Análise de efetividade da participação pública na ANEEL

AutorAlex Cavalcante Alves
Páginas145-204
CAPÍTULO III
ANÁLISE DE EFETIVIDADE DA
PARTICIPAÇÃO PÚBLICA NA ANEEL
A participação pública não pode ser letra morta em normas
e regulamentos: deve ser efetiva. Portanto, à luz dos números
gerais das audiências públicas realizadas pela Agência em recor-
te temporal razoável, bem como da análise pormenorizada de
casos de relevo, busca-se mapear o modus operandi da participa-
ção social na ANEEL, bem como investigar a forma pela qual se
dá a participação por cada grupo de partes interessadas, tratadas
pela literatura da regulação como stakeholders, de modo a veri-
ficar a efetividade da participação dos cidadãos no processo re-
gulatório e propor soluções para sanar as lacunas encontradas.
Para Ernesto Cohen e Rolando Franco, enquanto eficácia é o
grau em que se alcançam as metas de produção de um projeto
em determinado período, independentemente dos seus custos,
enquanto eficiência é a relação que existe entre os produtos, ou
seja, bens e serviços, e os custos dos recursos, traduzidos em in-
sumos e atividades, de um projeto, em relação a um determina-
do padrão. Para que possa ser realizada essa comparação, supõe
a existência de alternativas aptas a entregar produtos com quan-
tidades e especificações similares191.
No que tange à capacidade de gestão, a efetividade é a aptidão
organizacional para ser eficiente e eficaz ao longo do tempo. Exige
115
191 COHEN, Ernesto, FRANCO, Rolando. Gestão social: como obter efi-
ciência e impacto nas políticas sociais. Brasília: ENAP, 2007, p. 102.
identificar oportunidades e ameaças, adequar seus modos opera-
cionais às alterações contextuais, internalizar e fazer uso do apren-
dizado decorrente do acompanhamento, avaliação das ações e o
impacto.192
A efetividade, portanto, guarda dimensão mais ampla e se
preocupa com o impacto, o verdadeiro alcance da política públi-
ca. Nesse sentido, passa-se a verificar, a seguir, o que dizem as
teorias sobre efetividade da participação social e como são utili-
zadas neste trabalho para avaliar a participação pública na
ANEEL.
1. Dialogando com as teorias sobre efetividade da participação
De acordo com Robert Putnam, os sistemas de participação
cívica são forma essencial de capital social, e quanto mais desen-
volvidos forem esses sistemas em uma comunidade, maior a pro-
pensão de seus cidadãos a agir de modo cooperativo. Em sua
obra, Putnam aponta que um histórico de maior tradição em
participação nas instâncias participativas da vida comunitária da
população do Norte da Itália acarretou maior engajamento em
termos de participação e maior desenvolvimento econômico,
enquanto o Sul seria menos avançado em termos de engajamen-
to participativo e desenvolvimento econômico devido a uma
menor existência de capital social, ou seja, de arranjos coopera-
tivos responsáveis pela evolução socioeconômica de uma dada
comunidade, os quais atuam como fatores essenciais para a
construção de relações de confiança193. Valéria Fontoura Nunes,
em obra dedicada a estudar a teoria de Putnam, aponta que, de
acordo com o autor, o capital social das instituições diz respeito
116
192 COHEN, Ernesto, FRANCO, Rolando. Gestão social: como obter efi-
ciência e impacto nas políticas sociais. Brasília: ENAP, 2007, p. 103.
193 PUTNAM, Robert D. Comunidade e democracia: a experiência da Itá-
lia moderna (c/ Robert Leonardi e Raffaela Y. Nanetti; tradução Luiz Alber-
to Monjardim). 5 ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2006.
às redes de compromisso cívico, às normas de confiança mútua
e ao sistema de participação194.
Sherry Arnstein aponta que a questão da participação e con-
trole social, à época de seus estudos sobre o tema, na década de
1960, estava envolta em uma cortina de fumaça retórica, que ca-
muflava os reais graus de participação social. De modo a eluci-
dar a efetividade da participação social, Sherry Arnstein desen-
volveu, em artigo científico publicado em 1969, teoria sobre os
degraus da participação, que, de acordo com a forma como é
concebida, pode estar enquadrada na base da “escada de partici-
pação”, onde se enquadram os estratagemas governamentais
para midiaticamente alegar a existência de participação (tida
por Arnstein como não efetiva ou não-participação), até o topo,
que é o real empoderamento do cidadão em sua interação com
os entes públicos195.
Os “degraus” apresentados por Arnstein são, em síntese, os
seguintes: a) manipulação: forma onde os detentores de poder
doutrinam os representantes da sociedade; b) terapia: quando as
oportunidades de participação se assemelham mais a “terapias
de grupo” onde os detentores de poder tratam as reclamações
por lá compartilhadas como necessidades de apoiamento, com o
poder público assumindo a arrogante postura de tutor, como se
os cidadãos precisassem dessa assistência; c) informação: pri-
meiro passo para participação, a informação aos cidadãos. Toda-
via, não permite participação efetiva, pois é uma via de mão úni-
ca; d) consulta: também passo importante para a participação,
mas não pode se limitar a simplesmente consultar, sem trazer
aquelas contribuições recolhidas para o processo e transformar
em ação efetiva; e) apaziguamento: a aparente inserção dos cida-
117
194 NUNES, Valéria Fontoura. A categoria Capital Social em Putnam: deli-
neando indicadores para a responsabilidade social institucional à Unipampa.
Jundiaí: Paco Editorial, 2015, p. 15.
195 ARNSTEIN, Sherry R. A ladder of citizen participation. In: AIP Journal,
July 1969, p. 216-224.

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