Antecipação parcial do ICMS a constitucionalidade da iniquidade

AutorIldo Fucs
Páginas152-188
1. Introdução
Hoje, aos sete dias do mês de setembro de 2007, de retorno à Cha-
pada Diamantina, novamente estonteado pela posição estratégica e inol-
vidável do cantinho reservado a este autor para a promoção de suas
escrituras, de frente aos milenares maciços de pedra, brinde maravilhoso
da natureza à humanidade, inicia-se, com inspiração, o quinto capítulo
a ser talhado nestes papiros, o primeiro que busca analisar, pormenori-
zadamente, alguns dos instrumentos objetivos postos à disposição do
Estado brasileiro , em menosprezo aos direitos e garantias constitucio-
nalmente sagrados ao cidadão, transformando-o, ilegitimamente, em
gentalha, ralé esmigalhada pelos braços fortes e opressores do controle
fiscal que lhe é cada vez mais imposto rigorosa e impiedosamente.
Sete de setembro! A presente abordagem busca esmiuçar cirurgi-
camente o instituto da Antecipação Parcial do ICMS, tributo de compe-
tência estadual, conforme estabelece a Carta Magna no inciso II do seu
art. 155173, que, em sua versão baiana, terra da magia e da felicidade,
não foi declarada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade no 3.426-0 em mar-
ço de 2007, de relatoria do então Ministro Sepúlveda Pertence, hoje
aposentado.
Sete de setembro! Que data fatídica! Ab initio, Dia da Independên-
cia formal do Brasil, libertando-se, pelo menos em teoria, da opressão
colonial do jugo dominante, malgrado a dominação hodierna manifeste-
se por outras formas de dependência, como a tecnológica, a financeira,
somente exemplificando, através do grito não tão revolucionário e reno-
vador do então Imperador D. Pedro I às margens do Ipiranga. Data nacio-
nal, celebrada pelos desfiles militares, hoje em dia de diminuta popula-
ridade, diante da ausência da participação do povo em suas celebrações,
tendo em vista o desvalor por si denotado aos símbolos da nação, cons-
tantemente desgastados e humilhados pelos próprios governos e por
políticos de escol, líderes pavimentadores de uma estrada histórica das
mais corruptas e vilipendiadoras dos direitos citadinos, vergonha a ser
Tributo IDP.indd 152Tributo IDP.indd 152 23/11/2010 17:41:0523/11/2010 17:41:05
TRIBUTO - INSTRUMENTO DE PODER153 •
alardeada aos quatro cantões deste Universo, tendo em vista a garantia
maravilhosa da manifestação livre do pensamento (CF, art. 5º, IV)174, con-
quista fundamental estendida a qualquer nacional ou estrangeiro preo-
cupado e constantemente molestado por tais questionamentos, como se
faz produzir nestas parcas linhas insurretas.
Sete de setembro! Em 1932 nascia mais um raro profeta: Samuel
Fucs, a quem se dedica esta obra, talhada como templo de irresignação
aos arroubos autoritários do Estado Fiscal Brasileiro. O leitor, com a de-
vida permissão, se não leu, que seja aconselhado a deslizar, em breve
forma, seus olhos sobre a dedicatória deste trabalho, tal qual criança ao
se deleitar num brinquedo de escorregar cravado em qualquer parque
infantil verdejante, para bem compreender o sentido direcionado a todas
estas estrofes, parágrafo por parágrafo, no intuito de sedimentar, com o
cimento da reflexão, tal qual um obreiro do pensar, os tijolos colocados
carinhosa e atentamente, um sobre outro, recheados da massa cefálica
da contemplação, na construção das teses aqui matrimoniadas, em con-
testação voraz, ao alardear a imposição de um controle estatal, de viés
fiscal, aos destinos do particular, e preconizar a urgente necessidade de
percepção de um garantismo tributário que um Estado Democrático e
Social de Direito conclama.
Sete de setembro! O primeiro na vida deste humilde interlocutor
sem o seu Profeta, que cumpriria 75 lindas primaveras! Tal momento
será, infelizmente, inolvidável, pois a dor da falta mais do que profunda
se manifesta. Perfaz-se, antes de qualquer coisa, de maneira cortante, in-
cisiva, aguda e penetrante. Faz emudecer até mesmo um trovão, e reme-
te o pensamento para circunstâncias inexplicáveis do além, esperando
que, sob a sua imagem, o seu legado e a sua proteção, estas linhas pos-
sam ser bem escritas, capazes não somente de bem elucidar o objetivo a
ser almejado, mas, principalmente, de honrar a sua memória.
Sete de setembro! Neste cantinho incrustado numa das maiores be-
lezas paradisíacas da Natureza, duas plantinhas se desenvolvem e res-
plandecem em sua homenagem: a primeira, uma muda pequenininha, tal
qual um bebê recém-nascido, de uma copaíba, germinada durante o car-
naval de 2007. Trata-se de árvore frondosa da família das leguminosas,
de madeira avermelhada, de flores alvas com máculas róseas, reunidas
em raminhos. Planta vigorosa, potente, imponente, que crescerá talvez
por uma centena de anos, até atingir a sua plena maturidade. Transmissão
Tributo IDP.indd 153Tributo IDP.indd 153 23/11/2010 17:41:0523/11/2010 17:41:05
154 • ILDO FUCS
para a verdadeira posteridade. A segunda, um pé de abacate plantado,
árvore frutífera, frondosa, procedente da América Central e do México,
hoje cultivada por toda parte em virtude dos seus frutos de grande valor
nutritivo. Mais fácil de perceber o seu crescimento e o seu florescimento,
e que o resultado de sua semente sirva de alimento renovável aos inúme-
ros habitantes deste fantástico ecossistema natural, fonte inesgotável de
energia e sinal de preservação da vida em equilíbrio.
Sete de setembro! Que os semens da copaíba e do abacateiro per-
mitam a plena inspiração aqui inaugurada pelos ideais tão caramente
preconizados pelo Profeta Samuel. Amém!
2. A Importância Jurídica das Micros e das Pequenas Empresas
A República brasileira reservou um local especialmente decorado e
confortável para a micro e para a pequena empresa, no seio do seu cora-
ção. O privilégio é notadamente fruto da exaltação e do louvor ofertados
pela Norma Normarum, expressamente descritos em alguns dos seus dis-
positivos constitucionais, mais tarde especialmente evocados e reprodu-
zidos nesta obra.
Despicienda seria tal glorificação expressa, diante de sua evidência
implícita. Ao se produzir hermenêutica concentrada, lógica e sistêmica
da inteligência regente na Carta Mor, perceber-se-ia, inelutavelmente,
que esta, ao tratar da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III)175, do
valor social do trabalho e da livre iniciativa (art. 1o, IV)176, da isonomia
(art. 3o, I e III)177, da igualdade material (art. 5o, caput)178, da capacidade
contributiva (art. 150, II)179, implicitamente denota tratamento especial e
privilegiadíssimo às micros e às pequenas empresas.
Mais do que evidente, diante da necessidade de se tratar diferencial-
mente os desiguais, pois os detentores de situação jurídico-econômica
não equivalente merecem ser considerados e acolhidos de forma diversa
e, sobretudo, privilegiada. É o caso notório, sem embargo, da realidade
das pequenas e das micros sociedades empresárias, especialmente no
campo das obrigações tributárias.
Não saciado com essas considerações preambulares, o legislador ori-
ginário, não apenas em um dispositivo único, mas de forma a evidenciar
em grito heróico e libertário, tão importante ou mais do que o grito de
Independência ocorrido em 07/09/1822, para não deixar qualquer dúvida à
Tributo IDP.indd 154Tributo IDP.indd 154 23/11/2010 17:41:0523/11/2010 17:41:05

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT