Arbitragem: Justiça multiportas e o conflito administrativo

AutorRicardo Gueiros Bernardes Dias - Diogo Abineder Ferreira Nolasco Pereira
CargoDoutor em direito pela University of California - Mestre em direito processual pela UFES
Páginas118-129
118 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 667 I DEZ20/JAN21
DOUTRINA JURÍDICA
Ricardo Gueiros Bernardes Dias DOUTOR EM DIREITO PELA UNIVERSITY OF CALIFORNIA
Diogo Abineder Ferreira Nolasco Pereira MESTRE EM DIREITO PROCESSUAL PELA UFES 
JUSTIÇA MULTIPORTAS E O
CONFLITO ADMINISTRATIVO
I
A IDEIA DE QUE O INTERESSE PÚBLICO É SEMPRE INDISPONÍVEL
LEVA A UMA INTERPRETAÇÃO EQUIVOCADA QUE DEVE SER
SUPERADA
Aexpressão multi-door courthouse (jus-
tiça multiportas) foi originalmente
usada pelo professor Frank Sander
(Harvard) em 1976, em conferência que
posteriormente veio a ser publicada em
1979 (Frank Sander. Varieties of Dispute Proces-
sing, Minnesota: West Publishing, 1979, p. 65-87).
Esse sistema cria uma verdadeira mudança de
paradigma, pois privilegia a utilização de meios
extrajudiciais de solução de controvérsias que
passam pela participação das partes na busca
de uma solução amigável que melhor atenda
aos seus interesses.
O Código de Processo Civil de 2015, art. 3º, §
3º, cogita o sistema multiportas em qualquer
fase processual, permitindo às partes uma solu-
ção pacífica da controvérsia.
O sistema multiportas, dada a sua dimensão,
deve ser percebido à luz de distintos tratamen-
tos de solução de conflitos: os que tratam da au-
tocomposição bem como os meios heterocom-
positivos, compreendendo a jurisdição estatal e
não estatal.
O instituto da arbitragem, meio heterocom-
positivo, tratado como forma de jurisdição não
estatal, apesar de não ser um instituto novo,
ganhou novos contornos a partir do giro dado
à cultura do litígio no Brasil que privilegia a ju-
risdição estatal. Ocorre que a jurisdição estatal,
nos moldes como exercida atualmente, não nos
parece instrumento hábil a promover a pacifi-
cação social, haja vista dar a resposta de modo
intempestivo e com pouca possibilidade de res-
taurar a relação social rompida pelo litígio.
Ademais, nos conflitos envolvendo a admi-
nistração pública, percebe-se ao longo da his-
tória uma resistência estatal em desenvolver
uma autonomia negocial. Nesse contexto, a ar-
bitragem se coloca como um dos tratamentos
adequados à solução das controvérsias jurídi-
cas. A resistência parte do reconhecimento de
um inconsciente coletivo de que os interesses
da administração pública seriam sempre enca-
rados como indisponíveis. Isso induziria a uma
incompatibilidade com a utilização da arbitra-
gem, ou mesmo dos demais tratamentos, como
instrumento adequado aos conflitos envolven-
do a administração pública.
Porém, pretendemos induzir a compreensão
de que a administração pública possui interes-
ses disponíveis e de que modo tais interesses,
na existência de eventual controvérsia jurídica

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