
A conduta ética de todas as pesquisas realizadas deve estar presente
não somente entre os responsáveis pelo estudo, mas, também entre as agên-
cias reguladoras, patrocinadores de pesquisa, instituições de revisão e edi-
tores de revistas, que devem sempre contestar o uso do placebo e exigir
explicação para seu uso em cada protocolo e edição da pesquisa, evitando
que estudos não-éticos sejam divulgados(43).
A repercussão da Resolução CNS n. 196/96 foi verificada segundo
suas diretrizes e conclui-se o cumprimento em vários aspectos, mas, não no
total das edições, indicando o não cumprimento da norma em pelo menos
11,5% dos casos.
Diante das disposições e resultados apresentados, conclui-se que a
maioria dos ensaios clínicos realizados no Brasil respeita a Resolução CNS
n. 196/96(44). Porém, ainda há a necessidade de maior rigor no cumprimento
dos preceitos éticos quanto ao uso de grupo controle-placebo que promove-
rão a proteção devida aos sujeitos da pesquisa. Além disso, cuidados por
parte dos pesquisadores e do Comitê de Ética devem ser intensificados,
pois, existem estudos que não justificam o uso do placebo.
(41) FREITAS, C. B. D.; LOBO, M.; HOSSNE, W. S., op. cit.
(42) SILVA, J. C. Para Conep, só norma não impede abuso de pesquisas com humanos.
Folha de S.
Paulo
, São Paulo, 29 jun. 2001.
(43) ROTHMAN, K. J.; MICHELS, K. B. The continued unethical use of placebo controls.
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(44) BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde.
Resolução n. 196/1996, de 10 de
outubro de 1996.
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Revista de Direito Sanitário, São Paulo v. 9, n. 2 p. 31-46 Jul./Out. 2008
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