Ações de reintegração de posse contra o movimento dos trabalhadores sem teto: dicotomia entre propriedade e direito à moradia / Actions of reintegration of possession against the movement of homeless workers: dichotomy between property and right...

AutorRafael de Acypreste, Alexandre Bernardino Costa
CargoDoutor em Direito em Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor adjunto da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. E-mail: abc.alexandre@gmail.com - Mestre em Direito pela Universidade de Brasília. Professor do Instituto de Ensino Superior Planalto - IESPLAN. E-mail: rafaeldeacyprestemr@gmail.com
Páginas1824-1867
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.23595
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Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721 pp. 1824 - 1867 1824
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De todas as coisas seguras,
a mais segura é a dúvida.
Bertolt Brecht
Nas ações de reintegração de posse contra o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), a
propriedade é o elemento central de proteção do Poder Judiciário. O objetivo do trabalho é
analisar a forma como o Poder Judiciário lida com conflitos fundiários urbanos dos quais faz parte o
referido Movimento Social. A partir da teoria fundamentada nos dados, analisa-se todas as ações
de reintegração de posse contra o MTST de 2001 a 2014. Essa metodologia permite identificar
propriedades, dimensões, minúcias e singularidades das decisões com base em comparações
sistemáticas entre os dados. A literatura jurídica levantada e o referencial teórico têm por base a
identificação da categoria chave explicativa do conjunto dos dados. Como resultado, percebeu-se
que a proteção da propriedade absoluta é o fundamento principal dos magistrados nas ações de
reintegração de posse. As categorias constitucionais do direito à moradia e da função social da
propriedade são pouco exploradas pelos juízes. Há, também, inconsistências processuais nas
decisões e baixa preocupação com a fundamentação fática e jurídica da posse exercida pelos
proprietários. Conclui-se que o Poder Judiciário, em relação ao objeto de análise, desconsidera o
interesse social subjacente aos processos, para proteger a propriedade em seu formato liberal e
absoluto.
-Direito à moradia. Função Social da Propriedade. Propriedade. Movimento Social
Urbano. Poder Judiciário.
In repossession actions against the Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (Homeless Workers
Movement MTST in portuguese), the property is the central element of the judiciary protection.
The objective is to analyze how the judiciary handles urban land conflicts of which is part of said
Movement Social. From the grounded theory, this paper analyzes all reintegration actions of
possession against MTST since 2001 to 2014. This methodology allows us to identify properties,
dimensions, minutiae and singularities of decisions based on systematic comparisons between the
1 Doutor em Direito em Constitucional pela Universidade Federal de Minas Gerais. Professor adjunto da
Faculdade de Direito da Universidade de Brasília. E-mail: abc.alexandre@gmail.com
2 Mestre em Direito pela Universidade de Brasília. Professor do Instituto de Ensino Superior Planalto -
IESPLAN. E-mail: rafaeldeacyprestemr@gmail.com
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DOI: 10.12957/rdc.2016.23595
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data. The legal literature raised and the theoretical framework are based on the identification of
key explanatory category of all data. As a result, it was realized that the property protection is the
main foundation of the magistrates in repossession actions. The constitutional categories of
housing rights and the social function of property are little explored by the judges. There are also
procedural inconsistencies in decisions and low concern about the factual and legal basis of
ownership exercised by the owners. We conclude that the judiciary, in relation to the object of
analysis, ignores the underlying social interest in their cases to protect property in its liberal and
absolute format.
Right to housing. Social Function of the Property. Property. Urban Social Movement.
Judicial Power.
Revista de Direito da Cidade vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2016.23595
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Revista de Direito da Cidade, vol. 08, nº 4. ISSN 2317-7721 pp. 1824 - 1867 1826
O presente artigo surge das reflexões acerca do trabalho de dissertação de Mestrado em
Direito do primeiro autor, sob orientação do segundo autor. O estudo buscou analisar,
empiricamente, a partir de decisões judiciais, a maneira com que o Poder Judiciário enfrenta os
conflitos fundiários urbanos por moradia levados a cabo pelo Movimento dos Trabalhadores Sem
Teto (MTST). Com isso, coletaram-se todas as decisões de reintegração de posse contra o MTST nos
Estados em que este se faz presente, no período de 2001 (marco da promulgação do Estatuto da
Cidade) a 2014.
O trabalho surge a partir da avaliação de que a ação de reintegração de posse configura-se
como instrumento jurídico e político utilizado, por excelência, pelos proprietários formais de
imóveis ocupados por movimentos sociais urbanos. Em geral, são ocupados imóveis com duas
finalidades: denúncia da demanda por moradia em sentido amplo ou para exposição pública do
não cumprimento da função social da propriedade em determinado terreno. Nesse sentido, o
Poder Judiciário se torna palco principal de resolução de tal conflito, sendo instado a decidir o caso,
dentro de suas competências e a despeito de suas limitações. O tema central no debate jurídico
gira em torno da contradição entre direito de propriedade, de um lado, e direito à moradia, de
outro.
A presente pesquisa também foi elaborada no sentido de dialogar com pesquisas
semelhantes realizadas com base em estudos sobre ações de reintegração de posse. (ABREU, 2011,
2014; DANTAS, 2013; FROTA, 2015; SAULE JÚNIOR; LIBÓRIO; AURELLI, 2009; SCHREIBER, 2000). O
que se pretende no presente artigo é se concentrar em descrever e analisar a prática decisória do
Poder Judiciário relativa ao conflito entre proprietário e um movimento social urbano. A partir
deste, está representado o cerne político da demanda por direito à moradia originado de uma ação
direta de uma organização social. Para isso, a partir da metodologia adotada, busca-se extrair dos
dados o que há de padrão e de baliza para essa mesma prática decisória no contexto de atuação do
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST).
Num primeiro momento, avalia-se que a cidade constitui complexo objeto de estudo e que
esta pesquisa apresenta um esforço nesse sentido, a partir do campo de visão do Direito, mas em
diálogo com outros campos do conhecimento. Henri Lefebvre, referência para os estudos de direito

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