O acordo de não persecução cível na nova sistemática da lei de improbidade administrativa: exame das alterações impostas pela lei n° 14.230/21 à luz da jurisprudência do supremo tribunal federal

AutorHumberto Dalla Bernardina de Pinho
CargoProfessor Titular de Direito Processual Civil na UERJ
Páginas181-204
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP.
Rio de Janeiro. Ano 17. Volume 24. Número 1. Janeiro-abril de 2023
Periódico Quadrimestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira (in mem.). ISSN 1982-7636. pp. 181-204
www.redp.uerj.br
https://creativecommons.org/licenses/by/4.0/
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O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO CÍVEL NA NOVA SISTEMÁTICA DA LEI DE
IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA: EXAME DAS ALTERAÇÕES IMPOSTAS
PELA LEI N° 14.230/21 À LUZ DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL1
THE CIVIL NON-PROSECUTION AGREEMENT ACCORDING TO THE NEW
ADMINISTRATIVE MALFEASANCE LAW: EXAM OF THE NEW RULES BROUGHT
BY LAW No. 14.230/21 AND THE JURISPRUDENCE
Humberto Dalla Bernardina de Pinho2
RESUMO: O texto examina a figura do acordo de não persecução cível, a partir de sua evolução desde o advento
da Lei n° 8.429/92 até as novas disposições trazidas pela Lei n° 14.230/2021. São examinados os principais
posicionamentos trazidos pela doutrina e jurisprudência, bem como apontadas as questões que já se mostram
controvérsias, diante da complexa regulamentação do tema mediante o emprego de uma pesquisa bibliográfica,
jurisprudencial e exame an alítico dos textos legais. Neste sentido, é possível concluir que, apesar de a legislação
brasileira ter evoluído nos últimos anos em matéria de acordos envolvendo direitos indisponíveis, especialmente
na seara da improbidade administrativa, ainda enfrenta questões controvertidas e é silente em pontos relevantes, o
que permite ao Conselho Nacional do Ministério Público preencher essas lacunas normativas.
PALAVRAS-CHAVE: Improbidade administrativa; Lei n° 14.230/2021; STF; sistemática.
ABSTRACT: The tex t examines the figure of the civil non-prosecution agreement, from it s evolution since the
advent of Law No. 8,429/92 to the new provisions brought by L aw No. 14,230/2021. The main positions brought
by the doctrine and jurisprudence are examined, as well as the issues that are already controversial, given the
complex regulation of the subject by means of a bibliographical and jurisprudential survey and analytical
examination of the legal texts. In this sense, it is po ssible to conclude that, although Brazilian legislation has
evolved in recent years regarding settlements involving unavailable rights, especially in the area of administrative
misconduct, it still faces controversial issues and is silent on relevant points, which allows the Conselho Nacional
do Ministério Público to fill these regulatory gaps.
KEYWORDS: Administrative malfeasance; Law n° 14.230/2021; Supreme Court; jurisprudence.
1 Artigo recebido em 05/10/2022 e aprovado em 06/11/2022.
2 Professor Titular de Direito Processual Civil na UERJ. Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio
de Janeiro. Doutor e mestre em Direito Processual pela UERJ. Rio de Janeiro/RJ. E-mail:
humbertodalla@gmail.com.
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP.
Rio de Janeiro. Ano 17. Volume 24. Número 1. Janeiro-abril de 2023
Periódico Quadrimestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira (in mem.). ISSN 1982-7636. pp. 181-204
www.redp.uerj.br
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1 INTRODUÇÃO
Já nos debruçamos sobre este tema algumas vezes3. Contudo, diante das constantes
mutações legislativas e regulamentares sobre assunto tão dinâmico, bem como os recentes
entendimentos firmados pelo Supremo Tribunal Federal, é necessário pontuar e atualizar
algumas questões.
Como é de conhecimento geral, em sua redação original, o art. 17, § 1º da Lei n°
8.429/92 vedava qualquer modalidade de transação, acordo ou conciliação nas ações destinadas
a apurar a prática de ato de improbidade. Fruto da mentalidade dominante no fim do século XX,
a solução acordada era vista com desconfiança. A possibilidade de seu uso em questões
relacionadas ao direito público era fortemente rechaçada e, por vezes, vinculada a um
sentimento de ilegalidade ou mesmo de impunidade.
Somente em 2002 o Supremo Tribunal Federal relativizou a regra da
indisponibilidade absoluta do interesse público4. Na sequência, o STJ, em sede de compromisso
de ajustamento de conduta, admitiu, expressamente, o cabimento de solução consensuada no
plano material5.
Nesse sentido, a doutrina também atualizou seu entendimento. Para Angel
Oquendo6, profundo estudioso da evolução do direito latino-americano, a indisponibilidade
3 Ver, por todos: PINHO, Humberto Dalla Bernardina de. Acordos materiais e processuais nas ações civis públicas
fundadas em atos de improbidade admin istrativa. In: PINHO, Hu mberto Dalla Bernar dina de. Coletivização e
Unidade do Direito. Londrina: Toth, 2019, pp. 269/287, p. 283.
4 "Poder Público. Transação. Validade. Em regra, os bens e o interesse público são indisponíveis, porque
pertencem à coletividade. É, por isso, o administrador, mero gestor da coisa pública, n ão tem disponibilidade
sobre os interesses confiados à sua guarda e realização. Todavia, há casos em que o princípio da indisponibilidade
do interesse público d eve ser atenuado, mormente quando se tem em vista que a solução adotad a pela
Administração é a que melhor atenderá à ultimação deste int eresse”. STF. Pleno. recurso extraordinário nº 253-
885-0/MG, Rel. Min. Ellen Gracie, DJ 21.0 6.02. Acórdão disponível na íntegra no site http: //www.stf.jus.br,
acesso em 12.12.20.
5 "Processo civil - Ação civil pública por dano ambiental - Ajustamento de conduta - Transação do Ministério
Público - Possibilidade. 1. A regra geral é de não serem passíveis de transação os direitos difusos. 2. Quand o se
tratar de direitos difusos que importem obrigação de fazer ou não fazer deve-se dar tratamento distinto,
possibilitando dar à controvérsia a melhor solução na composição do dano, quando impossível o retorno ao status
quo ante. 3. A admissibilidade de transação de direitos difusos é exceção à regra. 4. Recurso especial improvido".
REsp 299.400/RJ, 2.a T., j. 01.06.2006, rel. Min. Francisco Peçanha Martins, rel. p/ acórdão Min. Eliana Calmon,
DJ 02.08.2006, p. 229.
6 OQUENDO, Angel. Comparative Reflections nn the Vindication of Rights in Brazil. Revista Eletrônica de
Direito Processual REDP. Rio de Janeiro, ano 15, v. 22, n. 2. maio/ago. 2021, p. 71-88. Disponível em:
www.redp.uerj.br. Acesso em: 15 de março de 2022.

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